Cassação de Eduardo Bolsonaro: relator pede arquivamento e reacende debate sobre imunidade parlamentar
O processo de cassação de Eduardo Bolsonaro ganhou novo desfecho nesta quarta-feira (8/10), após o relator Marcelo Freitas (União Brasil-MG) recomendar o arquivamento do pedido apresentado pelo Partido dos Trabalhadores (PT). A decisão, que ainda será votada pelo Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, reacende o debate sobre os limites da imunidade parlamentar e a atuação de parlamentares brasileiros no exterior.
Relator defende arquivamento e aponta proteção constitucional
Segundo o parecer do deputado Marcelo Freitas, o pedido de cassação de Eduardo Bolsonaro é “inadmissível”, uma vez que as declarações e ações atribuídas ao parlamentar estão resguardadas pela imunidade prevista no artigo 53 da Constituição Federal. O relator ressaltou que, independentemente do teor das manifestações, elas configuram exercício da atividade política, protegida pela lei.
Para Freitas, punir um parlamentar por declarações políticas, ainda que polêmicas, significaria “extrapolar o sentido constitucional da imunidade parlamentar” e abrir precedente para perseguições de natureza ideológica. O relatório reforça que, até o momento, não há indícios de quebra de decoro parlamentar que justifiquem sanção.
O parecer será submetido à votação no Conselho de Ética, que poderá acatar ou rejeitar o arquivamento. A expectativa é de que o tema volte à pauta após o pedido de vista coletiva solicitado por membros do colegiado.
Entenda o que motivou o processo de cassação de Eduardo Bolsonaro
O processo contra o deputado foi apresentado pelo PT, sob a alegação de que Eduardo Bolsonaro teria “atuado contra o Brasil” enquanto se encontrava nos Estados Unidos, país em que reside desde março. O partido o acusa de defender publicamente as sanções econômicas impostas pelo governo Donald Trump ao Brasil e de apoiar a cassação de vistos de autoridades brasileiras, além de incentivar medidas contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes e sua esposa, com base na chamada Lei Magnitsky.
Para os petistas, essas declarações configurariam uma tentativa de constranger instituições brasileiras e atentar contra a soberania nacional. No entanto, o relator do caso entendeu que as manifestações se enquadram no exercício da liberdade de expressão e crítica política, não havendo elementos para cassação.
Defesa reforça direito à liberdade de expressão
Como o parlamentar não compareceu à sessão nem apresentou advogado, a Defensoria Pública da União (DPU) designou o defensor Sérgio Armanelli Gibson para representá-lo. Em sua manifestação, Gibson sustentou que as falas de Eduardo Bolsonaro estão protegidas pelo direito à liberdade de expressão e pela imunidade material, prerrogativas fundamentais do mandato parlamentar.
De acordo com a defesa, não há provas de que o deputado tenha praticado atos concretos de cooperação com governos estrangeiros contra o Brasil. Assim, o arquivamento seria a medida mais adequada diante da ausência de evidências e da proteção constitucional que o cargo confere.
Base governista pode recorrer da decisão
Mesmo com a recomendação de arquivamento, a base governista ainda pode recorrer da decisão. O líder do PT na Câmara já havia tentado afastar Marcelo Freitas da relatoria, alegando suposta amizade pessoal entre ele e Eduardo Bolsonaro. O pedido, no entanto, foi negado pelo presidente do Conselho de Ética, Fábio Schiochet (União Brasil-SC), que considerou não haver motivo suficiente para suspeição.
Se houver recurso, o caso poderá ser reavaliado por nova relatoria ou levado a plenário, o que tende a prolongar o embate político e jurídico em torno do filho do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Outras investigações em curso
Além do processo de cassação de Eduardo Bolsonaro na Câmara, o deputado também é alvo de investigações no Supremo Tribunal Federal (STF) e de uma denúncia apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
No fim de setembro, a PGR o acusou de coação no curso do processo, alegando que ele teria tentado interferir em ações envolvendo o pai, Jair Bolsonaro, utilizando o argumento de sanções econômicas impostas pelos Estados Unidos ao Brasil.
O STF também apura a suposta prática de crimes contra a soberania nacional, no mesmo inquérito que resultou na prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro, por descumprimento de medidas cautelares impostas pelo ministro Alexandre de Moraes.
Esses casos mostram que, mesmo com o possível arquivamento no Conselho de Ética, Eduardo Bolsonaro permanece sob forte escrutínio judicial e político.
Imunidade parlamentar volta ao centro do debate
O parecer de Marcelo Freitas reacende o debate sobre os limites da imunidade parlamentar no Brasil. A Constituição protege deputados e senadores por quaisquer opiniões, palavras e votos relacionados ao exercício do mandato. Contudo, há divergências jurídicas sobre até onde vai essa proteção quando as declarações ultrapassam o território nacional ou envolvem governos estrangeiros.
Especialistas em direito constitucional apontam que a imunidade parlamentar é um instrumento essencial para garantir a independência dos Poderes e evitar perseguições políticas. Por outro lado, há quem defenda que, em tempos de hiperexposição digital e atuação internacional de políticos, o Congresso precisa redefinir os parâmetros de conduta.
O caso de Eduardo Bolsonaro se tornou simbólico nesse embate, refletindo a tensão entre liberdade política e responsabilidade institucional.
Clima político e impacto no Legislativo
Nos bastidores da Câmara, o arquivamento da cassação de Eduardo Bolsonaro é visto como um alívio para a oposição, que busca evitar novas punições a aliados do ex-presidente. Já para partidos governistas, a decisão representa mais um obstáculo na tentativa de responsabilizar membros do chamado “bolsonarismo” por condutas consideradas antidemocráticas.
A oposição argumenta que o Conselho de Ética tem sido utilizado como instrumento político para desgastar adversários. Já a base aliada sustenta que a impunidade parlamentar mina a credibilidade do Legislativo e enfraquece o equilíbrio entre os Poderes.
O resultado da votação do parecer será determinante para medir a correlação de forças dentro do Congresso e poderá influenciar futuras disputas políticas em torno do núcleo bolsonarista.
O que está em jogo
A decisão final sobre o processo de cassação de Eduardo Bolsonaro pode ter repercussões que vão além do caso individual. Ela pode redefinir a interpretação sobre atos de parlamentares no exterior, o alcance da imunidade material e os limites da liberdade de expressão política.
Enquanto o Conselho de Ética não vota o relatório, o caso segue como um termômetro do momento político do país — marcado pela disputa entre garantias constitucionais e a necessidade de responsabilização política.
Independentemente do desfecho, o episódio reforça como as ações e falas de figuras públicas continuam a ser julgadas não apenas no campo jurídico, mas também no tribunal da opinião pública.






