Netflix culpa Brasil por resultado abaixo do esperado no 3º trimestre de 2025
A Netflix (NFLX34) surpreendeu o mercado ao atribuir ao Brasil a principal causa para o resultado abaixo do esperado no terceiro trimestre de 2025, em meio a uma disputa tributária bilionária. O impacto financeiro da despesa não recorrente reduziu o lucro líquido da empresa para US$ 2,5 bilhões, frustrando as projeções de Wall Street, que estimavam US$ 3 bilhões no mesmo período.
O episódio evidencia como a complexidade do sistema tributário brasileiro continua sendo um desafio relevante para multinacionais de tecnologia e entretenimento, mesmo para empresas do porte da Netflix, que já superam 300 milhões de assinantes no mundo.
Apesar do contratempo, a companhia sinalizou otimismo com o fechamento do ano, projetando resultados levemente acima das expectativas para o quarto trimestre — impulsionados por grandes lançamentos e pela diversificação de receitas com transmissões ao vivo.
Lucro abaixo das projeções e impacto da disputa tributária
Entre julho e setembro de 2025, a Netflix registrou lucro líquido de US$ 2,5 bilhões, ou US$ 5,87 por ação, abaixo dos US$ 6,97 esperados por analistas da LSEG. A receita, contudo, ficou em linha com as previsões, atingindo US$ 11,5 bilhões no trimestre.
A principal causa da diferença de desempenho foi uma despesa tributária extraordinária no Brasil, estimada em US$ 619 milhões. Segundo a empresa, o valor está relacionado a uma disputa fiscal com autoridades brasileiras, cujo desfecho ainda está em negociação.
Sem essa despesa, a margem operacional da Netflix teria superado 31,5%, superando inclusive a meta projetada pela própria companhia. No entanto, o resultado consolidado apontou margem de 28%, refletindo o peso do ajuste contábil.
Em comunicado aos investidores, a empresa afirmou que não espera impacto material dessa questão em resultados futuros, indicando que o caso seria pontual e sem reflexos de longo prazo. Mesmo assim, o mercado reagiu com cautela, diante do histórico de complexidade tributária no Brasil, especialmente no setor digital.
Mercado brasileiro: relevância e riscos crescentes
O Brasil é um dos principais mercados da Netflix fora dos Estados Unidos, representando um dos maiores polos de receita publicitária e de consumo de streaming na América Latina. Estima-se que o país concentre cerca de 15 milhões de assinaturas ativas, com forte presença nos segmentos de plano padrão com anúncios e assinaturas familiares.
Desde 2023, a Netflix tem enfrentado maior escrutínio fiscal e regulatório no Brasil, com discussões envolvendo tributação de serviços digitais, cobrança de ISS e recolhimento de impostos sobre publicidade online.
O impacto de US$ 619 milhões é um dos mais expressivos já registrados por uma multinacional de tecnologia no país em um único trimestre. A situação reforça o alerta de outras big techs, como Amazon, Meta e Google, que também enfrentam autuações e disputas semelhantes com o Fisco brasileiro.
Economistas avaliam que o episódio pode reabrir o debate sobre a reforma tributária digital, já aprovada em parte pelo Congresso Nacional, mas ainda sem regulamentação específica para plataformas de streaming. Para analistas do setor, a falta de clareza nas regras gera insegurança jurídica e pressão sobre o resultado financeiro das companhias.
Animações, séries e transmissões ao vivo sustentam audiência global
Mesmo com o resultado impactado pela questão tributária, a Netflix manteve forte desempenho de audiência global. O principal destaque do trimestre foi a animação “K-Pop Demon Hunters”, que se tornou o filme mais assistido da história da plataforma, ultrapassando recordes anteriores em menos de 60 dias.
A empresa também prepara um encerramento grandioso para 2025, com o lançamento da última temporada de “Stranger Things”, previsto para novembro e dezembro, além da transmissão inédita de dois jogos da NFL ao vivo no Natal — um movimento estratégico que reforça a aposta da empresa em conteúdo ao vivo e eventos esportivos como nova frente de crescimento.
Executivos da companhia destacam que a Netflix encerra o ano com forte ímpeto, apostando em uma lista de lançamentos robusta e em novos formatos de monetização. A meta é sustentar o ritmo de crescimento de receita, mesmo após a decisão de encerrar a divulgação do número de assinantes, adotada no início do ano.
Perspectivas para o quarto trimestre: moderação e recuperação
Para o quarto trimestre de 2025, a Netflix projetou receita de US$ 11,96 bilhões, ligeiramente acima da previsão média de US$ 11,90 bilhões de Wall Street. O lucro por ação projetado é de US$ 5,45, apenas um centavo acima das expectativas do mercado.
A empresa busca consolidar margens mais elevadas após um ano marcado por oscilações cambiais, investimentos em produções originais e custos tributários inesperados. O foco, segundo o balanço, está na otimização de despesas e na diversificação de receitas com publicidade e parcerias globais.
O modelo com anúncios, lançado oficialmente em 2023, já representa mais de 10% das novas assinaturas em mercados estratégicos, como América Latina, Europa e Ásia. No Brasil, o plano com anúncios tem crescimento acelerado entre consumidores de renda média, e deve se tornar a principal categoria de entrada em 2026.
Setor de streaming sob pressão regulatória
O caso da Netflix no Brasil reacende discussões sobre o modelo tributário aplicado a plataformas digitais estrangeiras. Com a expansão do streaming e a crescente integração de publicidade e conteúdo, o governo brasileiro passou a avaliar novas diretrizes de arrecadação, que incluem o Imposto sobre Serviços (ISS) e contribuições específicas para produção nacional de audiovisual.
A Agência Nacional do Cinema (Ancine) e o Ministério da Fazenda estudam desde 2024 mecanismos de fiscalização e taxação proporcional à receita gerada no país, o que deve impactar empresas como Netflix, Disney+, Amazon Prime Video e Max.
No caso da Netflix, o peso dessa carga tributária já se reflete no balanço global da empresa. Especialistas em tributação internacional ressaltam que, embora o montante de US$ 619 milhões tenha sido classificado como despesa não recorrente, a tendência é que os custos regulatórios aumentem nos próximos trimestres.
Reação dos investidores e análise de mercado
O resultado abaixo das projeções levou a pequena retração nas ações da Netflix (NFLX34) negociadas na Nasdaq e na B3, com recuo de cerca de 1,8% no pós-market. Analistas avaliam que, embora o desempenho operacional continue sólido, o risco fiscal em mercados emergentes — especialmente no Brasil — representa uma ameaça recorrente à previsibilidade dos lucros.
A LSEG, instituição responsável pelas projeções, destacou que o lucro operacional de US$ 2,5 bilhões ainda mantém a Netflix em uma posição financeira confortável, com reserva de caixa superior a US$ 14 bilhões. Contudo, a exposição da empresa a países com sistemas tributários complexos pode pressionar margens e impactar a confiança de investidores de longo prazo.
Brasil: obstáculo e oportunidade para o setor de streaming
Apesar do revés, a Netflix não pretende reduzir sua presença no país. O Brasil segue entre os cinco maiores mercados globais da plataforma, tanto em audiência quanto em faturamento. A empresa mantém centros de produção audiovisual em São Paulo e no Rio de Janeiro, além de investir em parcerias com produtoras locais.
A estratégia da companhia é fortalecer a produção de conteúdo nacional — especialmente novelas, séries e documentários — que tenham potencial de exportação. Títulos brasileiros, como Sintonia e Cidade Invisível, seguem entre os mais assistidos da América Latina.
Analistas do setor acreditam que a tensão fiscal com o governo brasileiro é temporária e que a companhia deve buscar um acordo administrativo para encerrar a disputa ainda em 2026. Para eles, a relevância do mercado brasileiro no portfólio global da Netflix impede qualquer retração mais profunda das operações.
Desafios e caminhos para 2026
O caso reforça a necessidade de planejamento tributário mais sofisticado para empresas globais que operam no Brasil. A Netflix já sinalizou que pretende ajustar sua estrutura fiscal regional, a fim de reduzir a exposição a litígios e fortalecer o compliance.
Com o crescimento da base de assinantes globais e o avanço do modelo híbrido de monetização (assinaturas + publicidade), a empresa tenta equilibrar expansão e sustentabilidade financeira.
Em um cenário global competitivo — marcado pela ascensão de concorrentes como Disney+, Max, Amazon Prime e Apple TV+ — a Netflix aposta em inovação tecnológica, novos formatos interativos e conteúdos licenciados premium para manter a liderança.
A revisão contábil no Brasil é, portanto, um revés pontual dentro de um ciclo de expansão controlada, mas expõe a importância estratégica do país na performance global da companhia.
O impacto da disputa tributária da Netflix com o Brasil mostra como questões fiscais locais podem repercutir globalmente e afetar os resultados de gigantes do entretenimento. Ainda que o ajuste tenha sido pontual, o episódio reforça o alerta sobre o ambiente tributário brasileiro e sua influência nos balanços de multinacionais.
Com o quarto trimestre em andamento, a empresa mantém previsão de lucro em alta, confiando em lançamentos estratégicos e na retomada da margem operacional. No entanto, o mercado segue atento à evolução do caso no Brasil, que poderá servir de referência para futuras decisões de investimento no país.






