A Justiça Federal condenou a mineradora Samarco, suas acionistas Vale (VALE3) e BHP Billiton, e a Fundação Renova a pagar R$ 56 milhões por danos materiais e morais devido a violações relacionadas a uma campanha publicitária sobre as medidas reparatórias da tragédia ocorrida na bacia do Rio Doce. A condenação, divulgada na terça-feira (6) pelo Ministério Público Federal (MPF), também impõe a obrigação de realizar uma contrapropaganda para corrigir informações incorretas divulgadas anteriormente. Confira todos os detalhes sobre a condenação e suas implicações.
Entenda a Condenação
A condenação abrange não apenas a Samarco, a Vale e a BHP Billiton, mas também a Fundação Renova, criada para gerenciar as ações de reparação relacionadas ao rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, Minas Gerais. A decisão foi proferida pelo juiz Vinícius Cobucci, que destacou o desvio de finalidade da fundação e a tentativa de criar uma narrativa positiva através da publicidade, em vez de focar na transparência e na efetiva reparação dos danos causados.
Segundo o juiz, a Fundação Renova desviou recursos para uma campanha publicitária que visava promover uma imagem positiva da entidade e suas mantenedoras, em vez de priorizar as ações de reparação e compensação dos afetados. A decisão critica a fundação por gastar R$ 17,4 milhões em publicidade entre setembro e outubro de 2020, valor superior ao gasto em vários dos programas previstos pelo Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC), acordo que estabeleceu as bases para a reparação dos danos.
Histórico da Tragédia
O rompimento da barragem da Samarco em novembro de 2015 causou uma devastadora avalanche de rejeitos, resultando na morte de 19 pessoas e afetando inúmeras cidades ao longo da bacia do Rio Doce, em Minas Gerais e Espírito Santo. A tragédia gerou um grande impacto ambiental e social, levando à necessidade urgente de ações de reparação e compensação para os afetados.
Pouco após o evento, um acordo conhecido como Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC) foi firmado entre as empresas envolvidas, a União, e os governos de Minas Gerais e do Espírito Santo. O TTAC resultou na criação da Fundação Renova, responsável por gerenciar a execução de mais de 40 programas de reparação. As mineradoras foram incumbidas de financiar essas iniciativas.
Críticas e Questionamentos
A atuação da Fundação Renova, entretanto, tem sido alvo de críticas e questionamentos desde sua criação. O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), o Ministério Público Federal (MPF), a Defensoria Pública da União (DPU) e as Defensorias Públicas de Minas Gerais e do Espírito Santo têm criticado a entidade por sua gestão e execução dos programas de reparação. Em uma ação civil pública movida em 2021, essas instituições acusaram a Fundação de realizar “propaganda enganosa”, apresentando informações imprecisas e incompletas sobre a recuperação das áreas afetadas e a qualidade da água e do ambiente.
Os críticos apontam que a publicidade veiculada pela Fundação Renova apresentava uma visão otimista e muitas vezes falsa da situação, ignorando a realidade dos atingidos e os problemas persistentes. Estudos e perícias realizadas por especialistas contradizem as alegações promovidas pela publicidade da fundação, evidenciando a discrepância entre a realidade e a imagem pública criada.
Consequências da Condenação
Além da condenação financeira de R$ 56 milhões por danos materiais e morais, a decisão judicial determina que a Fundação Renova, juntamente com as mineradoras Samarco, Vale e BHP Billiton, deve realizar uma contrapropaganda. Essa nova campanha deverá corrigir as informações incorretas e imprecisas apresentadas na publicidade anterior. A decisão enfatiza a obrigação da fundação de fornecer informações claras e objetivas, conforme previsto no TTAC, e critica a tentativa de criar uma narrativa que minimiza o impacto da tragédia e desconsidera o sofrimento das vítimas.
O juiz Vinícius Cobucci destacou a falta de autocrítica e a tentativa de controlar a narrativa para criar uma campanha orquestrada de desinformação como práticas imorais e ilegais. A condenação também destaca a necessidade de a Fundação Renova assumir responsabilidade pelos erros e falhas na gestão da reparação, em vez de responsabilizar terceiros.
Futuro da Reparação e Acordos
A insatisfação com o processo reparatório levou à tentativa de negociação para um acordo de repactuação em 2022, visando resolver mais de 85 mil processos relacionados à tragédia. No entanto, as negociações não avançaram devido à falta de consenso sobre os valores envolvidos. As ofertas das mineradoras têm sido consideradas insuficientes pelas partes envolvidas, prolongando a resolução dos processos e a compensação para os afetados.
A Fundação Renova informou que atuará dentro dos limites do TTAC e apresentará recurso contra a decisão. A Samarco optou por se manifestar apenas nos autos do processo, enquanto a Vale e a BHP Billiton não se posicionaram publicamente sobre a condenação.
A condenação da Samarco, Vale, BHP Billiton e Fundação Renova representa um marco importante na luta por justiça e reparação para as vítimas da tragédia de Mariana. A decisão judicial sublinha a necessidade de transparência e responsabilidade na gestão de reparações e reforça a importância de corrigir informações incorretas e enganosas. Enquanto as partes envolvidas se preparam para apelar e negociar, a tragédia do Rio Doce continua a ser um lembrete das consequências devastadoras de falhas na gestão e na comunicação de crises.