Programa Nacional de Alimentação Escolar: referência mundial completa 70 anos e projeta novos avanços
O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) completou sete décadas de existência em 2025 e segue sendo reconhecido como um dos maiores exemplos de política pública voltada à segurança alimentar e nutricional no mundo. A iniciativa brasileira, que hoje atende cerca de 40 milhões de estudantes diariamente, da creche ao EJA (Educação de Jovens e Adultos), é apontada pela Organização das Nações Unidas (ONU) como modelo de integração entre saúde, educação e agricultura familiar.
Mesmo diante de elogios internacionais, o Programa Nacional de Alimentação Escolar enfrenta desafios de orçamento, infraestrutura e gestão local. No entanto, sua trajetória demonstra a força de uma política que vai além do prato servido: forma hábitos alimentares saudáveis, movimenta a economia e fortalece a agricultura familiar.
PNAE: de “merenda escolar” a refeição completa
Criado oficialmente em 1955, o Programa Nacional de Alimentação Escolar foi durante muito tempo associado à ideia de “merenda escolar”, entendida como um lanche simples e pouco nutritivo. Essa percepção começou a mudar em 2009, com a sanção da lei que estabeleceu parâmetros claros para o cardápio das escolas brasileiras.
Com a nova legislação, ultraprocessados foram restringidos a no máximo 15% da alimentação, e refeições completas, equilibradas e conectadas à cultura alimentar local passaram a ser exigência. Outra mudança importante foi a presença obrigatória de nutricionistas responsáveis pelo planejamento dos cardápios, garantindo refeições adequadas às necessidades de todos os estudantes, inclusive os que possuem restrições alimentares.
Essa transformação consolidou o PNAE como política de promoção da saúde e não apenas como suporte alimentar.
Agricultura familiar: motor econômico do PNAE
Um dos pilares do Programa Nacional de Alimentação Escolar é a exigência de compra mínima de 30% dos alimentos diretamente da agricultura familiar. Essa determinação não apenas aproxima o campo da escola, como também garante renda e inclusão produtiva para milhares de agricultores em todo o país.
No Ceará, por exemplo, a agricultora Marli Oliveira destina 30% de sua produção de mel, ovos e carnes ao PNAE, garantindo renda estável para sua família e para outros pequenos produtores da região. Segundo levantamento do Observatório da Alimentação Escolar (OAE), cada R$ 1 investido pelo programa gera impacto positivo de R$ 1,52 no PIB agrícola e de R$ 1,66 no PIB da pecuária.
A partir de 2026, a meta é que ao menos 45% dos alimentos adquiridos pelo programa venham da agricultura familiar. A mudança, já aprovada pelo Congresso Nacional, promete ampliar ainda mais o impacto econômico e social da política pública.
A experiência dos cozinheiros e nutricionistas
A aplicação do Programa Nacional de Alimentação Escolar também depende do trabalho cotidiano de cozinheiros e nutricionistas. Em Fortaleza (CE), Fernando Luiz Venâncio, ex-metalúrgico que encontrou na cozinha sua nova vocação, lidera a equipe responsável por servir três refeições diárias a mais de 400 estudantes de uma escola de tempo integral.
Pratos típicos como baião de dois, farofa de ovo e o tradicional creme de galinha mostram como o cardápio do PNAE valoriza a cultura regional sem abrir mão da qualidade nutricional.
Para Fernando, a presença da nutricionista é fundamental. É ela quem define os alimentos que devem compor as refeições, sempre considerando equilíbrio nutricional e acessibilidade para todos os alunos. Esse alinhamento entre técnica e execução é um dos segredos para o sucesso do programa.
Reconhecimento internacional e cooperação entre países
O Programa Nacional de Alimentação Escolar ultrapassou fronteiras e se tornou referência para outras nações. Durante a 2ª Cúpula da Coalizão Global pela Alimentação Escolar, realizada em setembro de 2025 no Brasil, representantes de mais de 90 países se comprometeram a garantir refeições de qualidade a 700 milhões de estudantes até 2030.
Países africanos, como São Tomé e Príncipe, já utilizam a experiência brasileira como base para suas próprias políticas. Nutricionistas brasileiras contribuíram com a formação profissional local, ajudando a consolidar programas de alimentação escolar adaptados às culturas e realidades regionais.
Essa exportação de conhecimento reforça a posição do PNAE como modelo global.
Desafios financeiros e estruturais
Apesar dos avanços, o Programa Nacional de Alimentação Escolar convive com limitações orçamentárias. em 2025, o orçamento do programa foi de R$ 5,5 bilhões, com repasses diários que variaram de R$ 0,41 por estudante no EJA a R$ 1,37 para crianças em creches e alunos do ensino integral. Antes disso, os valores ficaram congelados por cinco anos, o que comprometeu a qualidade e a quantidade dos alimentos oferecidos.
Além do repasse federal, estados e municípios têm a obrigação de complementar os recursos, mas muitas vezes isso não ocorre. Levantamentos apontam que mais de 30% dos municípios do Norte e Nordeste não fazem esse aporte adicional, agravando os problemas locais.
Outro desafio está na infraestrutura: 47% dos nutricionistas consultados pelo OAE afirmaram não conseguir cumprir todas as exigências do programa devido à falta de cozinhas adequadas, mão de obra especializada e resistência cultural em algumas comunidades escolares.
Alimentação escolar como política pedagógica
Especialistas defendem que o Programa Nacional de Alimentação Escolar não deve ser visto apenas como política assistencialista. Segundo a Associação Brasileira de Nutrição, o PNAE é também um programa pedagógico, pois contribui para a formação de hábitos alimentares saudáveis e melhora o desempenho escolar.
A Constituição Federal garante a alimentação escolar como direito, algo que coloca o Brasil em posição de destaque em relação a outros países. No entanto, ainda há muito a avançar para que todos os estudantes tenham acesso a refeições equilibradas e de qualidade.
O impacto social e futuro do PNAE
O Programa Nacional de Alimentação Escolar é responsável por assegurar a principal refeição do dia para milhões de crianças e jovens em situação de vulnerabilidade. Esse aspecto foi crucial para que o Brasil deixasse o Mapa da Fome da ONU em anos anteriores, embora o tema da segurança alimentar ainda seja um desafio no país.
O futuro aponta para a necessidade de ampliar recursos, fortalecer parcerias com agricultores familiares e investir em infraestrutura escolar. A meta de 45% de alimentos da agricultura familiar representa não apenas avanço econômico, mas também oportunidade de garantir cardápios mais frescos, regionais e saudáveis.
O Programa Nacional de Alimentação Escolar é uma das políticas públicas mais bem-sucedidas do Brasil, unindo educação, saúde, agricultura e desenvolvimento social. Com reconhecimento internacional, impacto econômico comprovado e papel essencial na segurança alimentar, o PNAE segue como um dos pilares para a formação das próximas gerações.
Apesar das dificuldades, a continuidade e ampliação desse programa são fundamentais para que o país avance na luta contra a fome e na construção de uma sociedade mais justa e saudável.






