Taxação de bets e fintechs: Senado aprova projeto que amplia tributos e redefine cenário fiscal no país
A Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado aprovou, por larga maioria, o projeto que eleva a taxação de bets e fintechs no Brasil, além de promover ajustes na tributação de Juros sobre Capital Próprio (JCP) e de empresas do setor financeiro. O texto, de autoria do senador Renan Calheiros, representa uma das mudanças mais significativas no ambiente regulatório e tributário desde a aprovação da nova faixa de isenção do Imposto de Renda. Com a votação de 21 votos favoráveis e apenas um contrário, a proposta avança diretamente para a Câmara dos Deputados, sem necessidade de passar pelo plenário da Casa.
A aprovação ocorre em meio a um ambiente político marcado por tensões entre o Senado e áreas do Ministério da Fazenda, que pressionaram o relator, Eduardo Braga, a retirar trechos sensíveis do parecer. Mesmo com divergências públicas, especialmente em torno do prazo para empresas aprovarem a distribuição de lucros e dividendos referentes a 2025, o texto foi consolidado pela CAE em uma versão que eleva impostos de forma gradual, reforça instrumentos de fiscalização e busca compensar perdas decorrentes da ampliação da faixa isenta do Imposto de Renda.
A partir dessa decisão, a taxação de bets e fintechs se torna um instrumento estratégico para fortalecer a arrecadação federal e mitigar os impactos fiscais das desonerações concedidas recentemente. Em um cenário de pressão por equilíbrio das contas públicas, o projeto reposiciona setores considerados de crescimento acelerado e até então tributados de maneira mais branda.
Mudanças de última hora e impasse com a Fazenda
O processo de votação foi marcado por forte tensão. Momentos antes da deliberação final, Eduardo Braga anunciou que havia sido pressionado pelo Ministério da Fazenda a retirar do texto a extensão do prazo para aprovação da distribuição de lucros e dividendos relativos ao ano-base de 2025. A alteração permitiria que empresas aprovassem a distribuição até abril de 2026, garantindo isenção de Imposto de Renda até 2028.
A retirada do trecho expôs desentendimentos internos e deixou claro o desconforto do relator. Segundo ele, a exclusão foi necessária após “sinalizações estranhas” vindas da equipe econômica, que alegava conflito com recente legislação sancionada. O episódio expôs a fragilidade das negociações e gerou constrangimento no colegiado, em um dos debates mais duros vivenciados pelo relator em sua trajetória no Senado.
Mesmo com o impasse, a CAE aprovou integralmente o projeto, mantendo o prazo atual previsto na lei: lucros e dividendos referentes a 2025 só terão isenção se aprovados até 31 de dezembro daquele mesmo ano.
Como funciona o aumento da taxação de bets e fintechs
O ponto central da proposta é elevar a taxação de bets e fintechs, setor que cresceu de forma explosiva nos últimos anos. A alíquota que incide sobre as receitas das empresas de apostas — definida como a diferença entre o total arrecadado e o valor pago em prêmios, somado ao Imposto de Renda retido na fonte — sobe de 12% para 18%. A mudança ocorre de maneira escalonada:
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2026: alíquota sobe para 15%
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2028: alíquota chega a 18%, nível definitivo
Originalmente, a proposta previa aumento para 24%, mas Braga recuou diante de temores de que um salto tão abrupto levasse empresas legalizadas à insolvência ou à evasão para o mercado irregular.
O aumento gradual da taxação de bets e fintechs visa equilibrar arrecadação e competitividade, buscando evitar que empresas regulares sejam sufocadas por uma carga excessiva enquanto casas de apostas ilegais continuam operando à margem do sistema.
Combate às apostas ilegais
Um dos pontos mais relevantes aprovados nesta etapa é a criação de um mecanismo acelerado para derrubar bets irregulares que operam sem autorização do Ministério da Fazenda. O mercado informal de apostas cresce de forma paralela ao legalizado, gerando evasão fiscal, riscos aos usuários e falta de controle estatal sobre operações financeiras.
O projeto determina que instituições financeiras e de pagamento deverão monitorar atividades suspeitas e compartilhar dados entre si e com autoridades regulatórias. Empresas que não colaborarem poderão sofrer multas, sanções e até suspensão temporária das operações — uma medida considerada histórica para o setor.
A taxação de bets e fintechs, portanto, passa também a ser acompanhada por maior rigor fiscalizatório, em um esforço coordenado para reforçar a integridade do mercado.
Aumento da CSLL para fintechs e instituições financeiras
Além das bets, fintechs e outras empresas do setor financeiro sentirão o impacto da nova alíquota da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL). O objetivo é aproximar a tributação das fintechs àquela aplicada às instituições financeiras tradicionais, corrigindo uma assimetria crescente à medida que serviços bancários migraram para plataformas digitais.
As mudanças serão graduais:
Fintechs:
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2027: 12%
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2028: 15% (patamar definitivo)
Instituições de crédito e financiamento:
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2027: 17,5%
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2028: 20% (igual aos bancos)
Além disso, casas de câmbio, bolsas de valores e empresas de meios de pagamento também serão incorporadas aos novos percentuais.
Com essa medida, a taxação de bets e fintechs reforça a agenda de convergência regulatória, reduzindo distorções entre empresas que desempenham funções similares.
Juros sobre Capital Próprio (JCP) também são afetados
O texto também aumenta a alíquota de Imposto de Renda na fonte sobre a distribuição de JCP, instrumento tradicionalmente utilizado para remunerar acionistas de empresas de capital aberto. A alíquota passa de 15% para 17,5%.
O intuito é aproximar a tributação do JCP àquela aplicada sobre dividendos internacionais e reduzir brechas que permitem otimização fiscal excessiva. Em setores de alta lucratividade, o impacto pode ser expressivo, sobretudo para grandes companhias que utilizam o JCP como estratégia para equilibrar distribuição de resultados e carga tributária.
Estados e municípios serão compensados
Uma das consequências da ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda foi a perda estimada de receitas de estados e municípios, que recebem parte da arrecadação do IR. Para reduzir esse impacto, a proposta determina que parte dos recursos arrecadados pela taxação de bets e fintechs seja destinada à compensação desses entes federativos até 2028.
A partir de 2029, a parcela adicional de 6% da arrecadação será destinada integralmente à seguridade social.
Essa solução fiscal cria uma ponte entre a expansão de políticas de justiça social — como a ampliação da isenção do IR — e a necessidade de manter o equilíbrio orçamentário.
A disputa política por trás da votação
Apesar da aprovação ampla, o projeto evidenciou divergências políticas dentro da própria base do governo. Senadores reclamaram da condução das negociações, afirmando que o Ministério da Fazenda não deixou claro quais pontos eram considerados sensíveis, o que teria gerado atrasos e desgaste.
Eduardo Braga foi especialmente enfático ao relatar dificuldades:
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classificou as negociações como “idas e vindas”;
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disse que o ambiente político é permeado por “interesses difusos”;
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afirmou estar “cansado” da falta de clareza da equipe econômica.
Mesmo com o atrito, a aprovação do texto indicou que a necessidade de reforçar a arrecadação superou divergências momentâneas.
Impactos econômicos de curto e médio prazo
Especialistas apontam que a taxação de bets e fintechs tende a gerar resultados significativos já a partir de 2026. Segundo cálculos de Braga, o conjunto de medidas deve acrescentar cerca de R$ 1,6 bilhão à arrecadação no próximo ano.
Os efeitos esperados incluem:
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fortalecimento do caixa federal;
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reequilíbrio das contas diante da nova faixa de isenção;
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redução de assimetrias tributárias entre empresas financeiras;
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incentivo à legalização do mercado de apostas;
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maior proteção ao consumidor;
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estímulo à transparência no setor de fintechs.
Para mercados financeiros e de apostas esportivas — ambos em rápida expansão — o impacto regulatório tende a criar um novo cenário competitivo. Empresas menores podem sentir maior pressão, enquanto grandes grupos, com estrutura mais robusta, devem se adaptar com maior facilidade.
A decisão que amplia a taxação de bets e fintechs representa um dos movimentos mais contundentes do Senado na agenda econômica de 2025. O texto busca corrigir distorções, ampliar a arrecadação e modernizar a regulação de setores que cresceram mais rapidamente do que a legislação era capaz de acompanhar.
Com a proposta avançando diretamente para a Câmara dos Deputados, inicia-se uma nova etapa da discussão. A expectativa é que o tema gere debate intenso no setor empresarial, no mercado financeiro e entre governos regionais, todos diretamente impactados pelas mudanças. O projeto se posiciona como um divisor de águas no sistema tributário brasileiro e marca uma tentativa de alinhar arrecadação, proteção ao consumidor e responsabilidade fiscal.






