COE no mercado financeiro: entenda o debate sobre conflitos de interesse e modelo de comissões
Nos últimos meses, o COE no mercado financeiro (Certificado de Operações Estruturadas) voltou ao centro de um intenso debate entre investidores, especialistas e reguladores. O motivo? Casos como o da Ambipar, que reacenderam discussões sobre a transparência, os riscos e o conflito de interesses por trás da venda desse tipo de produto ao público de varejo.
O COE no mercado financeiro é frequentemente apresentado como um investimento inovador, capaz de unir proteção e rentabilidade. No entanto, sua estrutura complexa e o modo como é comercializado levantam questionamentos sobre se ele é realmente adequado para todos os perfis de investidor — especialmente os menos experientes.
O que é o COE no mercado financeiro?
O Certificado de Operações Estruturadas, conhecido pela sigla COE, é um produto financeiro que combina elementos de renda fixa e renda variável. Ele pode estar atrelado a diversos ativos: ações, moedas, commodities ou índices internacionais.
A promessa do COE no mercado financeiro é permitir que o investidor tenha acesso a estratégias sofisticadas, com possibilidade de ganhos acima da média da renda fixa tradicional — mas sem precisar investir diretamente em mercados complexos.
Entretanto, essa combinação de possibilidades vem acompanhada de riscos consideráveis, como a baixa liquidez e a possibilidade de perda total do capital investido, dependendo da estrutura do produto.
O caso Ambipar e a crise de confiança nos COEs
O estopim da nova onda de críticas ao COE no mercado financeiro veio com o episódio envolvendo a Ambipar, grupo empresarial que entrou em recuperação judicial em 2024. Grandes instituições financeiras como XP e BTG Pactual decidiram encerrar antecipadamente operações de COEs ligados à empresa, devolvendo valores muito abaixo do investimento original.
Enquanto a XP devolveu apenas cerca de 6,88% do valor investido, o BTG marcou os papéis a mercado, o que resultou em perdas praticamente totais para muitos clientes.
Esse caso provocou indignação entre investidores e reacendeu o debate sobre a venda inadequada de produtos complexos para pessoas físicas que, muitas vezes, não compreendem plenamente os riscos envolvidos.
Por que o COE no mercado financeiro é tão polêmico?
O problema central não é necessariamente o produto em si, mas o modo como ele é oferecido e remunerado dentro das instituições financeiras.
O COE no mercado financeiro paga altas comissões a quem o vende — em alguns casos, entre 5% e 10% do valor aplicado, pagos logo na contratação. Isso cria um conflito de interesses evidente: o assessor tem incentivo para oferecer COEs em vez de alternativas mais simples e seguras, pois sua remuneração é diretamente proporcional à venda.
Essa prática leva muitos investidores a acreditarem que estão aplicando em um produto de renda fixa de baixo risco, quando, na realidade, estão expostos a possíveis perdas integrais.
Além disso, muitos não leem os documentos técnicos que explicam que o COE não tem cobertura do Fundo Garantidor de Créditos (FGC) e depende do risco de crédito do emissor.
O conflito de interesses e o modelo de comissões
O modelo de comissões vigente em grande parte das corretoras e plataformas de investimento é apontado como o principal problema.
Nesse sistema, os assessores são remunerados com base nos produtos que vendem, o que os incentiva a priorizar aqueles que pagam mais — como o COE no mercado financeiro. A lógica é simples: quanto maior a comissão, maior o foco de venda.
Esse cenário cria um desalinhamento entre o interesse do cliente e o do assessor. O investidor acredita estar recebendo uma recomendação neutra, mas, na prática, o profissional pode estar sugerindo um produto com retorno pessoal mais vantajoso.
Instituições e especialistas destacam que esse modelo fragiliza a confiança na indústria de investimentos e distorce a função do assessor, que deveria atuar como um consultor imparcial e não como um vendedor de produtos financeiros.
Por que o COE continua atraente para as instituições
Mesmo diante das polêmicas, o COE no mercado financeiro ainda é um produto bastante atrativo para bancos e corretoras.
Isso ocorre porque o COE mantém o capital aplicado por um longo período, o que dá previsibilidade de caixa às instituições. Esse dinheiro, enquanto permanece na tesouraria, pode ser usado em outras operações financeiras, gerando lucro adicional antes de ser devolvido ao investidor.
Ou seja, o COE representa uma vantagem operacional e financeira para a instituição emissora, reforçando o incentivo de distribuí-lo amplamente — mesmo em situações onde ele não se encaixa no perfil do cliente.
O papel do regulador e a importância do suitability
Diante dos recentes episódios, o debate regulatório sobre o COE no mercado financeiro ganhou força. O Instituto Empresa e outras entidades que defendem os pequenos investidores alertam para a necessidade de reforçar a análise de suitability — o processo que verifica se o produto é adequado ao perfil do investidor.
Muitos dos prejuízos registrados poderiam ter sido evitados se os clientes tivessem recebido informações claras sobre riscos, prazos e possibilidades de perda total. Para as entidades, é fundamental que o regulador exija maior transparência e fiscalização sobre a forma como os COEs são oferecidos no varejo.
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) vem ampliando o debate sobre modelos de remuneração mais transparentes, incluindo as recentes normas da Resolução CVM 179, que busca expor custos e comissões de forma mais clara ao investidor final.
Alternativas ao modelo de comissão: o fee-fixo
Em contrapartida, algumas instituições vêm adotando o modelo de fee-fixo, também conhecido como fee-based.
Nesse formato, o investidor paga uma taxa mensal fixa para ser assessorado, e o profissional não recebe comissão pela venda de produtos. Isso reduz o conflito de interesses e estimula um atendimento mais alinhado ao perfil e aos objetivos do cliente.
O fee-fixo é comum em países como Estados Unidos e Reino Unido, onde o mercado financeiro é mais maduro e a transparência é obrigatória. No Brasil, esse modelo vem ganhando espaço à medida que cresce a desconfiança sobre práticas tradicionais de comissionamento.
O futuro do COE no mercado financeiro
Apesar das críticas, o COE no mercado financeiro não deve desaparecer. Ele continua sendo uma ferramenta útil para investidores qualificados que compreendem seus riscos e sabem utilizá-lo como parte de uma estratégia de diversificação.
Contudo, o episódio da Ambipar serviu como um alerta para o mercado: produtos complexos não devem ser tratados como aplicações convencionais.
O futuro do COE dependerá da capacidade das instituições de tornarem o produto mais transparente, mais bem explicado e corretamente direcionado. Também dependerá de mudanças estruturais no modo como assessores são remunerados e supervisionados.
Educação financeira e responsabilidade do investidor
Especialistas lembram que o investidor também tem papel ativo nesse processo. É essencial compreender que o COE no mercado financeiro não é sinônimo de segurança e que todo investimento precisa ser avaliado de acordo com seus riscos e objetivos pessoais.
Buscar conhecimento, ler documentos técnicos e questionar o assessor são atitudes fundamentais para evitar decisões precipitadas. A educação financeira é, portanto, uma ferramenta de proteção e empoderamento, especialmente em um cenário de produtos cada vez mais sofisticados.
O debate sobre o COE no mercado financeiro expõe uma realidade: o mercado de investimentos brasileiro ainda precisa evoluir em transparência, ética e alinhamento entre cliente e assessor.
Os casos de perdas expressivas mostram que, enquanto o modelo de comissões continuar incentivando práticas de venda agressiva, situações como a da Ambipar tendem a se repetir.
O caminho para um mercado mais equilibrado passa por educação financeira, regulação firme e novos modelos de remuneração que coloquem o interesse do investidor em primeiro lugar.






