Relatora vota pela cassação da chapa de Cláudio Castro e ministro do TSE pede vista
A sessão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) desta terça-feira (4/11) colocou em evidência o futuro político do governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, após a ministra Isabel Gallotti votar pela cassação da chapa de Cláudio Castro, eleita em 2022. O julgamento, que analisava acusações de abuso de poder político e econômico, foi interrompido após pedido de vista do ministro Antônio Carlos Ferreira, adiando uma definição sobre o caso que pode mudar os rumos da política fluminense.
A relatora entendeu que houve uso indevido da máquina pública durante o período eleitoral, beneficiando diretamente a candidatura de Castro à reeleição. Em seu voto, Gallotti também propôs a inelegibilidade de Rodrigo Bacellar, presidente da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), e de Gabriel Rodrigues Lopes, ex-presidente do Centro Estadual de Estatísticas, Pesquisas e Formação de Servidores Públicos (Ceperj). Todos foram apontados como beneficiários de um esquema irregular de contratações com fins eleitorais.
Abuso de poder e uso da máquina pública
Em voto detalhado, que durou cerca de duas horas, Isabel Gallotti sustentou que a cassação da chapa de Cláudio Castro é necessária diante das provas de utilização indevida de estruturas administrativas estaduais durante a campanha de 2022. Segundo a relatora, milhares de contratações temporárias foram feitas entre janeiro e julho daquele ano em órgãos estaduais, principalmente no Ceperj e na Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).
Essas admissões, segundo Gallotti, revelaram um “esquema elaborado” com a finalidade de favorecer a reeleição de Castro. A ministra observou que o volume de contratações e o contexto temporal indicam intenção clara de influenciar o resultado das urnas, configurando abuso de poder político e econômico.
A magistrada afirmou que as ações não foram pontuais, mas parte de uma estratégia planejada e executada dentro do governo estadual. A prática, segundo ela, comprometeu o princípio da igualdade de oportunidades entre os candidatos, violando diretamente a legislação eleitoral.
Inelegibilidade e multas
Além de propor a cassação da chapa de Cláudio Castro, a relatora votou pela inelegibilidade de Cláudio Castro, Rodrigo Bacellar e Gabriel Lopes, impedindo-os de disputar cargos eletivos pelos próximos oito anos. Também determinou a multa máxima de R$ 100 mil aos três, valor previsto na legislação para casos de abuso de poder. Já para Thiago Pampolha, ex-vice-governador, Gallotti aplicou a multa mínima de R$ 10 mil, ao entender que ele teve participação menos ativa no esquema.
A ministra ainda sugeriu que o Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ) seja acionado para organizar novas eleições para os cargos de governador, vice e deputados estaduais, caso a cassação seja confirmada pelo plenário do TSE.
Pedido de vista suspende julgamento
Logo após o voto da relatora, o ministro Antônio Carlos Ferreira pediu vista, suspendendo o julgamento por tempo indeterminado. A decisão postergou uma definição que pode gerar efeitos imediatos sobre o comando político do estado.
Com o pedido de vista, a votação será retomada apenas quando o ministro devolver o processo para deliberação do colegiado. Até lá, Cláudio Castro permanece no cargo de governador, mas sob a pressão de uma possível cassação que ameaça encurtar seu mandato e alterar a composição do governo estadual.
A suspensão do julgamento ampliou a tensão política no Rio. Aliados do governador criticaram a decisão da relatora, enquanto a oposição vê o voto de Gallotti como um passo histórico no combate ao uso eleitoral da máquina pública.
Denúncias e origem do processo
O caso teve origem em denúncia apresentada pela chapa do ex-deputado Marcelo Freixo, que ficou em segundo lugar nas eleições de 2022. Segundo o processo, o governo estadual teria contratado mais de 18 mil pessoas para projetos sociais vinculados ao Ceperj e à Uerj, com o objetivo de ampliar a base eleitoral do então governador.
As investigações apontaram movimentações financeiras expressivas, incluindo saques em espécie que, somados, ultrapassaram R$ 250 milhões no período entre setembro de 2021 e julho de 2022. A denúncia indicava que esses recursos foram usados de forma a gerar visibilidade e apoio político para Castro e seus aliados.
Em maio de 2023, o TRE-RJ julgou o caso e absolveu o governador e os demais envolvidos por quatro votos a três, contrariando o parecer do Ministério Público Eleitoral (MPE), que pedia a condenação e a perda dos mandatos. Inconformado, o MPE recorreu ao TSE, dando início ao julgamento atual.
Argumentos da relatora
No voto apresentado, Isabel Gallotti destacou que as provas reunidas demonstram “alto grau de reprovabilidade das condutas”, indicando que os atos não foram improvisados, mas planejados com antecedência e executados para consolidar poder político.
Segundo a ministra, a amplitude das contratações e o momento em que ocorreram evidenciam que o governo fluminense utilizou programas estatais como ferramenta de promoção eleitoral. Para ela, o padrão de irregularidades caracteriza um esquema que distorceu o equilíbrio da disputa, ferindo a legitimidade do processo democrático.
A relatora também ressaltou que as ações investigadas comprometem a confiança da sociedade nas instituições e corroem a credibilidade do sistema eleitoral. Em seu entendimento, o caso é um exemplo claro de como o uso da estrutura pública para fins eleitorais atinge a essência do voto livre e igualitário.
Possíveis desdobramentos no Rio de Janeiro
Se a cassação da chapa de Cláudio Castro for confirmada, o TRE-RJ deverá organizar novas eleições para os cargos de governador e vice. A Constituição do Estado do Rio de Janeiro prevê duas possibilidades: eleição direta, se a vacância ocorrer até seis meses antes do fim do mandato; ou indireta, caso o afastamento aconteça a menos de seis meses da conclusão do período de governo.
A realização de uma nova eleição abriria uma disputa inédita em meio ao mandato e poderia redefinir alianças políticas no estado. Partidos já se movimentam nos bastidores para discutir cenários alternativos caso a cassação se torne realidade. O processo também poderá influenciar a disputa nacional de 2026, dado o peso político e econômico do Rio de Janeiro.
Repercussão política
A possibilidade de cassação da chapa de Cláudio Castro agitou os bastidores de Brasília e da política fluminense. O caso é visto como um teste para o TSE diante de denúncias de abuso de poder envolvendo lideranças estaduais. Enquanto aliados do governador argumentam que não há provas diretas de irregularidades, setores da oposição consideram o voto da relatora um marco na responsabilização de agentes públicos.
A decisão de Gallotti também foi interpretada como um recado sobre a necessidade de maior rigor no combate à utilização de recursos e cargos públicos com fins eleitorais. Analistas avaliam que, independentemente do resultado final, o processo já provoca desgaste à imagem do governador e reduz seu capital político no cenário nacional.
Contexto recente e ambiente de instabilidade
O julgamento ocorre poucos dias após uma das operações policiais mais letais da história do país, no Complexo da Penha, na zona norte do Rio, que resultou em mais de uma centena de mortes. O episódio ampliou o clima de tensão no estado e trouxe questionamentos sobre a gestão da segurança pública — uma das bandeiras centrais do governo de Cláudio Castro.
A combinação de instabilidade institucional e de desgaste político aumenta a pressão sobre o governo. A eventual cassação do mandato poderia abrir um período de incerteza e transição no Executivo fluminense, com impactos diretos nas políticas públicas, nas finanças estaduais e na confiança de investidores.
O que vem a seguir
Com o pedido de vista, o processo aguarda o retorno do ministro Antônio Carlos Ferreira ao plenário do TSE. Ainda não há prazo definido para retomada da votação. Após a manifestação dos demais ministros, o resultado final poderá confirmar ou reverter o voto da relatora.
Caso a maioria siga o entendimento de Gallotti, o Rio de Janeiro enfrentará um cenário político inédito, com a convocação de novas eleições em meio ao mandato. O desfecho também servirá como parâmetro para outros casos de abuso de poder político analisados pela Justiça Eleitoral em todo o país.
Enquanto o julgamento não é concluído, o governo fluminense segue em operação sob intensa vigilância pública. A cassação da chapa de Cláudio Castro tornou-se não apenas uma disputa jurídica, mas um símbolo do embate entre o poder político e os limites impostos pela lei eleitoral brasileira.






