EUA devem anunciar novo presidente do Fed no início de janeiro e mercado acompanha disputa com atenção
Os Estados Unidos caminham para uma das decisões mais sensíveis da política econômica global dos últimos anos. O governo norte-americano deve anunciar no início de janeiro o novo presidente do Fed, o banco central dos EUA, em um processo que combina disputas técnicas, pressões políticas e forte repercussão nos mercados financeiros internacionais. A sinalização foi feita pelo secretário do Tesouro, Scott Bessent, ao comentar os bastidores da sucessão de Jerome Powell, cujo mandato termina oficialmente em maio.
A escolha do novo presidente do Fed ocorre em um momento delicado para a economia americana e para o cenário global. Após um ciclo de aperto monetário agressivo iniciado em 2022, seguido por três cortes consecutivos de juros ao longo de 2025, o Federal Reserve tenta equilibrar o combate à inflação com a preservação do crescimento econômico. Nesse contexto, o nome que assumirá o comando da instituição será determinante para a condução da política monetária nos próximos anos.
Anúncio antecipado e cálculo político
Segundo Scott Bessent, a decisão deverá ser anunciada já no início de janeiro, antecipando em alguns meses o fim do mandato de Powell. A estratégia atende a dois objetivos centrais: reduzir incertezas nos mercados e dar tempo para uma transição política e institucional mais organizada.
O secretário afirmou que os principais cotados são Kevin Warsh, ex-diretor do Federal Reserve, e Kevin Hassett, atual diretor do Conselho Econômico Nacional da Casa Branca. Ambos são vistos como quadros experientes e alinhados à visão do presidente Donald Trump, que tem criticado publicamente a atuação do Fed nos últimos anos.
A definição do novo presidente do Fed não é apenas um ato administrativo. Trata-se de uma decisão com impacto direto sobre juros, dólar, bolsas globais, fluxos de capital e, indiretamente, sobre economias emergentes como o Brasil.
O debate central: crescimento versus inflação
Um dos pontos mais sensíveis da sucessão é a visão sobre a relação entre crescimento econômico e inflação. Bessent foi explícito ao criticar um entendimento tradicional dentro do Fed de que crescimento mais forte tende, automaticamente, a pressionar os preços.
“O crescimento não cria inflação. O que cria inflação é o desequilíbrio entre oferta e demanda”, afirmou o secretário do Tesouro. Essa visão se aproxima do discurso do presidente Trump, que defende uma política monetária mais estimulativa e cortes de juros mais rápidos para impulsionar a atividade econômica.
A escolha do novo presidente do Fed deve, portanto, refletir se a Casa Branca pretende manter uma postura mais cautelosa, como a de Powell, ou avançar para uma condução mais flexível da política monetária.
Embates entre Trump e Jerome Powell
O atual presidente do Fed, Jerome Powell, viveu uma relação marcada por atritos com Donald Trump. Ao longo do mandato, Powell foi alvo de críticas duras por não ter reduzido os juros com a velocidade desejada pelo governo, especialmente em momentos de desaceleração econômica.
Em junho, Trump chegou a chamar Powell de “burro” e “teimoso”, em um episódio que evidenciou o desgaste institucional entre a Casa Branca e o banco central. Apesar disso, Powell manteve a defesa da independência do Fed como princípio essencial para a estabilidade econômica de longo prazo.
Na última reunião do ano, realizada em 10 de dezembro, o Fed reduziu a taxa básica de juros em 0,25 ponto percentual, para a faixa entre 3,50% e 3,75% ao ano, o menor nível desde setembro de 2022. Foi o terceiro corte consecutivo em 2025, sinalizando uma mudança gradual no ciclo monetário.
Mesmo assim, o governo considera que os cortes foram tímidos. A escolha do novo presidente do Fed surge, nesse contexto, como uma oportunidade de alinhar mais claramente a política monetária às prioridades do Executivo.
Independência do Fed em debate
A sucessão de Powell reacendeu o debate sobre a independência do Federal Reserve. Trump já declarou que gostaria de ser consultado diretamente sobre decisões de política monetária, como o nível das taxas de juros, posição que contraria a tradição institucional do banco central americano.
Bessent, por sua vez, rejeitou críticas de que Kevin Hassett seria próximo demais do presidente para garantir autonomia decisória. Segundo ele, relações pessoais não impedem decisões técnicas independentes.
O próprio Hassett tem buscado reforçar esse discurso. Em entrevistas recentes, afirmou que a independência do Fed é “muito importante”, ao mesmo tempo em que defende espaço para novos cortes de juros, alinhando-se à visão do governo de estimular a economia.
A forma como o novo presidente do Fed lidará com esse equilíbrio entre independência institucional e diálogo com o Executivo será acompanhada de perto por investidores e analistas.
Quem são os principais nomes na disputa
Embora Warsh e Hassett liderem as apostas, outros nomes circulam nos bastidores. A disputa pelo comando do Fed envolve perfis distintos, com visões variadas sobre política monetária, regulação financeira e papel do banco central.
Kevin Warsh, ex-governador do Fed, tem experiência direta na gestão da crise financeira de 2008 e forte trânsito no mercado financeiro. Atualmente, critica algumas decisões do banco central e defende maior eficiência operacional e cortes de juros mais rápidos quando o cenário permitir.
Kevin Hassett, economista e conselheiro da Casa Branca, é um aliado próximo de Trump. Defende mudanças na atuação do Fed e uma política monetária mais alinhada ao crescimento econômico, embora afirme respeitar a independência da instituição.
Christopher Waller, atual governador do Fed, representa uma ala mais técnica e institucional. Economista de carreira, apoia cortes de juros quando justificados pelos dados, mas evita qualquer associação com disputas políticas.
Michelle Bowman, vice-presidente do Fed para Supervisão, tem experiência no setor bancário e no governo. Defende ajustes regulatórios e já se posicionou favoravelmente a cortes de juros em 2025.
Rick Rieder, executivo da BlackRock, surge como um nome mais ligado ao mercado financeiro. Especialista em renda fixa, defende uma atuação mais inovadora do Fed e já sugeriu cortes mais agressivos para estimular a economia.
A definição do novo presidente do Fed dependerá não apenas de currículos, mas da leitura política que a Casa Branca faz do momento econômico.
Reação dos mercados globais
A sucessão no comando do Fed é acompanhada com atenção pelos mercados globais. Investidores buscam sinais sobre a trajetória futura dos juros americanos, que influenciam diretamente o custo do crédito, o valor do dólar e o apetite por risco em todo o mundo.
Uma escolha percebida como excessivamente alinhada ao Executivo pode gerar receios sobre a credibilidade do Fed no combate à inflação. Por outro lado, um nome visto como excessivamente conservador pode frustrar expectativas de estímulos adicionais à economia.
O anúncio antecipado do novo presidente do Fed tende a reduzir volatilidade no curto prazo, ao oferecer maior previsibilidade sobre a transição. Ainda assim, cada declaração dos candidatos e do governo seguirá impactando bolsas, títulos e moedas.
Impactos para economias emergentes
A decisão sobre o comando do Fed não afeta apenas os Estados Unidos. Países emergentes, como o Brasil, são diretamente influenciados pela política monetária americana. Juros mais baixos nos EUA tendem a favorecer a entrada de capital em mercados emergentes, enquanto uma postura mais restritiva fortalece o dólar e pressiona moedas locais.
Por isso, a escolha do novo presidente do Fed é observada atentamente por bancos centrais, ministérios da Fazenda e investidores internacionais. O perfil do futuro presidente ajudará a definir o ritmo de normalização monetária global nos próximos anos.
Uma decisão com efeitos de longo prazo
Embora o anúncio esteja previsto para janeiro, os efeitos da escolha se estenderão por todo o mandato do próximo presidente do Fed. A condução da política monetária, a comunicação com os mercados e a relação com o governo serão determinantes para a estabilidade econômica americana e global.
A sucessão de Jerome Powell marca o fim de um ciclo iniciado em meio a crises e inflação elevada. O novo presidente do Fed herdará um cenário menos turbulento, mas ainda repleto de desafios, como a consolidação do processo desinflacionário, a sustentabilidade da dívida pública e os riscos geopolíticos.
Com o anúncio se aproximando, cresce a expectativa sobre qual visão econômica prevalecerá e como isso moldará o futuro da maior economia do mundo.






