Crédito do Trabalhador: aumento de 80% no consignado acende alerta sobre endividamento no Brasil
O Crédito do Trabalhador, nova modalidade de empréstimo consignado lançada pelo Governo Lula em 2025, tem causado grande impacto na economia brasileira. Em apenas cinco meses, o volume de operações consignadas disparou 80%, saltando de R$ 18,4 bilhões em fevereiro para R$ 33,1 bilhões em julho, segundo dados do Banco Central (BC).
Criado para facilitar o acesso dos trabalhadores da iniciativa privada a empréstimos com juros menores, o programa acabou gerando um efeito colateral preocupante: o endividamento acelerado das famílias brasileiras. Com o crédito fácil disponível diretamente na folha de pagamento, muitos brasileiros recorreram à nova linha sem planejamento financeiro, o que levanta o alerta de uma possível crise de inadimplência nos próximos meses.
O que é o Crédito do Trabalhador
O Crédito do Trabalhador é uma modalidade de crédito consignado destinada a empregados do setor privado. O diferencial é o desconto automático das parcelas diretamente na folha de pagamento, o que reduz o risco para os bancos e permite juros menores do que os praticados em empréstimos pessoais comuns.
A iniciativa ampliou o acesso ao crédito para grupos que antes tinham dificuldade de obter empréstimos, como trabalhadores rurais, domésticos e temporários. O programa também permite o uso do FGTS e da multa rescisória como garantias, o que ajuda as instituições financeiras a conceder crédito com menor risco.
Porém, na prática, o Crédito do Trabalhador vem sendo contratado majoritariamente por pessoas com baixa renda e menor escolaridade, exatamente o grupo mais vulnerável ao superendividamento. Esse público, atraído pela promessa de juros reduzidos, muitas vezes não considera o impacto das parcelas no orçamento mensal.
O salto no endividamento brasileiro
De acordo com o Banco Central, entre março e julho de 2025 foram firmados 3 milhões de contratos de crédito consignado privado. Desses, 2,3 milhões pertencem à nova modalidade Crédito do Trabalhador.
O valor total liberado chegou a R$ 21,9 bilhões, sendo R$ 13,6 bilhões referentes exclusivamente ao novo programa. O crédito consignado tradicional, por outro lado, cresceu em ritmo mais lento, somando R$ 8,3 bilhões no mesmo período.
Essa explosão mostra a adesão massiva da população, mas também expõe o risco de endividamento estrutural. Trabalhadores com renda mais baixa comprometem parte significativa do salário com prestações, o que reduz o poder de compra e aumenta a vulnerabilidade financeira.
Juros do Crédito do Trabalhador ainda são altos
Embora o Crédito do Trabalhador tenha sido anunciado como uma opção de juros mais baixos, os números mostram o contrário. A taxa média de juros dessa modalidade atingiu 58% ao ano, contra 36,2% do crédito consignado tradicional, de acordo com o Banco Central.
A diferença é explicada pelo maior risco de inadimplência. O cruzamento de informações com a Relação Anual de Informações Sociais (Rais) revela que os tomadores do novo crédito geralmente têm empregos menos estáveis, trabalham em empresas pequenas e recebem salários mais baixos.
Em média, a renda caiu de R$ 2.925 para R$ 2.603, mostrando que quem mais busca o crédito é também quem menos tem condições de arcar com novas dívidas.
O perigo do crédito fácil
O acesso facilitado ao Crédito do Trabalhador cria uma armadilha silenciosa. A possibilidade de contratar empréstimos com poucos cliques e o desconto automático no salário transmitem uma falsa sensação de segurança.
Levantamento da Abefin (Associação Brasileira dos Profissionais de Educação Financeira) mostra que 69% dos brasileiros não calcularam o impacto das parcelas no orçamento antes de contratar o crédito, e 83% não sabem a taxa de juros que estão pagando.
Além disso, 64% dos tomadores usaram o crédito para consumo imediato ou emergências, sem quitar dívidas antigas. Isso gera um efeito bola de neve, no qual o trabalhador acumula novas parcelas sem eliminar as dívidas anteriores.
Quando o crédito se transforma em armadilha
De acordo com especialistas, o Crédito do Trabalhador é vantajoso apenas quando utilizado de forma estratégica — ou seja, para trocar dívidas caras por dívidas baratas.
No entanto, a realidade é diferente. A maioria dos contratantes tem utilizado o crédito para consumo ou pagamento de contas emergenciais, o que eleva o risco de calote.
A inadimplência ainda é considerada baixa, mas tende a crescer se a renda continuar comprometida. Quando o trabalhador chega a comprometer mais de 80% da renda mensal com dívidas, a recuperação financeira se torna praticamente impossível.
O posicionamento do governo
O Ministério do Trabalho e Emprego defende o Crédito do Trabalhador como uma política de inclusão financeira. Segundo dados do próprio governo, até setembro de 2025 já foram contratados R$ 50 bilhões em crédito, beneficiando 5,4 milhões de brasileiros.
O argumento oficial é que o programa oferece juros mais baixos do que o crédito pessoal tradicional. Enquanto os empréstimos pessoais mantêm taxas médias de 11% ao mês, o Crédito do Trabalhador registra média de 3,42% ao mês.
Além disso, parte do volume contratado corresponde à renegociação de dívidas antigas, o que ajuda a limpar o nome de milhões de consumidores negativados.
Ainda assim, especialistas alertam que, sem educação financeira e controle orçamentário, o crédito acessível pode ter o efeito contrário: aumentar o endividamento da população.
Educação financeira: o ponto cego do programa
A expansão do Crédito do Trabalhador expôs um problema estrutural no Brasil — a falta de educação financeira. A maioria dos trabalhadores não possui conhecimento básico sobre juros, prazos e impacto do crédito sobre o orçamento familiar.
Sem planejamento, o empréstimo consignado acaba sendo usado como complemento de renda, e não como ferramenta de reorganização financeira.
Segundo economistas, a ausência de programas públicos de educação financeira faz com que o brasileiro continue repetindo um ciclo perigoso: recorrer ao crédito fácil para pagar dívidas antigas e acabar criando novas obrigações.
Perspectivas para 2026
Com a proximidade da Copa do Mundo de 2026 e a retomada gradual da economia, espera-se que o consumo das famílias continue em alta. Porém, o risco é que o Crédito do Trabalhador se torne uma bomba-relógio caso o mercado de trabalho não consiga gerar renda suficiente para sustentar o volume de endividamento.
Especialistas sugerem que o governo adote limites mais rígidos para o comprometimento da renda com empréstimos consignados e incentive campanhas educativas que ensinem a população a usar o crédito de forma consciente.
O Crédito do Trabalhador nasceu com uma proposta positiva — democratizar o acesso ao crédito e reduzir os juros para quem mais precisa. No entanto, o crescimento acelerado, aliado à falta de preparo financeiro da população, transformou o programa em um alerta nacional sobre o superendividamento.
Sem uma política pública sólida de educação financeira, o crédito fácil pode se tornar o novo vilão da economia doméstica, comprometendo a renda das famílias e travando o crescimento econômico a médio prazo.
O desafio, agora, é equilibrar inclusão financeira e responsabilidade, garantindo que o crédito cumpra seu papel social sem colocar em risco a estabilidade financeira dos trabalhadores brasileiros.






