Ação direta no STF questiona legalidade da lei 14.317/22 e pede devolução de valores supostamente arrecadados em excesso
O Partido Novo, conhecido por sua atuação liberal e crítica a práticas que julga excessivas por parte do Estado, protocolou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn) no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a lei 14.317/22, que alterou substancialmente a cobrança de taxas de fiscalização aplicadas pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A ação, que questiona o aumento de valores e a mudança de metodologia da taxa sobre mercados e títulos de valores imobiliários, tem potencial de gerar impactos significativos no setor financeiro brasileiro.
A iniciativa do partido levou o ministro Flávio Dino a determinar que a CVM preste esclarecimentos à Suprema Corte no prazo de 15 dias. O conteúdo da decisão foi revelado em reportagem do portal Bahia Notícias, parceiro editorial do site BP Money.
Entenda a origem da ação do Partido Novo contra a CVM
A ADIn movida pelo Partido Novo argumenta que os valores cobrados pela CVM com base na lei 14.317/22 ultrapassam os limites constitucionais impostos às taxas públicas. Segundo a legenda, as cobranças devem refletir diretamente os custos da atividade estatal exercida — neste caso, a fiscalização do mercado de capitais —, mas estariam sendo utilizadas como instrumento de arrecadação genérica, violando o princípio da proporcionalidade e da vinculação da taxa ao serviço público específico prestado.
O partido destaca que, entre os anos de 2022 e 2024, a CVM arrecadou cerca de R$ 2,1 bilhões, enquanto seu orçamento operacional no mesmo período foi de R$ 670 milhões. A diferença expressiva estaria sendo absorvida pelo Tesouro Nacional, o que, na visão do Novo, configura um desvio de finalidade.
O que diz a Constituição sobre as taxas públicas?
O debate sobre a natureza jurídica das taxas e sua distinção em relação aos impostos está no cerne da ação. Conforme os artigos 145, inciso II, e 150, inciso IV, da Constituição Federal, a taxa deve ser um tributo vinculado, ou seja, ela só pode ser cobrada como contraprestação de um serviço público específico e efetivamente prestado ao contribuinte.
No caso da CVM, argumenta o partido, o aumento das taxas com base na lei 14.317/22 teria extrapolado essa função, uma vez que os valores não estariam mais diretamente associados ao custo real das atividades de fiscalização exercidas pela autarquia. Em vez disso, a arrecadação extra teria se transformado em recurso adicional ao Tesouro, destoando da finalidade original.
Além da Constituição, o partido também embasa sua ação em súmulas do Superior Tribunal de Justiça (STJ). A Súmula 43 e a Súmula 54 estabelecem critérios sobre a incidência de correção monetária e juros de mora em débitos fiscais e sua vinculação ao fato gerador, apontando que taxas não podem ser reajustadas ou cobradas de forma arbitrária.
Pedido de liminar e medidas cautelares
No documento protocolado no STF, o Partido Novo solicita medida liminar para impedir que os valores arrecadados em excesso pela CVM sejam utilizados ou incorporados ao orçamento público enquanto não houver decisão definitiva da Corte. O partido pede que os recursos sejam depositados em conta específica com rendimento, a fim de evitar prejuízos irreversíveis aos contribuintes e à segurança jurídica.
A legenda ainda argumenta que o uso das taxas com fins de arrecadação fere os princípios constitucionais da legalidade tributária, da vedação ao confisco e da proporcionalidade — pilares fundamentais do sistema tributário brasileiro.
Repercussões no mercado financeiro
A ação pode abrir um precedente importante para outras entidades reguladas e participantes do mercado financeiro, especialmente diante do aumento da pressão regulatória e fiscal sobre operações com valores mobiliários. A CVM, por sua vez, terá que justificar a relação entre os valores cobrados e o custo efetivo da atividade de fiscalização.
Além disso, caso o STF reconheça a inconstitucionalidade da lei 14.317/22, o impacto poderá ser duplo: financeiro, com possível devolução dos valores arrecadados indevidamente, e institucional, com o fortalecimento do controle judicial sobre o poder de tributar das agências reguladoras.
CVM deverá apresentar esclarecimentos ao STF
Conforme decisão do ministro Flávio Dino, a CVM tem 15 dias para apresentar defesa formal sobre a legalidade dos critérios estabelecidos pela lei 14.317/22. A autarquia deverá esclarecer como os valores das taxas foram calculados, como são aplicados, e justificar se há de fato uma correspondência com os custos operacionais de fiscalização do mercado de capitais.
Caso os esclarecimentos não sejam satisfatórios ou revelem indícios de ilegalidade, o STF poderá optar por suspender os efeitos da lei temporariamente ou até mesmo declarar sua nulidade, total ou parcial.
Possíveis desdobramentos e impacto no STF
A expectativa é que o caso se torne um dos principais julgamentos tributários do ano de 2025, especialmente por envolver um tema de alta complexidade e relevância para a segurança jurídica no setor econômico. A decisão do Supremo pode influenciar também o comportamento de outras autarquias e órgãos fiscalizadores que cobram taxas de fiscalização semelhantes, como Banco Central, ANS e ANEEL.
O papel da ADIn na proteção dos direitos dos contribuintes
A Ação Direta de Inconstitucionalidade é uma das ferramentas jurídicas mais eficazes para o controle de constitucionalidade das leis no Brasil. Por meio dela, partidos políticos com representação no Congresso, a Procuradoria-Geral da República, o presidente da República, entre outros, podem questionar dispositivos legais que ferem princípios constitucionais.
Neste caso, o Partido Novo assume um protagonismo político ao defender a correlação entre cobrança pública e serviço efetivamente prestado, além de chamar atenção para o risco de confisco disfarçado de taxa — prática que, segundo o partido, compromete o ambiente de negócios e o investimento no país.
Um debate que vai além do jurídico
Embora a ADIn proposta pelo Partido Novo contra a CVM tenha uma natureza predominantemente jurídica, o caso levanta questões profundas sobre transparência, responsabilidade fiscal e a natureza das taxas no Brasil. A atuação do STF será determinante para balizar os limites entre regulação legítima e excesso de arrecadação, temas centrais para a estabilidade institucional e o desenvolvimento econômico sustentável.
Com o avanço do processo, o mercado, investidores e demais entes regulados pela CVM seguirão atentos aos desdobramentos, que podem redefinir a relação entre contribuinte e Estado no setor financeiro.