Careca do INSS: Empresário investigado por fraude milionária fez doação à campanha de Bolsonaro
Empresário envolvido em esquema bilionário do INSS aparece como doador da campanha de Jair Bolsonaro em 2022, revela site do TSE
A teia de corrupção que envolve o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) ganhou mais um capítulo revelador. Segundo informações obtidas a partir de relatórios da Polícia Federal (PF) e registros oficiais do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o empresário Antonio Carlos Camilo Antunes — conhecido como “Careca do INSS” — doou R$ 1 para a campanha do então presidente Jair Bolsonaro (PL) nas eleições de 2022. A doação simbólica levanta questionamentos sobre conexões entre figuras investigadas por fraudes bilionárias e o financiamento político no país.
A descoberta do vínculo se deu por meio de uma análise cruzada entre os dados do TSE, onde constam nome e CPF do doador, e documentos da Operação Sem Desconto, desencadeada pela PF. A investigação apura um gigantesco esquema de corrupção que movimentou milhões de reais em descontos indevidos nos benefícios de aposentados e pensionistas, por meio de entidades associativas intermediadas por empresas ligadas ao empresário.
Quem é o “Careca do INSS”?
Antonio Carlos Camilo Antunes é apontado como um dos principais articuladores do esquema que fraudava o INSS por meio de descontos associativos não autorizados em contracheques de beneficiários. Com diversas procurações em nome de entidades que atuam junto ao INSS, ele figura como peça-chave no relatório da PF, que o classifica como lobista e operador de um mecanismo financeiro sofisticado.
O apelido “Careca do INSS” foi cunhado dentro do meio investigativo em referência à sua imagem pública e ao seu envolvimento direto com servidores do órgão. Ele teria utilizado 22 empresas, muitas delas constituídas como Sociedades de Propósito Específico (SPEs), para movimentar os recursos desviados, blindar o patrimônio dos envolvidos e disfarçar o fluxo financeiro das fraudes.
As doações e o elo com a política
O que chama a atenção dos investigadores não é apenas o fato de que a doação de R$ 1 para a campanha de Bolsonaro tenha sido feita, mas o momento em que ocorreu — 12 de setembro de 2022, semanas antes do primeiro turno das eleições. Apesar de pequena, a contribuição revela uma tentativa de criar algum tipo de relação ou, ao menos, demonstrar proximidade com a esfera política.
A utilização de microdoações por investigados em grandes esquemas não é inédita. Muitas vezes, elas servem para reforçar vínculos institucionais ou abrir espaço para uma futura narrativa de apoio político, caso a operação das fraudes venha à tona. O gesto pode parecer inofensivo, mas, para os investigadores, ele soma-se às muitas evidências do alcance e da sofisticação do esquema fraudulento.
As engrenagens da fraude no INSS
De acordo com os relatórios da Polícia Federal, o esquema operava por meio da intermediação financeira entre entidades associativas e servidores do INSS, utilizando as empresas de Antonio Carlos como ponte. As entidades, muitas vezes sem consentimento dos aposentados e pensionistas, autorizavam descontos em folha que eram, posteriormente, revertidos para empresas de fachada ou controladas por laranjas.
Essas empresas, por sua vez, faziam a distribuição dos recursos, inclusive para agentes públicos. Um dos pontos mais alarmantes identificados foi a movimentação de R$ 4,2 milhões nas contas do empresário em apenas dois meses — valor incompatível com o perfil formal declarado por ele junto aos órgãos de controle.
O relatório da PF também aponta que o “Careca do INSS” teria repassado valores para a esposa de Virgilio Antonio Ribeiro de Oliveira, procurador-geral do INSS afastado recentemente por suspeita de envolvimento no mesmo esquema. Além disso, recursos teriam sido enviados ao ex-diretor de Governança, Planejamento e Inovação do INSS, Alexandre Guimarães, e ao escritório do filho de Andre Fidelis, também ex-dirigente do órgão.
Blindagem patrimonial e dissimulação societária
Um dos mecanismos utilizados pelo empresário para esconder a origem e o destino dos recursos seria a criação de múltiplas SPEs — empresas com personalidade jurídica própria e aparente finalidade lícita, mas cuja função real seria ocultar os reais beneficiários dos lucros obtidos ilicitamente.
Essas SPEs foram, em sua maioria, constituídas logo após os primeiros repasses das entidades associativas, o que levanta suspeitas de que foram criadas com o objetivo claro de simular legalidade e dificultar a rastreabilidade dos recursos.
A PF destaca que o modelo societário adotado visava blindar os sócios controladores, dificultando a responsabilização direta de figuras como Antonio Carlos. Além disso, esse tipo de estrutura jurídica é frequentemente utilizado em esquemas de lavagem de dinheiro e evasão fiscal, especialmente em fraudes envolvendo a máquina pública.
O papel do TCU e a resistência à auditoria
Enquanto a Polícia Federal avança nas investigações, o Tribunal de Contas da União (TCU) também tenta realizar auditorias detalhadas sobre os repasses feitos pelo INSS a entidades associativas. No entanto, segundo apurações jornalísticas, entidades suspeitas e até servidores do INSS têm dificultado o processo, o que levanta ainda mais suspeitas sobre a profundidade e a abrangência da fraude.
A operação recebeu o nome de “Sem Desconto” em alusão direta aos valores indevidamente subtraídos dos beneficiários do INSS, muitas vezes sem seu conhecimento ou autorização formal. O volume de recursos desviados é estimado em centenas de milhões de reais, configurando um dos maiores esquemas de corrupção envolvendo o órgão nos últimos anos.
Conexões perigosas: do INSS à política nacional
Ainda que a doação do “Careca do INSS” à campanha de Jair Bolsonaro seja de valor simbólico, ela abre uma importante linha de investigação sobre a penetração de esquemas criminosos em esferas de poder político. A questão não é apenas quem recebe o dinheiro, mas quem está por trás da doação e o que representa a sua intenção.
No contexto eleitoral, microdoações como essa podem não representar relevância financeira, mas indicam possíveis tentativas de influência política ou ao menos o desejo de aproximação de figuras envolvidas em crimes de grande escala com a cúpula do poder.
Em um país marcado por escândalos de corrupção e relações promíscuas entre empresários e políticos, o caso do “Careca do INSS” surge como mais um alerta sobre a necessidade de transparência, fiscalização rigorosa e responsabilização dos envolvidos em crimes contra os cofres públicos.