O Hino Nacional Brasileiro, um dos quatro símbolos nacionais que representam a identidade e a soberania do país, foi centro de uma nova controvérsia política durante a campanha eleitoral de 2024. No último sábado, 24 de agosto, durante um comício do candidato à Prefeitura de São Paulo, Guilherme Boulos (PSOL-SP), uma cantora adaptou a letra do hino para incluir a chamada “linguagem neutra”. O episódio gerou um intenso debate sobre a legalidade dessa alteração, que pode resultar em sanções penais conforme previsto pela legislação vigente.
A Alteração do Hino e a Repercussão Imediata
Durante o evento, a cantora substituiu o trecho original “verás que um filho teu não foge à luta” por “verás que es filhes teus não fogem à luta”. A modificação foi feita com o intuito de adequar a letra à linguagem neutra, uma proposta que busca incluir pessoas que não se identificam com os gêneros masculino ou feminino.
No entanto, essa alteração rapidamente atraiu críticas de diversos setores da sociedade, especialmente de políticos de direita, que acusaram a campanha de Guilherme Boulos de violar a Lei dos Símbolos Nacionais. Em resposta à repercussão negativa, Boulos retirou o vídeo do comício de suas redes sociais e alegou que a modificação na letra do hino foi de responsabilidade exclusiva da empresa contratada para organizar o evento.
A Legislação Brasileira sobre os Símbolos Nacionais
O Hino Nacional, assim como a Bandeira, o Selo e as Armas Nacionais, está protegido pela Lei nº 5.700 de 1971, que estabelece regras rígidas para o uso e a preservação desses símbolos. Qualquer alteração ou desrespeito a esses símbolos é considerado uma contravenção, uma infração penal menos grave que um crime, mas que ainda assim pode resultar em sanções significativas.
De acordo com a advogada constitucionalista Vera Chemim, as penalidades para quem modifica o Hino Nacional podem variar de R$ 4.537 a R$ 18.148. Em casos de reincidência, a multa pode ser dobrada, chegando a R$ 36.296. No entanto, a aplicação dessas multas depende da interpretação do juiz que julgar o caso, que pode considerar a gravidade do ato e o contexto em que a alteração foi realizada.
“A multa varia com a interpretação do magistrado. Se ele emprestar uma maior ou menor gravidade ao ato, a multa vai corresponder”, explicou Vera Chemim.
A Lei nº 5.700 de 1971: Um Legado da Ditadura Militar
A Lei nº 5.700, que rege o uso dos símbolos nacionais, foi promulgada durante o regime militar no Brasil, em 1971. Ela reflete o contexto político da época, quando o respeito à simbologia nacional era visto como fundamental para a manutenção da ordem e da unidade do país.
Raphael Blaselbauer, sócio da RBKO Advogados, destaca que a legislação tem como objetivo proteger o “bem jurídico tutelado”, que é o respeito à federação e aos símbolos nacionais. “É uma lei bastante antiga, da época da ditadura. O bem jurídico tutelado pela lei é o respeito à federação e à simbologia nacional”, afirmou Blaselbauer.
A lei especifica não apenas como o Hino Nacional deve ser executado, mas também estabelece normas de conduta para as pessoas presentes durante sua execução. Por exemplo, homens são obrigados a remover chapéus ou bonés enquanto o hino é tocado, e é proibido bater palmas após a execução da canção, seja ela apresentada de forma instrumental ou com canto.
Implicações para a Campanha de Boulos
A controvérsia envolvendo a alteração do Hino Nacional pode ter implicações significativas para a campanha de Guilherme Boulos. Além das possíveis sanções legais, o episódio alimenta o discurso de seus adversários políticos, que podem explorar o incidente para questionar o compromisso de Boulos com o respeito às tradições e às leis brasileiras.
Embora a campanha tenha tentado se distanciar da responsabilidade pela alteração, atribuindo-a à empresa contratada, a reação pública e as críticas demonstram que o impacto já foi sentido. A questão agora é como essa polêmica afetará o eleitorado e se resultará em medidas legais concretas contra a campanha ou seus organizadores.
O Debate sobre a Linguagem Neutra e os Símbolos Nacionais
O uso da linguagem neutra tem sido um tema controverso em diversas esferas da sociedade brasileira, e sua aplicação em um dos símbolos nacionais mais emblemáticos do país intensificou ainda mais o debate. Defensores da linguagem neutra argumentam que a adaptação do Hino Nacional reflete uma tentativa de inclusão e respeito à diversidade de identidades de gênero.
Por outro lado, críticos afirmam que a modificação de um símbolo nacional em nome de uma agenda política ou social é um desrespeito às tradições e pode abrir precedentes perigosos para futuras alterações em outros símbolos nacionais.
Os Desdobramentos
O caso envolvendo a alteração do Hino Nacional em um comício de campanha coloca em evidência a tensão entre a modernização das linguagens e a preservação dos símbolos tradicionais. Enquanto o Brasil se prepara para as eleições municipais de 2024, esse episódio destaca a importância dos símbolos nacionais e a necessidade de um debate mais aprofundado sobre o equilíbrio entre inclusão e respeito às normas estabelecidas.
As consequências legais para a campanha de Guilherme Boulos ainda são incertas, mas a polêmica certamente marcará o discurso político nas próximas semanas. A aplicação da Lei dos Símbolos Nacionais neste contexto pode servir como um importante precedente para casos futuros, reforçando a proteção desses símbolos como parte integrante da identidade e da história do Brasil.