Ambipar (AMBP3) entra em recuperação judicial e tenta reverter crise financeira sem precedentes
A Ambipar (AMBP3) confirmou o que o mercado financeiro já previa: a empresa entrou oficialmente com pedido de recuperação judicial, protocolado na 3ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro. O movimento, anunciado na noite desta segunda-feira (20), representa o auge de uma crise que começou a se desenhar meses antes, com indícios de irregularidades em operações financeiras e uma forte perda de confiança por parte de investidores e credores.
A decisão marca um momento decisivo para o Grupo Ambipar, que tenta equilibrar o impacto da desvalorização de seus papéis e das pressões de instituições financeiras. O objetivo da recuperação judicial é claro: ganhar tempo para reorganizar dívidas, preservar empregos e manter a continuidade das operações — pilares centrais da estratégia da empresa para enfrentar um dos maiores desafios de sua história.
Crise se intensificou após denúncias e renúncia de diretor financeiro
De acordo com comunicado oficial, o pedido de recuperação judicial da Ambipar é resultado direto de uma série de eventos deflagrados após a descoberta de irregularidades na contratação de operações de swap pela Diretoria Financeira. O caso culminou com a renúncia repentina do diretor financeiro, o que gerou um abalo profundo na confiança do mercado.
A empresa afirmou que o colapso da credibilidade levou alguns credores a anteciparem o vencimento de dívidas, criando um risco concreto de vencimento cruzado de outras obrigações — cenário que poderia paralisar o grupo. Por isso, a Ambipar decidiu acionar a Justiça como medida de proteção, buscando evitar execuções e garantir a continuidade de suas atividades empresariais.
Com o pedido aceito, a companhia terá proteção judicial temporária contra cobranças e execuções, enquanto estrutura um plano de recuperação capaz de equilibrar seus compromissos e assegurar a estabilidade operacional.
Ambipar Emergency Response também pede proteção judicial nos EUA
O pedido de recuperação judicial da Ambipar não se limita ao Brasil. A subsidiária Ambipar Emergency Response, com sede nas Ilhas Cayman e atuação global em gestão de crises ambientais, também ingressou com pedido de proteção sob o Chapter 11 da legislação americana — equivalente à recuperação judicial brasileira.
A medida busca coordenar o reequilíbrio financeiro do grupo em múltiplas jurisdições, já que parte relevante das operações e dos credores da Ambipar está fora do país. O passo reforça o caráter global da crise e demonstra o esforço do conglomerado em proteger seus ativos e manter a reputação internacional construída ao longo de anos no setor de soluções ambientais.
O início da turbulência: desvalorização dos bonds e pressão do Deutsche Bank
A turbulência que levou à recuperação judicial da Ambipar começou a se intensificar em 22 de setembro de 2025, quando os bonds da empresa com vencimento em 2031 despencaram no mercado internacional, logo após o anúncio da sétima emissão de debêntures no valor de R$ 3 bilhões.
Nesse contexto, o deutsche Bank, um dos principais credores, exigiu um aditivo contratual de US$ 35 milhões — movimento que criou um efeito dominó, com potencial de acelerar obrigações financeiras de até R$ 10 bilhões. O banco alemão justificou a cobrança com base em cláusulas contratuais que previam exigências adicionais em caso de desvalorização dos papéis no mercado internacional.
Sem alternativas e diante de um cenário de colapso de confiança, a Ambipar acionou a Justiça ainda em setembro, alegando que as exigências do banco extrapolavam os termos originais do contrato. O episódio foi o ponto de virada da crise, sinalizando que a recuperação judicial seria inevitável.
Inconsistências nos números aumentaram as dúvidas do mercado
Outro ponto que acentuou o descompasso entre a percepção dos investidores e as informações da empresa foi a divergência entre dívida e caixa disponível. Segundo a S&P Global, a Ambipar registrava dívidas de R$ 616 milhões no segundo trimestre, mas também informava uma posição de caixa de R$ 4,7 bilhões — valor que, em tese, seria suficiente para cobrir seus compromissos.
Essa inconsistência alimentou questionamentos sobre a real situação financeira do grupo e levantou suspeitas de que os recursos estariam comprometidos por operações estruturadas e derivativos complexos, responsáveis por parte do desequilíbrio nas contas.
O mercado financeiro, atento aos sinais, passou a exigir maior transparência, ao mesmo tempo em que as agências de risco começaram a revisar seus modelos e análises sobre a saúde financeira da empresa.
Modelos preditivos já apontavam deterioração antes da crise
A crise da Ambipar não pegou todos de surpresa. Segundo análises da Moody’s Analytics, os sinais de deterioração do perfil de risco da companhia começaram a aparecer ainda no final de 2024, muito antes de a situação se tornar pública.
Entre dezembro de 2024 e setembro de 2025, o índice de risco da Ambipar aumentou mais de oito vezes, um salto considerado preocupante pelos analistas. Modelos preditivos utilizados pela Moody’s apontaram alertas já em janeiro de 2025, indicando que o risco havia triplicado em apenas um mês.
Esses sistemas são projetados para identificar movimentos de risco antes que cheguem às agências de rating tradicionais, o que reforça a tese de que os problemas estruturais da Ambipar eram profundos e se acumulavam há meses.
Vale destacar que a Moody’s Analytics não é a mesma entidade da Moody’s Ratings, responsável pela emissão de notas de crédito. No caso da Ambipar, a empresa nunca recebeu rating oficial de crédito, o que aumentou a incerteza entre investidores.
Objetivo da recuperação judicial: preservar empregos e operações
De acordo com comunicado da empresa, a recuperação judicial da Ambipar busca garantir a continuidade das operações, preservar empregos e honrar contratos em andamento. A companhia afirma que suas atividades seguem normalmente, inclusive nas áreas de resposta a emergências ambientais, gestão de resíduos e serviços industriais.
A prioridade agora é restabelecer a confiança do mercado, renegociar dívidas de curto e longo prazo e demonstrar capacidade operacional suficiente para sustentar o negócio durante o período de reestruturação.
O plano de recuperação deve contemplar reescalonamento de dívidas, venda de ativos não estratégicos e reorganização de subsidiárias, incluindo as operações internacionais. Segundo especialistas, o sucesso do processo dependerá da transparência da gestão e da disposição dos credores em colaborar para evitar a falência do grupo.
Ambipar tenta recuperar credibilidade no mercado
O desafio mais complexo para o grupo será reconstruir sua credibilidade perante investidores e clientes. Nos últimos anos, a Ambipar se destacou como uma das principais empresas brasileiras no setor de sustentabilidade e gestão ambiental, com presença global e forte discurso ESG.
A crise atual, no entanto, ameaça esse posicionamento. O mercado avalia que a Ambipar precisará adotar novas práticas de governança corporativa e reforçar sua transparência financeira para evitar uma perda irreversível de reputação.
Especialistas avaliam que o grupo ainda possui ativos estratégicos valiosos, operações diversificadas e contratos relevantes no setor público e privado — fatores que podem servir de base para uma recuperação bem-sucedida.
Próximos passos: reestruturação e reequilíbrio financeiro
O pedido de recuperação judicial da Ambipar marca apenas o início de um longo processo de reestruturação financeira e administrativa. Caso a Justiça aceite o pedido, a empresa deverá apresentar em até 60 dias um plano de recuperação, detalhando como pretende pagar os credores e reorganizar o grupo.
O desafio é expressivo: reconquistar o apoio do mercado, manter o fluxo de caixa positivo e evitar a perda de contratos importantes, especialmente em um momento de instabilidade no setor ambiental e financeiro.
A Ambipar tenta provar que a crise, embora profunda, não representa o fim de suas operações, mas sim uma oportunidade para recomeçar sob novas bases de governança e sustentabilidade.






