Assembleia Legislativa aprova privatização da Copasa e muda modelo do saneamento em Minas Gerais
A Assembleia Legislativa de Minas Gerais aprovou, em definitivo, o projeto que autoriza a privatização da Copasa, companhia responsável pelos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário em grande parte do estado. A decisão, tomada na noite desta quarta-feira (17), representa uma das mudanças mais profundas no setor de saneamento mineiro nas últimas décadas e abre caminho para a reestruturação do controle acionário da empresa.
De autoria do governador Romeu Zema (Novo), o Projeto de Lei 4.380/25 foi aprovado em segundo turno por 53 votos favoráveis e 19 contrários, superando com folga o mínimo de 48 votos exigidos para sua validação. Com o aval do Legislativo, o texto segue agora para sanção do Executivo estadual, etapa que formaliza a autorização para que o Estado deixe de ser o controlador da companhia.
O que muda com a privatização da Copasa
A privatização da Copasa não significa a simples venda integral da empresa nem a retirada total do Estado de sua estrutura decisória. O modelo aprovado prevê a transformação da companhia em uma corporation, formato societário no qual não há um acionista controlador único com poder absoluto.
Nesse arranjo, o governo de Minas Gerais mantém uma golden share, uma ação especial que garante poder de veto em decisões estratégicas consideradas sensíveis, como mudanças no objeto social, alienação de ativos essenciais ou alterações que comprometam a prestação dos serviços públicos. Na prática, o Estado abre mão do controle direto, mas preserva instrumentos para proteger interesses públicos considerados estratégicos.
Como foi a votação no plenário
A tramitação do projeto foi marcada por forte tensão política e mobilização social. Desde a manhã, deputados contrários à privatização da Copasa utilizaram todos os mecanismos regimentais disponíveis para tentar retardar ou impedir a votação. Houve apresentação de requerimentos, uso integral do tempo de fala e tentativas de esvaziar o plenário para inviabilizar o quórum necessário.
Apesar das manobras, a base governista conseguiu manter o número de parlamentares suficiente para avançar com a deliberação. O resultado consolidou a maioria favorável ao projeto, refletindo o alinhamento de parte significativa da Assembleia à agenda econômica do governo Zema.
Mobilização dos servidores e reação social
A votação foi acompanhada de perto por milhares de servidores da Copasa, que ocuparam as galerias do plenário, o Espaço Democrático José Aparecida de Oliveira e áreas próximas ao Palácio da Inconfidência. Com faixas, cartazes e palavras de ordem, os trabalhadores manifestaram oposição à privatização da Copasa, alegando riscos à qualidade do serviço, às tarifas e às condições de trabalho.
Para os sindicatos e representantes dos empregados, a mudança no controle da empresa pode priorizar a lógica do lucro em detrimento do caráter social do saneamento, especialmente em municípios menores e regiões menos rentáveis. O governo, por sua vez, sustenta que o novo modelo trará eficiência, capacidade de investimento e aceleração das metas de universalização.
Destinação dos recursos da privatização
Um dos pontos centrais do projeto diz respeito ao destino dos recursos que serão obtidos com a privatização da Copasa. O texto aprovado determina que os valores arrecadados deverão ser usados prioritariamente para amortizar a dívida do Estado de Minas Gerais com a União ou para cumprir obrigações previstas no Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag).
Há também a previsão de que parte desses recursos seja direcionada ao fundo estadual de saneamento básico, instrumento destinado a financiar ações e investimentos no setor. No entanto, durante a tramitação, foi derrubado o dispositivo que obrigava o envio de um novo projeto de lei à Assembleia, em até 180 dias, para estruturar formalmente esse fundo. Assim, permanece a obrigação de destinação, mas sem um prazo definido para regulamentação.
Metas de universalização e obrigações do comprador
O texto aprovado estabelece salvaguardas importantes relacionadas à prestação do serviço. O eventual comprador da Copasa será obrigado a cumprir as metas de universalização do abastecimento de água e do esgotamento sanitário previstas no Marco Legal do Saneamento.
Essas metas incluem não apenas áreas urbanas consolidadas, mas também regiões rurais e núcleos urbanos informais já estabelecidos. A exigência busca garantir que a privatização da Copasa não resulte em exclusão de localidades menos lucrativas, um dos principais temores levantados por críticos da proposta.
O contexto do Marco Legal do Saneamento
A aprovação da privatização da Copasa ocorre em um cenário nacional de profundas transformações no setor de saneamento. O Marco Legal do Saneamento, aprovado em 2020, estabeleceu novas regras para concessões, metas obrigatórias de universalização e maior participação da iniciativa privada.
Segundo o governo estadual, o modelo atual da Copasa limita a capacidade de investimento necessária para cumprir essas metas dentro dos prazos estabelecidos. A abertura do capital e a perda do controle estatal direto seriam, nesse argumento, instrumentos para atrair recursos, modernizar a gestão e acelerar a expansão da infraestrutura.
Argumentos do governo de Minas Gerais
O governador Romeu Zema e seus aliados defendem que a privatização da Copasa segue uma lógica de responsabilidade fiscal e eficiência administrativa. Para o Executivo, a mudança permitirá reduzir o endividamento do Estado, liberar recursos para áreas prioritárias e criar um ambiente mais favorável ao investimento no saneamento.
Outro argumento recorrente é o de que o modelo de corporation, aliado à golden share, preserva a capacidade do Estado de intervir em decisões estratégicas sem assumir os custos e riscos da gestão direta da companhia.
Críticas e preocupações levantadas pela oposição
Deputados contrários à privatização da Copasa afirmam que a medida representa a perda de um patrimônio estratégico do Estado e pode resultar em aumento de tarifas no médio e longo prazo. Eles argumentam que o saneamento é um serviço essencial e que a lógica de mercado pode não atender adequadamente populações de baixa renda ou regiões menos atrativas do ponto de vista econômico.
Há também críticas quanto à retirada do prazo para criação formal do fundo estadual de saneamento, o que, segundo opositores, reduz a transparência sobre a aplicação dos recursos obtidos com a venda da participação estatal.
Impactos esperados para o saneamento em Minas
A privatização da Copasa tem potencial para redesenhar o setor de saneamento em Minas Gerais. Caso a operação seja bem-sucedida, o Estado poderá acelerar investimentos em redes de água e esgoto, reduzir passivos financeiros e cumprir metas regulatórias mais ambiciosas.
Por outro lado, o sucesso do modelo dependerá da capacidade de regulação da agência competente, do cumprimento rigoroso das cláusulas contratuais e da manutenção de mecanismos de controle social. A golden share será um dos principais instrumentos para equilibrar interesses públicos e privados nesse novo arranjo.
Próximos passos após a aprovação
Com a aprovação legislativa, o projeto aguarda a sanção do governador. Em seguida, deverão ser definidos os detalhes operacionais da privatização da Copasa, como a modelagem da oferta, a estruturação da operação no mercado de capitais e as condições para entrada de novos investidores.
O processo tende a ser acompanhado de perto por servidores, usuários do serviço, investidores e órgãos de controle. A experiência mineira poderá servir de referência para outros estados que avaliam mudanças semelhantes em suas companhias de saneamento.
Um marco na política econômica de Minas Gerais
A aprovação da privatização da Copasa consolida uma das principais bandeiras da política econômica do governo Romeu Zema e reforça a tendência de reconfiguração do papel do Estado em setores considerados estratégicos. O debate, no entanto, está longe de se encerrar.
À medida que o processo avançar, a sociedade mineira seguirá acompanhando seus efeitos práticos sobre tarifas, qualidade do serviço e universalização do saneamento, temas que impactam diretamente a saúde pública, o desenvolvimento econômico e a qualidade de vida da população.






