As duas ofertas de capitalização no Casino, recebidas pela empresa ontem, opõe grandes forças empresariais europeias. Apesar da sinalização positiva para o grupo francês, o cenário continua muito complicado depois que parte dos credores se negaram a ir adiante em um acordo sobre as dívidas.
Na visão do mercado, a expectativa de que exista algum aporte fez a ação do Casino recuperar parte das perdas hoje. O reflexo chegou à bolsa brasileira, e a ação ON do GPA era a segunda maior alta do Ibovespa, avançando 3,51%.
Segundo um banco a par da situação do empresário e acionista do grupo, Jean-Charles Naouri, o Casino precisa agora analisar as condições das propostas e dar alguma visibilidade já nos próximos dias, dado o nível da pressão dos credores sobre a empresa.
Como informado pela companhia, uma das ofertas é da EP Global Commerce, veículo de investimento de Daniel Kretinsky, sócio do Casino, e apoiado pelo bilionário Marc Ladreit de Lacharriere, por meio de sua holding Fimalac, também acionista da varejista.
Lacharriere já foi controlador da agência Fitch e é acionista da Fimalac, agência francesa de classificação de crédito. Por sua vez, Kretinsky é sócio da rede alemã Metro, do jornal Le Monde, e de uma das maiores empresas de energia da Europa Central.
Já a segunda oferta é da holding 3F, liderada pelo banqueiro de investimentos Matthieu Pigasse, pelo magnata da telefonia Xavier Niel e pelo empresário Moez-Alexandre Zouari. Niel é acionista controlador do provedor francês de serviços de internet Iliad, que opera a marca Free.
As propostas foram apresentadas porque o Casino abriu espaço para negociação. O prazo dado prls rede para receber ofertas – a fim de reduzir sua alavancagem – acabava ontem. O teor das propostas deve ser divulgado amanhã apenas.
Segundo informações da “Reuters”, na primeira proposta, a capitalização no Casino seria de 1,35 bilhão de euros em novas ações, dos quais 900 milhões de euros seriam aportados por Kretinsky e Lacharriere, logo, com diluição de Naouri, que perderia a posição de controlador.
Entre 750 milhões e 900 milhões de euros viriam diretamente da dupla de empresários, segundo o Valor apurou hoje com uma fonte que acompanha as negociações. A soma restante viria de bancos credores do Casino.
A segunda proposta seria de 900 milhões de euros, com Pigasse Niel e Zouari colocando 300 milhões de euros, e o resto de atuais credores.
De qualquer forma, a pressão por um acordo vem aumentando por conta do movimento de credores nos últimos dias, que colocou o Casino perto da inadimplência.
A companhia informou, em comunicado ontem, que solicitou aos credores de “notes” – que estavam em processo de conciliação com a empresa nas últimas semanas, com supervisão do Tribunal do Comércio da França – que concordem com a suspensão de determinados pagamentos (juros e taxas e parte de um valor principal) e não acionem pedido de antecipação de vencimentos, segundo “covenants” (cláusulas que atrelam a dívida a um indicador financeiro) negociados para 30 de junho e 30 de setembro.
As empresas precisam seguir essa cláusulas em acordos de dívida, sob pena de pedido de antecipação de vencimento do débito total.
Parte dos titulares dessas notas concordou, mas outro conjunto de credores com papéis, cujo vencimento será em 2026 e 2027, não declararam apoio até o dia de ontem, segundo informações da empresa. Detentores de títulos emitidos pela Monoprix também foram contra.
“Esses titulares não concordaram em deixar de exercer qualquer dos seus direitos de execução relativamente ao não pagamento dos juros que lhes são devidos nos termos de suas notes (consistindo em aproximadamente 12 milhões de euros e 14 milhões de euros, com vencimento respectivamente em 15 de julho e 15 de outubro) durante o processo de conciliação”, disse o grupo ontem, em comunicado.
Isso pode acelerar a crise financeira na empresa, que foi se deteriorando depois de um aumento no volume das dívidas da empresa, suas controladas e holding, ao mesmo tempo que juros subiam na Europa.
As negociações da rede com credores envolvem dívidas de cerca de 6,4 bilhões de euros. O Casino pediu que o tribunal francês interceda na busca de uma conciliação no caso, ainda em negociação.
“O grupo irá solicitar ao presidente do Tribunal do Comércio, nos próximas dias, a aplicação de ‘délais de grâce’ [espécie de regra de tolerância, ou adiamento numa execução de dívida] segundo os termos do artigo L. 611-7 do Código Comercial”, disse a empresa ontem.
A dificuldade de sair da crise financeira obrigou o Casino a se mexer e colocar ativos à venda. O grupo informou, na semana passada, estar aberto a vender sua posição de 40% no GPA, além dos 96% da fatia no Éxito que está nas mãos do GPA.
Ocorre que o GPA já rejeitou uma proposta dias atrás por 96% do grupo colombiano, em razão de a oferta de US$ 836 milhões ter sido considerada baixa (inferior ao valor de mercado da empresa na bolsa da Colômbia). A proposta foi apresentada pelo empresário, dono de negócios em alimentos e bancos Jaime Gilinski.
Havia uma expectativa de que Gilinski fizesse uma nova movimentação, considerando o interesse e a sinalização, segundo fonte, de que o controlador Casino continua aberto a negociar.
O Valor apurou que banqueiros e assessores financeiros ainda veem possível interesse dos chilenos do Cencosud, considerando que a empresa reorganizou sua estrutura de capital e ainda tem planos de crescer no país.