O Grupo de Trabalho (GT) criado na Câmara dos Deputados para debater a regulação das redes sociais encerrou suas atividades sem ter realizado sequer uma reunião. Instituído pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL), o colegiado foi criado em junho de 2024 com 20 integrantes, mas não houve mobilização para seu funcionamento, e nenhum parlamentar solicitou a prorrogação do prazo de 90 dias. A iniciativa, que prometia avançar no debate sobre temas cruciais como fake news e a responsabilização das plataformas digitais, foi encerrada sem resultados concretos.
O Contexto da Criação do Grupo de Trabalho
O GT foi estabelecido em meio a um cenário de crescente polarização política e preocupação com o impacto das redes sociais na disseminação de desinformação. O projeto de regulação vinha sendo debatido há anos no Congresso, tendo origem no Projeto de Lei das Fake News, apresentado em 2020 pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania).
Apesar de ter passado pelo Senado e avançado na Câmara em etapas iniciais, o texto enfrentou dificuldades políticas e técnicas. A proposta prevê punições para divulgação de conteúdos falsos, regras de moderação mais transparentes nas plataformas digitais e responsabilização das empresas por negligência no combate à desinformação.
Paralisia e Culpa Dividida
Com a falta de reuniões e de uma prorrogação oficial, deputados e o presidente Arthur Lira trocaram acusações sobre quem seria o responsável pela inércia do GT. Parlamentares como Orlando Silva (PCdoB-SP) e Afonso Motta (PDT-RS) afirmaram que cabia a Lira liderar a instalação do grupo. Por outro lado, interlocutores de Lira alegaram que a iniciativa de organizar o colegiado deveria ter partido dos próprios deputados designados.
Júlio Lopes (PP-RJ), integrante do grupo, minimizou o impasse, atribuindo o fracasso ao calendário atribulado do Congresso e às eleições municipais de 2024.
Urgência na Regulação das Redes Sociais
A falta de avanços ocorre mesmo após episódios graves, como o atentado à bomba em frente ao Supremo Tribunal Federal (STF), atribuído à radicalização fomentada nas redes sociais. O evento reacendeu o debate sobre a necessidade de responsabilizar plataformas digitais pelo conteúdo publicado.
Paralelamente, o STF retomou o julgamento sobre a responsabilidade das big techs, analisando pontos do Marco Civil da Internet, que define direitos e deveres no uso da rede. A Corte poderá decidir em quais circunstâncias as plataformas podem ser responsabilizadas por danos causados por postagens de seus usuários.
O Jogo de Empurra e o Papel dos Grupos de Trabalho
A estrutura dos Grupos de Trabalho, que não está prevista no regimento da Câmara, contribuiu para a paralisia. Ao contrário das comissões, os GTs não precisam respeitar a proporcionalidade partidária, e a instalação e o andamento dependem exclusivamente da organização interna dos membros indicados.
Além disso, o relatório final de um GT não tem efeito prático imediato, servindo apenas como subsídio para debates futuros no plenário. No caso do GT das redes sociais, a falta de clareza sobre responsabilidades e a ausência de liderança culminaram no fracasso da iniciativa.
Histórico do PL das Fake News
O Projeto de Lei das Fake News enfrentou vários impasses desde sua chegada à Câmara em 2020. O último parecer do relator Orlando Silva foi apresentado em abril de 2023. Em maio do mesmo ano, o projeto foi retirado de pauta por falta de acordo entre os parlamentares. Desde então, a proposta está parada, sem previsão para retomada.
Consequências do Impasse
A inércia do Congresso em debater a regulação das redes sociais contrasta com a urgência do tema, tanto no Brasil quanto no exterior. Países como Austrália e União Europeia avançaram em legislações que responsabilizam plataformas digitais e protegem os usuários de desinformação e discursos de ódio.
Enquanto isso, no Brasil, a ausência de uma regulamentação deixa um vazio jurídico, agravando problemas como a disseminação de notícias falsas e o impacto disso na democracia e na sociedade.
Apesar do encerramento do GT, o tema não está encerrado. Parlamentares podem propor novas iniciativas ou retomar o debate em outras instâncias, como comissões permanentes. Além disso, o julgamento no STF sobre a responsabilidade das plataformas pode definir um marco jurídico importante, pressionando o Congresso a agir.