V.tal recorre contra decisão da falência da Oi e alerta para insegurança jurídica no setor de telecomunicações
A disputa em torno da falência da Oi ganhou novos contornos após a V.tal, empresa de infraestrutura digital ligada ao BTG Pactual, apresentar recurso contra pontos específicos da decisão que decretou a quebra da operadora. O movimento eleva a tensão entre credores, investidores e agentes do mercado, que veem no caso um teste decisivo para a previsibilidade do ambiente jurídico brasileiro, especialmente em operações de grande porte.
A contestação apresentada pela V.tal não pretende rediscutir o mérito da falência da Oi, que já é alvo de outras manifestações. O foco da empresa está na preservação da segurança jurídica, especialmente em relação a atos homologados pelo próprio Judiciário ao longo do processo de recuperação judicial da operadora. Para a V.tal, trechos da nova decisão questionam elementos consolidados em fases anteriores da reestruturação, o que pode gerar incertezas sobre a validade de operações realizadas nos últimos anos.
Decisão contestada reacende debate sobre previsibilidade judicial
Segundo a V.tal, a decisão da 7ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro teria colocado em dúvida a regularidade de atos praticados, autorizados e homologados anteriormente no âmbito da recuperação judicial da Oi. Entre eles, estariam alienações de ativos, reorganizações societárias e garantias fiduciárias. Ao revisar implicitamente decisões anteriores, a empresa entende que a Vara teria reaberto discussões já encerradas.
Para advogados que acompanham o caso, esse tipo de reinterpretação tardia compromete um dos pilares do sistema de insolvência brasileiro: o respeito à coisa julgada. A segurança jurídica é essencial para operações que envolvem bilhões de reais e participações entre múltiplos agentes públicos e privados. Qualquer instabilidade nesse campo afeta a credibilidade do sistema e repercute diretamente sobre novos investimentos.
A V.tal reforça que seu recurso busca preservar a extensão da coisa julgada e a previsibilidade das decisões judiciais, pilares fundamentais para transações envolvendo Unidades Produtivas Isoladas (UPIs) — mecanismo central para o modelo de recuperação judicial no Brasil. Ao adquirir ativos da Oi dentro desse formato, a empresa afirma ter seguido todos os parâmetros legais vigentes.
Credores se mobilizam após questionamentos sobre alienações de ativos
A inquietação da V.tal não é isolada. Outros credores também se articulam para contestar pontos da decisão que decretou a falência da Oi. A preocupação central recai sobre dúvidas levantadas pela Justiça acerca das vendas de ativos realizadas ao longo dos planos de recuperação judicial da operadora.
Durante os últimos anos, a Oi alienou negócios de telefonia móvel, infraestrutura de fibra óptica, banda larga fixa, TV por assinatura e participações em diversas empresas do setor. Todas essas operações foram aprovadas pelos credores e homologadas pela Justiça, que as considerou essenciais para permitir que a tele reorganizasse suas atividades.
A juíza responsável pelo caso, no entanto, classificou o conjunto dessas alienações como parte de uma “liquidação sistêmica”, expressão que acendeu o alerta de investidores. Segundo ela, as operações teriam esvaziado a companhia, inviabilizando sua continuidade e contribuindo para justificar a decretação da falência.
Especialistas do setor afirmam que, se essa visão prosperar, o modelo de recuperação judicial como um todo poderá ser prejudicado, uma vez que o mecanismo de venda de ativos é um dos instrumentos mais importantes para preservar valor em empresas em crise.
Acordo da concessão de telefonia fixa entra no centro da disputa
Outro ponto que levou à reação da V.tal foi o questionamento da validade do acordo firmado entre Oi, Anatel, AGU e TCU para encerrar a concessão do serviço de telefonia fixa, previsto para se extinguir em 2024. Esse pacto foi considerado um marco importante para permitir que a empresa migrasse de um modelo de concessão oneroso para regimes mais alinhados à dinâmica atual das telecomunicações.
Ao criticar a autocomposição, a magistrada apontou que o acerto não poderia ser considerado um “ato de Estado” nem teria gerado benefícios relevantes para a operadora. O entendimento contraria percepções de órgãos técnicos e reguladores que participaram do processo.
A V.tal, que assumiu compromissos de investimento vinculados ao fim da concessão, teme que esse questionamento comprometa a lógica jurídica e econômica que orientou a negociação. Para empresas que investiram na modernização da infraestrutura de telecomunicações brasileira, o risco de revisões tardias preocupa.
UPIs e garantias fiduciárias: a espinha dorsal da recuperação judicial
Um dos pilares da argumentação da V.tal é a defesa do regime jurídico das Unidades Produtivas Isoladas (UPIs), mecanismo que protege compradores de ativos de eventuais passivos da empresa em recuperação. Esse instrumento é essencial para garantir que investidores assumam riscos calculados ao adquirir partes saudáveis de negócios em crise.
A empresa ressalta que comprometer esse modelo pode gerar um efeito cascata de insegurança jurídica, afetando não apenas transações da Oi, mas futuras operações em setores estratégicos. Além disso, questionamentos sobre garantias fiduciárias homologadas em juízo podem diminuir o apetite de bancos, fundos e investidores por operações de reestruturação.
Para analistas do mercado financeiro, o caso se torna emblemático porque a falência da Oi envolve uma quantidade excepcional de credores, ativos e contratos. Qualquer mudança de entendimento acarreta reflexos profundos no sistema.
O risco sistêmico para o setor de telecomunicações
O setor de telecomunicações depende de alta previsibilidade regulatória e jurídica para atrair investimentos. A implantação de redes de fibra óptica, expansão de infraestrutura 5G e modernização da malha de conectividade exigem aportes bilionários e compromissos de longo prazo.
A insegurança jurídica pode:
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elevar o custo do capital;
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afastar investidores internacionais;
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comprometer operações estruturadas com base em decisões judiciais anteriores;
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dificultar acordos entre empresas e órgãos reguladores.
No caso da Oi, os reflexos podem extrapolar o universo da operadora e afetar outros grupos econômicos que negociam reestruturações semelhantes.
Impacto para o ambiente de negócios
Economistas apontam que a instabilidade em torno da falência da Oi também preocupa por ocorrer em um momento de intensificação dos investimentos em infraestrutura no país. a digitalização crescente da economia e a expansão de serviços de alta velocidade tornam a previsibilidade jurídica fator determinante para a continuidade dos investimentos.
A revisão de atos já homologados pode afetar:
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operações de fusões e aquisições;
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estruturas de financiamento que dependem de fundos internacionais;
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privatizações e concessões que envolvem redes públicas;
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processos de recuperação em setores adjacentes, como energia e transporte.
Para a V.tal, a manutenção de atos praticados durante a recuperação judicial é essencial para sustentar o interesse de investidores que assumiram riscos em operações complexas envolvendo ativos da Oi.
O que esperar dos próximos capítulos
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro será responsável por analisar o recurso. A decisão terá impacto relevante sobre os desdobramentos da falência da Oi e sobre a governança do próprio sistema de recuperação judicial.
Entre os próximos passos estão:
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análise dos recursos de credores;
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definição sobre os limites do juízo falimentar para revisar atos anteriores;
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eventual harmonização entre decisões administrativas e judiciais;
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julgamento de eventuais embargos e pedidos de esclarecimento.
O mercado acompanha com atenção, especialmente porque o caso envolve um dos maiores processos de insolvência da história do país.
Riscos e perspectivas para investidores
Para especialistas, o principal medo é que a insegurança jurídica provocada por decisões conflitantes reduza o apetite de investidores por empresas em reestruturação. Em setores estratégicos, isso dificulta a retomada de companhias que dependem de renegociação de dívidas e venda de ativos.
A V.tal alerta que fragilizar a estabilidade das alienações realizadas pela Oi pode prejudicar os próximos ciclos de investimento em telecomunicações — justamente em um cenário de expansão da conectividade e aumento da demanda por banda larga de alta capacidade.






