CPMI do INSS: relator denuncia blindagem de investigados que receberam R$ 10 milhões em propinas
O relator da CPMI do INSS, deputado Alfredo Gaspar (União-AL), afirmou nesta segunda-feira (10) que a comissão parlamentar de inquérito responsável por investigar fraudes no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) tem blindado investigados que receberam cerca de R$ 10 milhões em propinas. A declaração, feita durante sessão no Congresso Nacional, reacende o debate sobre transparência e responsabilidade nas apurações que envolvem esquemas de corrupção dentro de programas sociais e previdenciários.
Segundo o relator, há resistência dentro da própria CPMI para autorizar convocações e quebras de sigilo de pessoas investigadas, o que estaria comprometendo o andamento das investigações e favorecendo a impunidade. Gaspar citou nominalmente Paulo Boudens, ex-chefe de gabinete do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP); a publicitária Daniela Fonteles, a empresária Roberta Luchsinger e o ex-assessor parlamentar Gustavo Gaspar — todos ligados, de acordo com o parlamentar, a operações suspeitas envolvendo o esquema conhecido como “Careca do INSS”.
Blindagem e falta de transparência dentro da CPMI
Durante a sessão, Alfredo Gaspar criticou duramente o que chamou de “blindagem institucional” dentro da própria comissão. O deputado afirmou que a CPMI do INSS, que deveria atuar de forma independente e técnica, estaria protegendo investigados com fortes indícios de envolvimento em irregularidades financeiras.
O relator também atacou o sigilo imposto a informações sobre visitas de investigados ao Senado Federal, classificando a medida como uma “vergonha da República”. O caso envolve Antônio Carlos Camilo Antunes, o “Careca do INSS”, apontado como um dos principais articuladores do suposto esquema de propinas.
Segundo o parlamentar, o Senado decretou sigilo de 100 anos sobre dados relacionados às visitas de “Careca” a gabinetes parlamentares, o que impossibilita a divulgação de registros oficiais. Para Gaspar, essa medida impede a sociedade de conhecer a extensão das relações políticas entre os investigados e integrantes do Congresso.
STF e a “caixa-preta” das investigações
Alfredo Gaspar também direcionou críticas ao Supremo Tribunal Federal (STF), mencionando que há um mandado de segurança tramitando na Corte que pede a divulgação das visitas do “Careca do INSS” ao Senado. O relator fez um apelo público para que o Supremo “abra a caixa-preta dessas informações”, defendendo que a transparência é fundamental para restabelecer a confiança da população nas instituições.
Segundo ele, embora o STF não seja o principal responsável pela blindagem, a falta de altivez e independência do próprio Congresso Nacional tem contribuído para a manutenção de um sistema que protege investigados influentes.
R$ 1,4 bilhão em desvios: o esquema sob investigação
A CPMI do INSS foi instaurada para investigar fraudes em descontos de associações e entidades em aposentadorias e pensões. Segundo o relator, o esquema pode ter movimentado mais de R$ 1,4 bilhão entre 2022 e 2025, envolvendo dezenas de entidades e empresas ligadas a dirigentes e políticos.
Um dos depoentes mais aguardados, Igor Dias Delecrode, presidente da Associação de Amparo Social do Aposentado e Pensionista (AASAP), compareceu à sessão, mas optou por permanecer em silêncio, amparado por habeas corpus concedido pelo ministro André Mendonça, do STF.
Mesmo sem responder às perguntas, Delecrode foi citado por Gaspar como peça central na operação financeira das fraudes, responsável por desenvolver e operacionalizar um sistema de coleta e validação de dados de beneficiários. De acordo com o relator, a AASAP teria recebido R$ 63,2 milhões em repasses diretos dentro do esquema, sendo descrita como o “coração tecnológico da safadeza”.
Como funcionava o esquema do “Careca do INSS”
As investigações indicam que o grupo liderado por Antônio Carlos Camilo Antunes, o “Careca do INSS”, utilizava associações e ONGs de fachada para descontar valores indevidos dos benefícios de aposentados e pensionistas.
Essas entidades firmavam convênios fraudulentos com o INSS e, por meio de intermediação de servidores e lobistas, realizavam descontos automáticos nas folhas de pagamento de aposentados, sob o pretexto de cobrança de mensalidades associativas.
Entre 2022 e 2025, quatro dessas entidades teriam faturado R$ 714 milhões, enquanto o total desviado do sistema previdenciário pode ter ultrapassado R$ 1,4 bilhão.
O “Careca do INSS” já é investigado em outras frentes por corrupção ativa, lavagem de dinheiro e associação criminosa, e teria mantido relações políticas próximas de parlamentares e assessores no Senado Federal.
Reação política e críticas ao sigilo
As declarações do relator provocaram forte reação entre os membros da CPMI. Parte dos parlamentares defendeu a necessidade de cautela para não politizar as investigações, enquanto outros reforçaram o pedido por transparência total nos documentos e depoimentos.
Setores do Congresso avaliam que o sigilo de 100 anos imposto pelo Senado sobre informações envolvendo o caso pode configurar obstrução de investigação parlamentar, especialmente considerando que os dados se referem a visitas a gabinetes públicos.
Especialistas em direito administrativo também destacam que o princípio da publicidade dos atos públicos deve prevalecer em casos que envolvem recursos da União e políticas sociais, como a previdência.
Os personagens centrais da CPMI do INSS
1. Alfredo Gaspar (União-AL)
Relator da CPMI e ex-procurador de Justiça, tem conduzido as investigações com foco no combate à corrupção e no rastreamento de fluxos financeiros suspeitos dentro do INSS. É uma das vozes mais firmes contra a blindagem de depoentes.
2. Antônio Carlos Camilo Antunes – “Careca do INSS”
Apontado como o mentor do esquema, é acusado de chefiar uma rede de entidades fraudulentas que desviaram valores bilionários de aposentadorias.
3. Igor Dias Delecrode
Dirigente da AASAP, é descrito pelo relator como o “operador técnico” das fraudes, responsável pelo sistema de controle e verificação de dados de beneficiários.
4. Paulo Boudens, Daniela Fonteles, Roberta Luchsinger e Gustavo Gaspar
Investigados por envolvimento indireto com o grupo, supostamente beneficiados com repasses e contratos suspeitos. Segundo o relator, receberam R$ 10 milhões em propinas.
Desdobramentos e próximos passos da CPMI
Após o episódio desta segunda-feira, a CPMI do INSS deve votar novos requerimentos de convocação e quebra de sigilos bancários e fiscais de empresas e indivíduos ligados ao esquema.
O relator também pretende solicitar à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal o compartilhamento de informações que envolvem as transações suspeitas e as conexões políticas do grupo.
Há expectativa de que o Relatório Final da CPMI, previsto para dezembro de 2025, traga indiciamentos formais, além de propostas legislativas para aprimorar o controle de convênios com entidades de aposentados e pensionistas.
Impactos políticos e institucionais
A escalada das denúncias na CPMI do INSS tem potencial de atingir figuras influentes do Congresso, em especial senadores e ex-assessores que mantiveram contato direto com os investigados.
A pressão popular por transparência e punição dos envolvidos deve crescer nas próximas semanas, especialmente diante das novas revelações sobre propinas milionárias e desvio de recursos públicos.
Analistas políticos avaliam que o caso pode se transformar em um dos maiores escândalos administrativos da atual legislatura, com efeitos sobre a imagem do Senado e da base governista.
A CPMI do INSS e o desafio da transparência pública
O embate travado dentro da CPMI do INSS expõe as tensões entre o combate à corrupção e os interesses políticos que orbitam o caso. As denúncias de blindagem, sigilo indevido e propinas milionárias colocam em xeque a credibilidade das instituições envolvidas e reforçam a necessidade de reformas que garantam transparência plena na administração pública.
Enquanto o relator Alfredo Gaspar promete endurecer o tom e avançar nas investigações, a sociedade aguarda respostas concretas sobre quem se beneficiou dos desvios bilionários no INSS — e se a CPMI cumprirá, de fato, o papel de investigar e punir os responsáveis.






