A proximidade das eleições argentinas tem aumentado a resistência do Fundo Monetário Internacional (FMI) em fechar um acordo com o país. O governo de Alberto Fernández pede a antecipação dos desembolsos previstos no atual programa de crédito e, segundo economistas, o Fundo não tem interesse em deixar de negociar, tomar um eventual calote e voltar a ser apontado como um dos eventuais responsáveis pela quebra da Argentina.
Por outro lado, o FMI quer garantias de que a Argentina – já sob o novo governo eleito – terá recursos para pagar o vencimento de dezembro da parcela do empréstimo de mais de US$ 44 bilhões que liberou no ano passado. Mas o país não tem como assegurar isso de modo sustentável.
O governo conseguiu adiar os pagamentos dos vencimentos da dívida deste mês dos dia 21 e 22 para o dia 30, o FMI não endureceu o tom e sinalizou para a continuidade da negociação. “O FMI não quer ser visto da mesma forma que em 2001, como a parte intransigente responsável pela quebra da Argentina, mesmo sabendo que não seria o responsável direto por isso”, diz a economista argentina Marina Dal Poggetto, da Universidad Torcuato Di Tella.
O presidente da Argentina, Alberto Fernández, fala em evento na Casa Rosada, sede do governo argentino — Foto: Facebook/@alferdezok
Para Dal Poggetto, o Fundo seguirá revendo formas de negociar com a Argentina, mesmo que não atenda ao pedido de antecipar os desembolsos. “É possível que exista uma contraproposta, de antecipar algum crédito ou refinanciar algum vencimento da dívida, mas não interessa ao Fundo que os termos do acordo inicial [firmado em março de 2022] se desfaça.”
O adiamento nos atuais pagamentos dos vencimentos ainda não é considerado um atraso formal e, portanto, não acendeu o alerta de possível default. “O processo para entrar em um default formal com o FMI tem outros prazos. Existe a postergação do pagamento, mas há também um tempo adicional para que se paguem esses valores antes de se considerar que houve um atraso formal e então um default”, explica o economista Gabriel Caamaño, sócio da Consultora Ledesma.
Segundo o economista Fausto Spotorno, diretor da Escola de Economía da Universidad Argentina de la Empresa, pode se levar até seis meses para a declaração de um default. “O atraso do pagamento em 30 dias não leva a nenhuma consequência formal. Depois são dadas diferentes intimações e então, dentro de seis meses, é possível afirmar que houve um default.”
A Argentina tinha US$ 2,7 bilhões a pagar nesta semana ao FMI. O ministro da Economia argentino, Sergio Massa, argumenta que o governo não conseguiu cumprir as metas de acumulação de reservas e redução do déficit fiscal em consequência da forte estiagem, que afetou as exportações agrícolas.
“O governo está usando o prazo que tem. Claro que tem a questão da seca, mas não é só essa a causa [do descumprimento]. Agora é preciso recalcular as metas”, afirma Caamaño. “O governo, na verdade, descumpriu todas as metas do acordo inicial e há pouca razão para crer que cumprirá as próximas”, diz.
A negociação com o FMI tem se estendido mais do que deveria justamente em razão do período eleitoral. “Considerando que hoje existe uma probabilidade maior de o próximo governo ser de oposição, é possível que tanto o FMI quanto os Estados Unidos – maior doador do Fundo – queiram escutar a opinião da oposição”, diz Spotorno.
Segundo Dal Poggetto, toda vez que uma negociação com o FMI ocorre em ano eleitoral, a oposição ganha peso nas conversas.
Enquanto isso, o governo tenta ganhar tempo. “Primeiro querem chegar até domingo [data da definição das listas de candidatos às primárias], depois até agosto [quando ocorrem as primárias] e aí até outubro [data do primeiro turno das eleições]”, afirma a economista.
A estratégia mais recente do governo Fernández e de seu ministro da Economia, Massa, tem sido a de afirmar que a dívida atual com o FMI não foi contraída por seu governo, já que o acordo de março de 2022 refinanciou o empréstimo concedido na gestão anterior, de Mauricio Macri.
“Agora [com o pedido de adiamento do pagamento dos vencimentos de junho], o FMI não endureceu, alongou o prazo até o dia 30 e chamou para a conversa. O FMI também está numa situação difícil, não dá para simplesmente apertar a Argentina e forçá-la a pagar [sem correr o risco de um calote]”, afirma Moisés Marques, coordenador de política e relações internacionais na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fesp). “E, num ambiente eleitoral, venha a solução que vier, o governo vai sempre vender a narrativa de uma vitória política”, diz.