Se o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central tivesse baixado os juros ou mesmo indicado com certeza uma redução para agosto, teria repetido o deslize com a taxa Selic feito na gestão Alexandre Tombini.
Essa é a visão do ex-diretor de política monetária do Banco Central Mario Torós, que hoje é sócio da Ibiúna Investimentos. Para embasar seu argumento, ele cita um conjunto de indicadores que vêm sendo destacado pela própria autoridade monetária para ilustrar o quão próximos – ou distantes – estamos de um ciclo de queda da Selic.
A equipe da Ibiúna atualizou uma tabela que foi apresentada em alguns eventos públicos com investidores pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto. Ela compara a situação atual com as condições presentes nos últimos ciclos de corte de juro.
Os dados (veja a tabela) incluem, por exemplo, o desvio em relação às metas das expectativas de inflação e da inflação implícita; os núcleos de inflação e a inflação subjacente de serviços; e dados sobre a atividade econômica. A data de corte para a situação atual é a mesma da mais recente reunião do Copom, que ocorreu na semana passada e manteve os juros estáveis em 13,75% ao ano pelo sétimo encontro seguido.
Informações desfavoráveis para baixa de juros são apresentados em tons de vermelho na tabela. Na situação atual, elas são predominantes. Para Torós, estão numa situação equivalente à de agosto de 2011, quando Tombini fez o que ficou conhecido como “o cavalo-de-pau na política monetária”, interrompendo um ciclo de alta da taxa Selic para baixar de forma acelerada.
Torós diz que a tabela é um “desenho” que ilustra a situação atual e pode ajudar na compreensão do ministro da Fazenda, Fernando Haddad — que vem cobrando o Banco Central para começar a distensão monetária –, sobre porque seria contraproducente o Copom embarcar neste momento em um ciclo de baixa de juros.
“O ministro disse que não entendeu o comunicado do Copom. Sempre dá para desenhar”, afirma Torós. “Baixar o juro hoje seria quase que o equivalente ao que Tombini fez.”
A tabela de dados foi apresentada por Campos Neto um debate recente com empresários do setor de varejo. Ele sempre lembra que a tabela não representa nenhum gabarito para as decisões do Copom, mas o mercado passou a seguir a sua evolução porque a tabela apresenta de forma sintética fatores que são muito importantes na eventual decisão de baixa de juros.
“Sempre se pode dizer que existem outras variáveis [para olhar numa eventual decisão, além das que estão na tabela], mas é difícil fugir disso”, afirma Torós.
O ciclo de baixa de juros da gestão Tombini teve vida curta – no começo de 2013, o Banco Central teve que voltar a subir a Selic. Da mesma forma como agora, uma parte do mercado apoiava a ação do Copom. Quando as coisas deram errado, o Banco Central ficou sozinho como culpado do deslize e sofreu um baque grande na sua credibilidade.
Recuperar a credibilidade foi um trabalho penoso. O próprio Tombini levou os juros a 14,25% ao ano, ajudando a jogar o país numa recessão. Seu sucessor, Ilan Goldfajn, manteve os juros altos por algum tempo para reancorar as expectativas de inflação do setor privado. Só baixou a Selic quando a situação estava melhor, e colheu um período prolongado de juros mais baixos.
Como ela acha que os dados da tabela vão evoluir até a reunião de agosto do Copom? “Está melhorando e, provavelmente, teremos menos vermelhos. Mas claramente não deveria ser o momento ainda de baixar”, afirma. “Se queremos um fim de ciclo com taxas mais baixas, duradouras, que se consolidem como patamar para o futuro, certamente a recomendação seria esperar um pouco mais.”
Mario Torós, sócio da Ibiuna Investimentos e ex-diretor do Banco Central — Foto: Ana Paula Paiva/Valor