Oriente Médio avança em investimentos bilionários em terras raras e desafia domínio global da China
O interesse do Oriente Médio em terras raras cresce em ritmo acelerado e começa a remodelar o mapa global da mineração. Impulsionados pela busca por autonomia econômica e pelo avanço das tecnologias verdes e da inteligência artificial (IA), países como Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos ampliam seus investimentos em minerais críticos e desafiam o domínio chinês nesse mercado estratégico.
A corrida por terras raras — um grupo de 17 elementos essenciais para a fabricação de motores elétricos, turbinas eólicas, chips e equipamentos de defesa — tornou-se prioridade para governos e investidores. Na conferência Future Investment Initiative (FII), conhecida como “Davos no Deserto”, realizada em Riade, líderes empresariais destacaram a necessidade de transformar o Oriente Médio em um novo polo global de energia e tecnologia sustentável.
O impulso estratégico das terras raras
Executivos do setor de mineração relatam que o interesse do Oriente Médio por minerais críticos é “fenomenal”. Mesmo sem grandes reservas naturais, os países do Golfo investem fortemente no desenvolvimento da cadeia de processamento e na criação de parcerias estratégicas com empresas internacionais.
A Critical Metals, mineradora listada nos Estados Unidos, anunciou parceria com o Obeikan Group, da Arábia Saudita, para construir uma planta de hidróxido de lítio, um dos insumos mais cobiçados na produção de baterias elétricas. O projeto reforça a meta saudita de diversificar sua economia além do petróleo, estabelecendo-se como um hub industrial para a transição energética.
Especialistas apontam que o movimento reflete uma visão de longo prazo. O aumento exponencial na demanda por metais usados na IA, robótica e veículos elétricos está elevando o valor estratégico das terras raras. Cada robô, veículo elétrico ou turbina moderna depende desses elementos, o que torna o controle da cadeia produtiva uma questão de soberania tecnológica e econômica.
Arábia Saudita e Emirados Árabes: a nova fronteira da mineração
Com reservas ainda limitadas, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos optam por uma estratégia de integração global. Em vez de depender da extração local, os dois países buscam firmar acordos de cooperação, aquisições internacionais e joint ventures com mineradoras ocidentais e asiáticas.
O Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS) aponta que os países do Golfo tentam se posicionar como parceiros alternativos para o Ocidente, oferecendo estabilidade política, infraestrutura moderna e grande capacidade de investimento. Essa aproximação é vista como um contrapeso ao domínio chinês na cadeia global de suprimentos de minerais críticos.
Apesar do avanço, especialistas alertam que a produção regional ainda está em fase inicial. A Arábia Saudita depende fortemente de know-how estrangeiro e de empresas com tecnologia de extração e processamento. Mesmo assim, a região se consolida como um centro de financiamento e refino, o que pode alterar significativamente o equilíbrio geopolítico nos próximos anos.
A influência da inteligência artificial e o “boom tecnológico”
A ascensão da inteligência artificial é um dos fatores que impulsionam a valorização das terras raras. A expansão de data centers, a fabricação de chips de última geração e o desenvolvimento de robótica avançada exigem metais com propriedades magnéticas e condutivas específicas — características exclusivas desses elementos.
Analistas acreditam que o mundo está prestes a entrar em um novo boom tecnológico, semelhante ao que ocorreu com o petróleo no século XX. No centro dessa transformação, países que dominarem o acesso e o refino de minerais críticos terão vantagem estratégica sobre concorrentes.
Nesse contexto, o Oriente Médio busca se reinventar: de exportador de petróleo, a região quer tornar-se fornecedora global de energia limpa e materiais estratégicos.
China e Estados Unidos disputam liderança global
A China ainda é a potência dominante: produz cerca de 70% das terras raras do mundo e processa quase 90% do total global, controlando praticamente toda a cadeia de valor. Essa supremacia preocupa governos ocidentais, especialmente os Estados Unidos, que buscam alternativas para reduzir a dependência de Pequim.
O presidente americano Donald Trump e o líder chinês Xi Jinping devem discutir o tema durante sua próxima cúpula bilateral. A expectativa de que a China possa adiar novas restrições às exportações de terras raras animou investidores e reduziu a tensão nos mercados.
Washington, por sua vez, vem financiando projetos em países aliados e incentivando empresas a explorar novas fontes de minerais críticos — movimento que agora encontra no Oriente Médio um parceiro estratégico disposto a investir bilhões para diversificar a produção.
Desafios e oportunidades para os países do Golfo
O caminho até a autossuficiência, porém, é longo. As iniciativas de mineração e refino nos estados do Golfo ainda enfrentam desafios logísticos, ambientais e tecnológicos. Especialistas destacam que a dependência atual de parceiros estrangeiros para conhecimento técnico e infraestrutura pode retardar os resultados esperados.
Outro ponto sensível é a confiança ocidental. Parte dos países europeus e norte-americanos demonstra cautela em substituir a dependência da China por uma nova dependência do Oriente Médio, região já estratégica no fornecimento de petróleo e gás.
Mesmo com esses obstáculos, a aposta é que a transição energética global e o avanço da IA mantenham a demanda por metais estratégicos em alta, garantindo o interesse contínuo de investidores árabes e ocidentais.
Um novo eixo geopolítico está em formação
O avanço do Oriente Médio no setor de terras raras revela uma mudança estrutural na economia global. A região, antes sinônimo de energia fóssil, agora emerge como protagonista em um cenário de mineração tecnológica.
Com capital disponível, visão de longo prazo e influência diplomática, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos podem se tornar peças-chave na corrida mundial por minerais críticos. Caso consolidem suas iniciativas de refino e processamento, poderão disputar espaço com a China e atrair o interesse das principais economias ocidentais.
A revolução verde e o avanço da IA estão redefinindo prioridades econômicas e geopolíticas. E, mais uma vez, o Oriente Médio se coloca no centro das atenções — agora, não mais apenas pelo petróleo, mas pelo ouro tecnológico do século XXI: as terras raras.






