Investimentos em startups caem mais de 50% no 3º tri, mostra pesquisa
Os fundos de venture capital (VC), conhecidos por adquirir participações em empresas de tecnologia de menor porte, estão enfrentando um momento de cautela. Um levantamento divulgado pelo Itaú BBA nesta quarta-feira (16) revelou que o volume de aportes em startups no Brasil e na América Latina teve uma queda significativa no terceiro trimestre de 2024. A retração nos investimentos reflete um cenário global de incertezas econômicas, mas também aponta novas oportunidades, como o crescimento nas fusões e aquisições (M&A).
Desaceleração nos Aportes em Startups
No Brasil, os fundos de venture capital investiram um total de US$ 825 milhões em startups no terceiro trimestre de 2024. Embora o número pareça expressivo, representa uma queda de 31% em relação ao segundo trimestre do mesmo ano e de 54% na comparação anual. Esses números evidenciam uma retração no apetite por investimentos em novas empresas de tecnologia no país, refletindo a cautela do mercado diante das condições macroeconômicas globais, como o aumento das taxas de juros e a incerteza regulatória.
A América Latina como um todo também registrou uma queda significativa nos aportes. O total investido na região foi de US$ 1,46 bilhão, o que representa um recuo de 36% em relação ao trimestre anterior e uma queda de 43% na comparação com o mesmo período de 2023. A redução nos investimentos afeta não apenas o Brasil, mas também outros países da região, que historicamente atraem fundos de VC para empresas emergentes de tecnologia.
Redução no Número de Rodadas de Captação
O levantamento do Itaú BBA também aponta uma queda no número de rodadas de captação de investimentos na América Latina. No terceiro trimestre de 2024, foram registradas 171 rodadas, uma redução de 30% em relação ao segundo trimestre e de 33% quando comparado ao mesmo período de 2023. Essa diminuição reflete o ambiente desafiador enfrentado pelas startups, que têm encontrado mais dificuldade para levantar capital.
No entanto, João Ventura, CEO da Sling Hub, parceira do Itaú no estudo, ressalta que, apesar da queda nos investimentos, o número de fusões e aquisições (M&A) está em alta, especialmente entre as empresas de tecnologia. Na América Latina, foram realizados 57 negócios de M&A no terceiro trimestre, um aumento de 32% em relação ao ano anterior e o melhor resultado registrado em 2024. No Brasil, ocorreram 47 fusões e aquisições, com destaque para a aquisição da Weni pela VTEX, uma transação que mostra o interesse crescente por empresas que desenvolvem soluções baseadas em inteligência artificial (IA).
Fatores que Influenciam a Queda nos Investimentos
Vários fatores contribuíram para a desaceleração dos investimentos de venture capital na América Latina e no Brasil. Um dos principais é o aumento das taxas de juros em economias desenvolvidas, especialmente nos Estados Unidos. A política monetária mais restritiva do Federal Reserve (Fed) encareceu o custo do dinheiro e tornou os investimentos em ativos de risco, como as startups, menos atrativos. Contudo, ao final do terceiro trimestre, o Fed deu início à redução das taxas de juros, o que traz uma expectativa mais otimista para o último trimestre de 2024.
Além disso, a instabilidade econômica global e a incerteza em relação a regulamentações específicas para setores de tecnologia, como a inteligência artificial, também influenciam a retração nos aportes. As startups enfrentam um ambiente mais desafiador para captar recursos, especialmente em áreas de inovação de ponta, como fintechs, IA e energias renováveis.
Modalidades de Investimento: Ações e Dívida
O estudo do Itaú BBA destacou dois tipos de modalidades de investimento em startups: ações (equity) e dívida (debt). Os aportes em ações, que representam a compra de participação societária nas empresas, somaram US$ 680 milhões na América Latina, uma redução de 53% na comparação anual. No Brasil, o volume de aportes em ações caiu ainda mais drasticamente, com uma retração de 60% em 12 meses, totalizando US$ 376 milhões.
Entre as maiores captações via equity no Brasil, destacam-se a Cayena, um marketplace de insumos alimentícios em atacado, que recebeu US$ 55 milhões, e a Rock Encantech, focada no engajamento de clientes na América Latina, com US$ 53,5 milhões captados em setembro.
Em contrapartida, o financiamento por dívida teve um desempenho mais positivo. Na América Latina, foram investidos US$ 461 milhões via debt, um aumento de 20% em relação ao ano anterior, o maior valor registrado desde 2022. No Brasil, um dos destaques foi a Solfácil, empresa focada em energia solar, que captou US$ 134 milhões por meio de recebíveis. Outro exemplo relevante foi a fintech mexicana Stori, que recebeu US$ 107 milhões do Goldman Sachs, enquanto a brasileira Origo, também do setor de energia, captou o mesmo montante do Bradesco BBI.
Foco em Startups de Inteligência Artificial
O estudo do Itaú BBA também analisou o desempenho de startups que utilizam a inteligência artificial (IA) como seu principal negócio ou como uma ferramenta para melhorar suas operações. Em toda a América Latina, foram realizadas 37 rodadas de captação para empresas desse setor no terceiro trimestre de 2024, uma queda de 24% em comparação ao segundo trimestre.
Em termos de volume, os aportes em startups de IA somaram US$ 194 milhões, uma redução significativa de 62% em relação ao ano anterior. Esse recuo reflete a cautela dos investidores diante de um cenário econômico incerto, mas também destaca o crescente interesse em fusões e aquisições nesse segmento, como demonstrado pelo caso da Weni e VTEX no Brasil.
Expectativas para o Futuro
Apesar da retração observada no terceiro trimestre, o início da queda das taxas de juros nos Estados Unidos traz uma perspectiva mais otimista para o último trimestre de 2024. Segundo o relatório do Itaú BBA, a expectativa é que a redução dos custos de financiamento reanime o apetite dos fundos de venture capital, especialmente em setores estratégicos como fintechs, energias renováveis e inteligência artificial.
Além disso, o aumento nas atividades de fusões e aquisições pode indicar uma consolidação no mercado de tecnologia, com empresas maiores adquirindo startups menores para fortalecer suas operações em um cenário de maior competição e restrições de financiamento.
O terceiro trimestre de 2024 foi marcado por uma desaceleração nos aportes de venture capital na América Latina e no Brasil, refletindo um ambiente de maior cautela e incerteza econômica. No entanto, o aumento nas fusões e aquisições, especialmente no setor de tecnologia, pode indicar uma transformação no mercado, com empresas buscando consolidar suas posições.
Com a expectativa de queda nas taxas de juros nos Estados Unidos e um cenário global mais favorável, os investidores de venture capital podem retomar suas atividades com mais vigor no último trimestre do ano, especialmente em setores que oferecem alto potencial de crescimento, como inteligência artificial e energias renováveis.