Vitória de Donald Trump: Impactos para as Relações Diplomáticas entre Brasil e Estados Unidos
A recente vitória de Donald Trump nas eleições americanas desta terça-feira (5) levanta questões sobre como a política externa dos Estados Unidos pode influenciar suas relações com o Brasil. A perspectiva de uma nova administração Trump no comando dos EUA pode trazer mudanças substanciais em temas como democracia, meio ambiente, comércio com a China e as posturas diante dos conflitos internacionais, com potenciais implicações para o Brasil.
Especialistas como Tanguy Baghdadi, professor de relações internacionais e fundador do podcast Petit Journal, e Hussein Kalout, cientista político e ex-secretário de Ações Estratégicas do governo de Michel Temer, discutiram os possíveis desdobramentos dessa nova dinâmica.
1. Uma Relação Bilateral Cautelosa entre Brasil e EUA
Baghdadi observa que, embora Trump tenha um estilo de liderança que busca alianças com líderes que aceitem seu protagonismo, o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva já mostrou uma disposição em dialogar com líderes de diferentes espectros políticos. A expectativa é de uma relação “protocolar e respeitosa”, com manutenção de acordos bilaterais já existentes, mas permeada por uma certa frieza e desconfiança inicial. Para Baghdadi, essa dinâmica deve pautar os primeiros meses da nova gestão Trump, especialmente diante das diferenças políticas entre ele e Lula.
2. Potenciais Efeitos no Cenário Político Brasileiro com a Vitória de Donald Trump
A vitória de Donald Trump também pode repercutir na política interna brasileira, especialmente considerando que Trump apoiou o ex-presidente Jair Bolsonaro durante as eleições de 2022. Baghdadi e Kalout alertam para a possibilidade de um cenário eleitoral desafiador para a esquerda no Brasil, caso Trump adote uma postura de apoio a uma eventual candidatura alinhada ao bolsonarismo em uma próxima eleição.
Kalout argumenta que, se houver questionamentos quanto ao processo eleitoral brasileiro, Trump possivelmente adotará uma posição favorável ao campo bolsonarista, um comportamento que difere radicalmente da neutralidade adotada pela administração Biden. Essa posição pode acirrar ainda mais as divisões políticas no Brasil, dado que tanto Trump quanto Bolsonaro enfrentam investigações por tentativas de subverter processos democráticos.
3. Impacto Ambiental e Desafios na Política Externa com a China e Venezuela
Outro aspecto relevante com a vitória de Donald Trump e sua volta à Casa Branca diz respeito às políticas ambientais e às relações comerciais com a China. Kalout adverte que o Brasil, que atualmente conta com uma postura de diálogo com os EUA sob a administração Biden, pode se ver “empurrado a buscar um alinhamento quase automático com a China”. Isso seria uma resposta ao caráter mais agressivo de Trump em relação à China, comparado ao tom mais moderado de Biden.
No que diz respeito ao meio ambiente, Trump já demonstrou anteriormente uma postura de ceticismo em relação ao aquecimento global e à proteção ambiental. Esse aspecto pode trazer dificuldades para o Brasil, que, sob a liderança de Lula, tem buscado reforçar sua imagem como defensor da sustentabilidade. Esse contraste nas políticas ambientais entre EUA e Brasil poderá ser um ponto de atrito, especialmente em fóruns internacionais.
A questão da Venezuela é outro tema sensível. Enquanto o governo brasileiro defende um diálogo diplomático com o governo de Nicolás Maduro, Trump deve manter uma linha dura, reforçando sanções e condenando a liderança venezuelana. Kalout ressalta que essa postura agressiva de Trump em relação à Venezuela pode dificultar uma posição neutra para o Brasil, aumentando a pressão para que o governo brasileiro tome uma posição mais explícita.
4. Relações de Comércio e Parceria Militar entre Brasil e Estados Unidos
Apesar de os Estados Unidos serem o segundo maior parceiro comercial do Brasil, Kalout explica que os países são considerados “parceiros”, e não aliados, pois não possuem uma relação de apoio militar direto. Esse entendimento diferencia a relação Brasil-EUA das parcerias americanas com países como Japão, Reino Unido e Coreia do Sul, por exemplo.
Esse status de parceria pode ser mantido na nova gestão Trump, mas as posturas comerciais podem mudar substancialmente, especialmente em relação a acordos bilaterais envolvendo tarifas e exportações. O Brasil, que tem tentado equilibrar sua relação com os EUA e a China, pode ver suas escolhas comerciais impactadas pela rivalidade entre os americanos e os chineses, que deve se intensificar sob a liderança de Trump.
5. Postura Internacional: Conflitos na Ucrânia e no Oriente Médio
Baghdadi observa que o Brasil e os Estados Unidos possuem perfis distintos em suas políticas externas, o que fica evidente em relação aos conflitos na Ucrânia e no Oriente Médio. O Brasil adota uma postura diplomática que privilegia o diálogo e a neutralidade, enquanto a política externa dos EUA, particularmente sob Trump, tende a adotar posições mais polarizadoras e decisivas.
A vitória de Donald Trump pode trazer uma nova onda de apoio aos aliados americanos na Ucrânia contra a Rússia, e uma postura mais severa em relação ao Irã e outros países do Oriente Médio. Esses posicionamentos, contudo, podem divergir da diplomacia brasileira, que tem se aproximado de países com perfis políticos mais semelhantes ao do Brasil.
Desafios e Oportunidades para a Diplomacia Brasil-EUA com a Vitória de Donald Trump
A vitória de Donald Trump traz uma série de desafios para o Brasil na manutenção de uma diplomacia que equilibre interesses internos e externos. O cenário deve ser de uma relação bilateral prudente e calculada, onde os temas mais delicados serão tratados com cautela por ambas as nações. A postura dos EUA no que diz respeito à democracia, meio ambiente e comércio pode pressionar o Brasil a tomar decisões difíceis em nível internacional, especialmente em relação à China e aos conflitos em andamento.
Ao completar 200 anos de relações diplomáticas, Brasil e Estados Unidos entram em uma fase em que a prudência e o pragmatismo serão essenciais para a estabilidade do relacionamento entre as duas nações. A vitória de Donald Trump sinaliza um caminho de ajustes diplomáticos, onde o Brasil tentará manter uma posição de diálogo sem abrir mão de sua autonomia nas políticas ambiental e comercial.