As maiores economias do mundo buscam nesta semana resgatar um acordo tributário histórico da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), depois que dificuldades na implementação ameaçaram arruinar o esforço dos países para fazer com que as empresas multinacionais paguem mais impostos onde operam.
Representantes de mais de 130 países se reuniram na sede da OCDE em Paris por três dias de discussões sobre a aplicação de parte de um acordo tributário inovador que vem sendo afetado por adiamentos e problemas de ratificação.
Na agenda das reuniões está uma mudança na lei global que permitiria aos países se livrar da atual colcha de retalhos de impostos nacionais sobre empresas gigantes de tecnologia, como Google, Facebook e Amazon.
FILE – A car passes Facebook’s new Meta logo on a sign at the company headquarters on Oct. 28, 2021, in Menlo Park, Calif. Facebook parent Meta is laying off 13% of its employees as it contends with f — Foto: Tony Avelar/AP
As autoridades também esperam que uma proibição aos chamados “impostos sobre serviços digitais”, que vencerá no começo de 2024, possa ser estendida até que se chegue a um consenso sobre a reforma global de impostos. Sem uma extensão, guerras comerciais deverão acontecer à medida que os países avançam sozinhos nas tentativas de obter mais receita das 100 maiores multinacionais do mundo, que estão cobertas pelo acordo.
Os negociadores esperam adiar a proibição para 2025 por temerem que alguns países tenham dificuldades para ratificar o acordo. Entre eles estão os Estados Unidos, onde muitas das maiores empresas de tecnologia do mundo têm sedes.
Uma fonte ligada as negociações disse que “o grande elefante político na sala” é se os EUA conseguirão fazer o Congresso aprovar qualquer acordo firmado na OCDE. Embora o governo Biden apoie o acordo da OCDE, que foi provisoriamente aprovado no quarto trimestre de 2021, mudanças no acordo tributário exigem uma maioria de dois terços no Senado para ratificação.
Enquanto isso, alguns mercados emergentes temem que a solução global à tributação das Big Techs – apelidada de “Pilar um” nos círculos tributários mundiais – reduzirão suas receitas. “A Índia em particular está sendo muito difícil”, disse uma fonte ligada as negociações.
O objetivo das mudanças é atualizar as regras internacionais para que as 100 maiores companhias do mundo paguem mais impostos onde fazem negócios. Hoje, os ministérios das finanças só podem tributar as receitas de uma empresa se ela estiver fisicamente presente nos países – uma abordagem que não é mais adequada na era da digitalização.
O novo sistema exigiria que as multinacionais pagassem impostos com base no local onde as vendas são feitas – uma mudança que segundo a OCDE alterará onde cerca de US$ 200 bilhões em lucros são tributados.
Especificamente, as mudanças se aplicarão às multinacionais com mais de 20 bilhões de euros em receitas e uma margem de lucro acima de 10%. Para essas companhias, 25% de seus lucros acima da margem de 10% seriam taxados nos países onde elas realizam as vendas.
As objeções da Índia e de outros mercados emergentes se concentram nessa fórmula, que segundo eles vai favorecer os países desenvolvidos porque as maiores multinacionais realizam mais vendas nas economias mais ricas. A Índia também tem um imposto sobre serviços digitais do qual teria de abdicar caso assine o acordo.
A insatisfação dos países em desenvolvimento com a maneira que as negociações estão caminhando está levando alguns a ignorar a proibição dos impostos sobre serviços digitais e buscar medidas próprias para tributar as gigantes tecnológicas.
O Sri Lanka originalmente participou das negociações na OCDE, mas em 2021 decidiu não apoiar o acordo político. Agora enfrentando uma crise econômica incapacitante que o obrigou a pediu um socorro de US$ 3 bilhões ao Fundo Monetário Internacional (FMI), o país está considerando a possibilidade de criar um imposto de serviços digitais sobre “e-business”.
Mesmo assim, duas fontes disseram ao “Financial Times” que o país está sob pressão do FMI para desistir desse plano e assinar o acordo da OCDE. A posição do FMI é de que “esse novo imposto prejudicaria os investimentos externos diretos no Sri Lanka”, disse uma autoridade do governo.
“Medidas unilaterais não são a melhor solução, a solução ideal definitivamente é a cooperação… mas a solução mais realista para os países em desenvolvimento agora é adotar as medidas unilaterais”, diz Verónica Grondona, ex-chefe da área de impostos internacionais da autoridade tributária da Argentina, que até janeiro esteve envolvida nas discussões.
As empresas que têm lutado para cumprir com o atual modelo “remendado” estão nervosas com a possibilidade de um fracasso do acordo.
A Câmara Internacional do Comércio alertou no mês passado que a importância de “um sistema tributário estável e previsível” para as empresas “não pode ser exagerada”. Apenas um acordo global e ratificado e que seja amplamente implementado poderia “alcançar esse objetivo”, disse a associação em uma carta enviada ao secretariado da OCDE no mês passado.
As discussões terminam nesta quarta-feira. Os negociadores pretendem publicar um texto acordado sobre a mudança de regra global, que eles veem como passos importantes para avançar para uma cerimônia de assinatura no fim deste ano. Espera-se que os países ratifiquem o acordo em suas legislaturas depois disso.
No entanto, mesmo que um acordo provisório seja firmado esta semana em Paris, uma fonte disse que “não está claro” se haverá uma “massa crítica” de signatários até o fim de 2023.