Aposentadoria no Brasil: 6 em cada 10 trabalhadores não guardam nenhum recurso e vivem em vulnerabilidade permanente
A falta de preparo financeiro para o futuro expõe um quadro preocupante: a aposentadoria no Brasil está fragilizada, com grande parte da população economicamente ativa vivendo sem qualquer reserva para a velhice. Um levantamento nacional realizado pela Associação Brasileira de Educadores Financeiros (Abefin), em parceria com o Instituto Axxus, revela que 62% dos trabalhadores brasileiros não economizam absolutamente nada para o período pós-vida laboral. Isso significa que seis em cada dez pessoas em idade produtiva caminham para a velhice sem proteção financeira, totalmente dependentes do presente — ou de terceiros.
Os dados reforçam um cenário que se tornou característico do país: milhões de brasileiros enfrentam dificuldades para sobreviver hoje e, consequentemente, deixam de pensar no amanhã. Mesmo entre os 38% que conseguem poupar, a diversificação é limitada. A maioria cita o INSS como principal instrumento de reserva, enquanto parte relevante aposta em previdência privada ou alternativas como poupança, imóveis e investimentos de baixo risco.
Essa realidade, exposta pela nova pesquisa intitulada “Aposentadoria, INSS e Previdência Privada: a realidade em 2025”, revela não apenas a falta de planejamento individual, mas também o impacto de uma economia marcada por informalidade, baixos salários, instabilidade profissional e ausência de cultura de educação financeira.
Falta de preparo: o retrato da aposentadoria no Brasil hoje
O estudo ouviu 600 trabalhadores de diversas regiões do país, representando de maneira proporcional o universo dos 78,3 milhões de profissionais que compõem a força de trabalho brasileira em 2025. A pesquisa mostra que metade dessa população se encontra na formalidade — seja via CLT ou como pessoa jurídica — enquanto a outra metade atua em regime informal, sem proteção trabalhista e previdenciária.
A informalidade, que atinge aproximadamente 49,7% da força de trabalho, cria um obstáculo direto à formação de uma aposentadoria no Brasil estruturada. Sem um emprego fixo, rendimentos previsíveis ou contribuições constantes, esses trabalhadores acabam automaticamente excluídos tanto do sistema público quanto de planos privados de aposentadoria que exigem aportes mensais.
A consequência é devastadora: a descontinuidade de renda impede o planejamento de longo prazo e empurra milhões para um futuro incerto.
INSS como principal ferramenta — mas sem confiança
Entre os que poupam, o INSS segue como o instrumento mais citado. Contudo, a confiança no benefício é baixa. Apenas 7% dos trabalhadores que contribuem acreditam que o valor recebido será suficiente para manter uma vida digna na velhice.
A disparidade entre a expectativa e a realidade decorre da percepção generalizada de que o benefício pago pelo sistema público não acompanha o custo de vida. Além disso, a alta rotatividade no mercado de trabalho e a informalidade minam as contribuições regulares necessárias para garantir valores mais altos.
A pesquisa mostra ainda que somente 19% dos brasileiros que investem em previdência privada acreditam que terão autonomia financeira suficiente para não depender de terceiros. Isso revela que mesmo entre os mais organizados financeiramente, prevalece a insegurança em relação ao futuro.
A ausência completa de reservas financeiras agrava o problema
A falta de planejamento para a aposentadoria no Brasil está diretamente ligada a outra realidade preocupante: a ausência de reserva financeira de curto prazo. A pesquisa da Abefin mostra que:
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41% dos entrevistados conseguiriam manter o padrão de vida atual por menos de três meses caso perdessem a renda hoje;
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39% sobreviveriam entre três e seis meses.
Ou seja: 80% dos brasileiros não conseguem se manter por mais de meio ano sem renda, e muitos sequer durariam semanas.
Essa vulnerabilidade deixa claro que a população brasileira não possui colchões de emergência que possam cobrir imprevistos como desemprego, doenças, acidentes ou crises familiares. A fragilidade no presente reforça a fragilidade no futuro.
A herança financeira dos pais ajuda a explicar o ciclo
A pesquisa também analisou o comportamento das famílias e encontrou um traço cultural que perpetua a falta de preparo financeiro: 29% dos aposentados dependem financeiramente dos filhos ou de terceiros, enquanto 41% continuam trabalhando mesmo após a aposentadoria.
Essa dependência intergeracional cria um ciclo contínuo de vulnerabilidade. Os pais, sem reservas suficientes, tornam-se dependentes dos filhos — filhos que, por sua vez, já enfrentam dificuldades financeiras para se organizar. Assim, a roda da insegurança econômica gira de forma constante, impedindo que novas gerações consigam acumular patrimônio.
O cenário ajuda a explicar por que mesmo trabalhadores que possuem renda não conseguem poupar para a aposentadoria no Brasil: parte deles mantém os pais, parentes idosos ou adultos em situação de vulnerabilidade.
Por que tantos brasileiros não contribuem? A resposta é direta: falta de dinheiro
Ao serem questionados sobre os motivos para não contribuírem ao INSS, 87% dos entrevistados responderam simplesmente: falta de dinheiro.
O dado revela uma verdade incômoda: a questão não é apenas desconfiança no sistema previdenciário, mas a impossibilidade objetiva de comprometer parte da renda com algo que só trará retorno no futuro. Grande parte da população sobrevive no limite, sem qualquer margem para formar reserva.
Entretanto, o estudo também identificou um componente comportamental. Muitos brasileiros demonstram resistência a pensar no longo prazo e preferem focar no presente. Trata-se do fenômeno conhecido como “desconto hiperbólico”, que leva as pessoas a valorizarem benefícios imediatos e negligenciarem os ganhos futuros.
No Brasil, essa tendência é potencializada por fatores como:
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renda insuficiente;
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alta inflação histórica;
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instabilidade profissional;
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ausência de orientação financeira;
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falta de exemplos familiares de organização;
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medo do futuro, que gera paralisia em vez de ação.
A combinação desses elementos cria um ambiente em que planejar a aposentadoria se torna uma tarefa distante para milhões.
Educação financeira: o elo perdido
A pesquisa revela um número alarmante: 95% dos entrevistados nunca receberam nenhum tipo de orientação sobre aposentadoria. Entre os que tiveram algum contato com conteúdos sobre o tema, 98% afirmam que a informação não foi suficiente para estruturar uma vida financeira saudável.
Esse déficit educacional explica por que o Brasil possui um dos menores níveis de poupança entre os países emergentes e um dos mais altos índices de endividamento familiar. Sem clareza sobre como começar e sem recursos suficientes para buscar ajuda profissional, o trabalhador médio fica sem direção.
Sem entendimento sobre juros, inflação, investimentos, previdência privada, INSS e planejamento de longo prazo, o brasileiro se vê diante de um quadro de incertezas que se agrava a cada ano.
Aposentadoria no Brasil: um futuro ameaçado
Os resultados da pesquisa reforçam o alerta para o que pode acontecer com o país nas próximas décadas. Caso nada seja feito, o Brasil caminhará para uma condição crítica, com um contingente cada vez maior de idosos pobremente assistidos e dependentes dos mais jovens.
Especialistas em previdência e economia afirmam que a situação tende a se intensificar por causa de três fatores principais:
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Envelhecimento acelerado da população, com mais aposentados e menos trabalhadores contribuindo.
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Redução do número de jovens no mercado, o que pressiona o sistema previdenciário.
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Crescimento da informalidade, que fragiliza as contribuições e reduz arrecadações.
Se o país não ampliar políticas públicas e não estimular educação financeira, a crise previdenciária poderá se tornar estrutural — refletindo não apenas no bolso dos trabalhadores, mas no equilíbrio fiscal do Estado.
Uma urgência nacional: renda, educação e cultura de poupança
A pesquisa conclui que o Brasil precisa de um tripé para reverter a vulnerabilidade previdenciária:
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Aumento da renda média da população, permitindo espaço para poupar;
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Educação financeira abrangente e acessível, desde o ensino básico;
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Incentivo à cultura de poupança, com ferramentas simples e claras para o trabalhador comum.
Ao mesmo tempo, o governo precisa aprimorar políticas de proteção social, incentivar a formalização e criar mecanismos de contribuição alternativos para trabalhadores com renda variável.
Sem esses movimentos combinados, a aposentadoria no Brasil continuará sendo um desafio gigantesco, com impacto direto na qualidade de vida de milhões de pessoas.






