Do ouro ao cripto: bancos ampliam apostas em ativos alternativos para driblar juros altos
O mercado financeiro brasileiro vive uma transformação silenciosa, porém profunda. Com os juros altos persistindo e o crédito tradicional cada vez mais restrito, grandes bancos e gestoras estão ampliando suas apostas em ativos alternativos, que vão desde o ouro até criptoativos, passando por operações de crédito estruturado e investimentos em empresas em dificuldades financeiras — os chamados special situations.
Esse movimento, que já vinha ganhando força nos últimos dois anos, se consolidou em 2025 como uma nova fronteira de rentabilidade e diversificação de portfólio para o sistema bancário brasileiro.
O crescimento dos ativos alternativos no Brasil
O ambiente de Selic elevada e inadimplência corporativa crescente fez com que os bancos buscassem novas estratégias para manter margens atrativas e atender clientes de alta renda com apetite por retorno acima do CDI. Nesse contexto, os ativos alternativos emergem como uma solução eficiente para driblar o impacto dos juros altos e oferecer rentabilidade diferenciada.
A categoria de ativos alternativos engloba desde ouro, criptoativos e fundos imobiliários, até créditos corporativos complexos, ações de empresas privadas (private equity) e operações estruturadas de dívida (special sits). No Brasil, o destaque atual recai sobre o segmento de special situations, que movimenta empresas em reestruturação financeira e projeta retornos anuais superiores a 20%.
O que são os “special sits” e por que estão em alta
O termo “special sits”, abreviação de special situations, descreve operações financeiras estruturadas voltadas para empresas em dificuldades financeiras ou em processo de recuperação judicial. Essas operações envolvem risco elevado, mas também potencial de lucro acima da média.
Entre as principais características dos special sits estão:
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Investimentos com garantias reais ou participação acionária.
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Modelos híbridos entre dívida e equity.
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Operações complexas, como distressed credit, post-M&A e debt-to-equity.
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Prazos de retorno mais longos e estrutura jurídica sofisticada.
Historicamente, esse tipo de investimento era restrito a gestoras independentes especializadas, como Jive Investments, Starboard, Prisma Capital, Quadra Capital e G5 Partners. Agora, bancos tradicionais como Itaú, BTG Pactual e Bradesco entraram com força nesse mercado, alterando completamente o seu perfil competitivo.
Por que os bancos estão investindo em ativos alternativos
A entrada dos grandes bancos no segmento de ativos alternativos responde a uma combinação de fatores econômicos e estratégicos:
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Compressão de margens: o crédito tradicional oferece menos retorno com juros altos e maior risco de inadimplência.
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Busca por diversificação: os bancos querem ampliar o mix de produtos para clientes institucionais e de private banking.
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Competição com fintechs e FIDCs: novas plataformas financeiras pressionam as margens das instituições tradicionais.
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Oportunidade de retorno: ativos ilíquidos e operações especiais podem render entre 20% e 30% ao ano.
Além disso, os bancos estão criando braços especializados em crédito estruturado e reestruturação, muitas vezes em parceria com fundos estrangeiros e consultorias jurídicas. Essa nova postura marca o início de uma institucionalização do mercado de ativos alternativos no Brasil.
Criptoativos e ouro voltam ao radar dos bancos
O interesse bancário por criptoativos e ouro também ganha destaque em 2025. Ambos são vistos como reservas de valor e proteção contra inflação em períodos de instabilidade monetária.
O Bitcoin, por exemplo, já é tratado por alguns bancos como uma classe legítima de investimento alternativo. Plataformas como o BTG Digital Assets e o PicPay Cripto expandem suas ofertas para investidores institucionais.
Já o ouro registrou recorde histórico de US$ 4.100 em meio às tensões entre EUA e China, reforçando seu papel como porto seguro em períodos de incerteza global. Vários bancos brasileiros reativaram ou ampliaram fundos atrelados ao metal precioso, combinando-o com ETFs de commodities e ativos tokenizados.
Consolidação entre gestoras independentes
Com a entrada dos grandes bancos no setor, as gestoras independentes enfrentam um novo ciclo de consolidação. A dificuldade de captação em um ambiente de Selic alta e o aumento da competição impulsionam fusões, aquisições e parcerias estratégicas.
Entre as principais tendências:
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Fusões para ganhar escala e captar com fundos de pensão e family offices.
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Venda de carteiras de crédito inadimplente para fundos maiores ou estrangeiros.
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Plataformas de co-investimento com bancos e gestoras globais.
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Foco em nichos específicos, como o varejo em recuperação judicial e o setor imobiliário.
O resultado é um mercado mais profissionalizado, com operações juridicamente complexas e um nível elevado de governança e compliance.
Juros altos: um incentivo à inovação financeira
O cenário prolongado de juros altos no Brasil tem restringido o crédito tradicional, forçando pequenas e médias empresas a buscarem fontes alternativas de financiamento. Os ativos alternativos, especialmente os special sits, passaram a suprir essa lacuna com modelos mais flexíveis e personalizados.
Essas operações oferecem:
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Modelagem jurídica sob medida;
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Possibilidade de reestruturação de dívidas;
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Participação acionária do investidor na retomada do negócio.
Setores como varejo, agronegócio, construção civil e logística estão entre os principais beneficiados por essa modalidade.
Quem investe em ativos alternativos
O perfil do investidor desse mercado é sofisticado e de longo prazo. Os principais players são:
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Family offices que buscam diversificação e proteção patrimonial.
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Fundos de pensão e instituições financeiras com metas de retorno absoluto.
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Investidores estrangeiros, especialmente fundos de private equity focados em emergentes.
Esses investidores entendem que o risco elevado é compensado por retornos potencialmente superiores, com ganhos de 20% a 30% anuais em operações bem-sucedidas de reestruturação.
Desafios e riscos do setor em 2025
Apesar da expansão, o setor de ativos alternativos enfrenta desafios relevantes:
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Risco jurídico — muitas operações envolvem litígios complexos e recuperação judicial.
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Baixa liquidez — o retorno depende da maturação do ativo, que pode levar anos.
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Valorização volátil das garantias — ativos usados como colateral podem perder valor em crises econômicas.
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Concorrência internacional — fundos estrangeiros com capital em dólar podem pressionar preços e margens.
Mesmo assim, a tendência de crescimento é clara, com projeções de expansão de dois a três anos impulsionadas pela inovação tecnológica e pela entrada de capital estrangeiro.
Tecnologia e inteligência de dados impulsionam o setor
O uso de inteligência artificial, análise de dados e modelagem preditiva vem revolucionando a avaliação de risco em operações de ativos alternativos. Bancos e gestoras estão integrando essas ferramentas para precificar ativos com maior precisão, reduzir inadimplência e automatizar auditorias de crédito.
Essa evolução tecnológica tem sido decisiva para atrair novos investidores e aumentar a transparência do setor — fatores cruciais para a consolidação desse novo modelo de investimento no Brasil.
O futuro dos ativos alternativos no Brasil
Os ativos alternativos já não são mais um nicho, mas uma parte essencial da estratégia dos bancos e investidores institucionais. Com os juros ainda em patamares elevados e o crédito tradicional limitado, o Brasil vive uma nova era em que ouro, cripto e operações estruturadas coexistem como pilares da rentabilidade financeira.
A expectativa é que, até 2027, o volume sob gestão em ativos alternativos dobre, impulsionado pela entrada de bancos, fintechs e investidores globais. O país se consolida, assim, como um dos principais mercados emergentes para estratégias de investimento não tradicionais, unindo rendimento, inovação e diversificação.






