Caso Ultrafarma: Receita Federal investiga aumento patrimonial bilionário em apenas dois anos
A Ultrafarma, uma das maiores redes varejistas do setor farmacêutico no Brasil, está no centro de um dos maiores escândalos fiscais recentes. O caso ganhou notoriedade nacional após investigações do Ministério Público de São Paulo (MP-SP) e da Receita Federal (RFB) revelarem que a empresa teria participado de um esquema de fraude tributária envolvendo ressarcimentos fraudulentos de créditos de ICMS.
O episódio, batizado de Operação Ícaro, apontou que, em apenas dois anos, o patrimônio declarado de uma empresa ligada ao esquema teria saltado de R$ 46 milhões para mais de R$ 2 bilhões, um crescimento considerado atípico e sem explicações plausíveis pelas autoridades. Esse movimento acendeu o alerta sobre possíveis crimes de corrupção fiscal, lavagem de dinheiro e evasão de divisas.
Como funcionava o esquema fraudulento
O mecanismo identificado pelos investigadores tinha como foco a manipulação dos processos de ressarcimento de créditos tributários de ICMS, um direito legal de empresas que acumulam saldo credor em determinadas operações, como exportações ou substituição tributária.
Segundo o MP-SP, auditores fiscais da Secretaria da Fazenda de São Paulo (Sefaz-SP), em conluio com empresas como a Ultrafarma e a Fast Shop, aceleravam e aprovavam pedidos fraudulentos de créditos de ICMS. Em troca, recebiam propinas milionárias disfarçadas em contratos fictícios e empresas de fachada.
Principais pontos do esquema:
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Montagem de documentação irregular para justificar pedidos de ressarcimento;
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Aprovação acelerada de processos sem a devida conferência;
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Blindagem interna para impedir revisões técnicas;
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Utilização de empresas fantasmas para movimentar valores ilícitos.
O papel da Smart Tax e o salto bilionário
A Smart Tax, empresa registrada em nome da mãe do auditor fiscal Artur Gomes da Silva Neto, foi apontada como peça central no esquema. Sem sede operacional, funcionários ou atividade comercial conhecida, a empresa foi usada para movimentar grandes volumes de recursos, servindo como intermediária nos pagamentos de propina.
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Em 2021, não havia registro de movimentações expressivas.
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Em 2022, o patrimônio declarado era de R$ 46 milhões.
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Em 2024, o salto foi para R$ 2 bilhões, incluindo a declaração de R$ 6 milhões em espécie guardados em casa.
O crescimento repentino chamou a atenção da Receita Federal, que cruzou informações com dados de criptomoedas, transferências internacionais e trocas de e-mails entre executivos e auditores fiscais.
Ultrafarma e Fast Shop na mira das investigações
As investigações citam diretamente a Ultrafarma, do empresário Sidney Oliveira, e a rede de varejo Fast Shop. Segundo os promotores, e-mails apreendidos indicam negociações para manipular pedidos de ressarcimento de ICMS e orientações para burlar a fiscalização.
Apesar disso, tanto a Ultrafarma quanto a Fast Shop negam qualquer envolvimento e alegam que suas operações seguem a legalidade. No entanto, o fato de seus nomes constarem nos autos da investigação aumenta a pressão pública e o desgaste de imagem.
Prisões e desdobramentos da Operação Ícaro
Na primeira fase da operação, foram presos:
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Artur Gomes da Silva Neto, auditor fiscal considerado o chefe do esquema;
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Outros cinco suspeitos, incluindo auditores ativos e aposentados, executivos e contadores.
As prisões preventivas foram decretadas para impedir a destruição de provas e novas fraudes. A expectativa é de que novas fases da operação tragam ainda mais nomes de peso à tona.
Prejuízo bilionário aos cofres públicos
De acordo com o MP-SP, os desvios podem ultrapassar R$ 1 bilhão desde 2021. Como o ICMS é um dos tributos mais importantes para o financiamento da saúde e da educação nos estados, o esquema comprometeu diretamente recursos que deveriam ser destinados a políticas públicas essenciais.
Esse impacto reforça a gravidade do caso Ultrafarma e amplia o clamor por responsabilização rigorosa dos envolvidos.
Lavagem de dinheiro e criptomoedas
Além dos indícios de fraude tributária, as investigações revelaram movimentações suspeitas em exchanges de criptomoedas e transferências internacionais. Segundo o MP, parte da justificativa apresentada pela defesa da família do auditor é de que os lucros vieram de investimentos em criptoativos — versão considerada pouco crível, diante da ausência de comprovações documentais.
Esse braço da investigação pode ampliar o caso para o âmbito internacional, envolvendo possíveis crimes de evasão de divisas e lavagem de dinheiro transnacional.
Reações das autoridades
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Receita Federal: iniciou auditorias em cascata sobre todos os processos de ressarcimento de ICMS assinados por Artur Gomes.
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Tribunal de Contas do Estado (TCE): apura falhas de controle interno na Sefaz-SP.
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Governo de São Paulo: afirmou colaborar integralmente com as investigações e prometeu punições administrativas e criminais aos envolvidos.
O que é a Operação Ícaro?
A operação recebeu esse nome em alusão ao mito grego de Ícaro, que caiu por voar alto demais. A metáfora aponta para a ambição desmedida do auditor fiscal e para o uso abusivo de sua posição de poder dentro da Sefaz.
Seus objetivos principais são:
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Desarticular a organização criminosa infiltrada no serviço público;
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Identificar o caminho do dinheiro ilícito;
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Responsabilizar agentes públicos e privados;
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Evitar novos esquemas semelhantes.
Impactos no setor farmacêutico e na imagem da Ultrafarma
O caso atinge diretamente a reputação da Ultrafarma, que sempre se destacou pela agressiva política de preços baixos no setor farmacêutico. Agora, o envolvimento em um escândalo de corrupção coloca em xeque sua credibilidade junto a clientes, fornecedores e autoridades.
Além disso, a pressão regulatória pode afetar a operação da empresa a médio prazo, caso novas provas reforcem seu vínculo com as fraudes investigadas.
O Caso Ultrafarma se consolidou como um dos maiores escândalos fiscais da história recente do Brasil. A combinação de fraudes tributárias bilionárias, lavagem de dinheiro e indícios de corrupção envolvendo grandes empresas expôs fragilidades do sistema de controle da Sefaz-SP e abriu um debate sobre transparência e compliance no setor privado.
As próximas fases da Operação Ícaro devem definir o futuro jurídico da Ultrafarma, da Fast Shop e dos agentes públicos envolvidos. Enquanto isso, a pressão social e política por punições exemplares cresce, em um cenário onde a credibilidade das instituições fiscais está em jogo.






