A nova rota do café brasileiro após tarifaço de Trump: Alemanha lidera e Europa amplia domínio
O tarifaço imposto por Donald Trump sobre o café brasileiro em agosto de 2025 desencadeou uma reconfiguração inédita no comércio internacional do grão. Com a tarifa de 50% sobre as importações vindas do Brasil, o produto nacional perdeu competitividade no mercado norte-americano e provocou um reposicionamento estratégico dos exportadores. Dois meses após a medida, o Brasil encontrou novos portos: a Alemanha assumiu a liderança como principal destino, e até a Colômbia, tradicional concorrente, passou a importar volumes expressivos.
A nova rota do café brasileiro reflete não apenas o impacto econômico imediato das tarifas impostas pelos Estados Unidos, mas também a capacidade do setor de reagir e adaptar-se rapidamente às mudanças do cenário global. Hoje, a Europa concentra mais de 60% das exportações nacionais, consolidando-se como o epicentro do comércio do café do Brasil.
Alemanha assume a dianteira e redefine o mapa das exportações
Em setembro de 2025, a Alemanha ultrapassou os Estados Unidos e se tornou o maior importador do café brasileiro, com 654,6 mil sacas, o equivalente a 17,5% de todas as exportações nacionais no mês, segundo dados do Cecafé (Conselho dos Exportadores de Café do Brasil).
Com essa virada histórica, os Estados Unidos caíram para a terceira posição, registrando uma queda de 52,8% nas compras em comparação com setembro de 2024. A nova configuração mostra como o tarifaço de Trump provocou uma migração natural do comércio brasileiro em direção à União Europeia, que se beneficia de menores custos logísticos, câmbio favorável e uma demanda crescente por cafés especiais.
A Alemanha ocupa posição estratégica no setor, com uma ampla estrutura de torrefação e reexportação. O país não apenas consome, mas também distribui café para todo o continente europeu, atuando como o principal hub do café brasileiro na Europa.
União Europeia se consolida como principal destino
Somando os embarques para Alemanha, Itália, Bélgica, Holanda e Espanha, o bloco europeu respondeu por mais de 60% das exportações brasileiras de café em setembro. A Itália, segunda colocada, importou 334,6 mil sacas (8,9%), seguida pelos Estados Unidos (8,9%), Japão (5,8%), Bélgica (4,9%) e Holanda (4,3%).
O fortalecimento da nova rota do café brasileiro confirma a dependência crescente da Europa em relação ao produto nacional. Além da qualidade reconhecida do grão brasileiro, o câmbio favorável e a valorização internacional do arábica aumentaram a atratividade das exportações para o bloco.
A diversificação também ampliou a presença do café nacional em mercados como Turquia (4%), Espanha (3,8%) e Canadá (2,9%), consolidando o Brasil como fornecedor global mesmo diante de restrições impostas pelos Estados Unidos.
Colômbia surpreende e entra no ranking dos maiores importadores
Um dos dados mais curiosos do novo cenário é a presença da Colômbia — historicamente competidora direta do Brasil — entre os dez maiores importadores de café brasileiro. O país registrou um salto de 567% nas compras em relação ao mesmo período de 2024, totalizando 107,2 mil sacas, o que representa 2,9% das exportações do Brasil.
Essa movimentação não indica uma mudança estrutural no mercado, mas uma resposta pontual à crise de safra colombiana, que reduziu a oferta local e levou o país a importar grãos brasileiros para suprir o consumo interno e manter parte de suas exportações por meio do regime de drawback — mecanismo que isenta impostos sobre insumos destinados à reexportação.
Mesmo sendo um evento temporário, a entrada da Colômbia entre os principais compradores reforça o alcance global do café brasileiro e a capacidade de o setor ocupar lacunas produtivas deixadas por outros países produtores.
Efeitos do tarifaço nos Estados Unidos
A tarifa de 50% sobre o café brasileiro, decretada por Trump como parte de uma política de “proteção à produção nacional”, provocou uma mudança drástica nas relações comerciais. O preço médio do café do Brasil nos EUA subiu cerca de 40%, tornando-se menos competitivo em relação a fornecedores como Honduras e Vietnã.
Com o aumento de custos, torrefadoras e redes de cafeterias norte-americanas reduziram suas compras de blends brasileiros e passaram a renegociar contratos. A retração abriu espaço para novos fluxos comerciais, redirecionando o produto para mercados com margens mais favoráveis e custos alfandegários menores.
Apesar da perda de participação nos EUA, o Brasil conseguiu compensar a queda de volume com preços mais altos no mercado internacional, demonstrando a resiliência do setor.
Exportações menores, mas com receita recorde
Entre janeiro e setembro de 2025, o Brasil exportou 29,1 milhões de sacas de café, uma queda de 20,5% em volume em relação ao mesmo período de 2024. No entanto, a receita cresceu 30%, alcançando US$ 11,05 bilhões.
Em setembro, as exportações totalizaram 3,75 milhões de sacas de 60 kg, o menor volume para o mês em três anos. Mesmo assim, a receita subiu 11,1%, somando US$ 1,37 bilhão, impulsionada pela alta dos preços internacionais do arábica e pela valorização dos contratos futuros na Bolsa de Nova York.
Esse desempenho mostra como o valor agregado do café brasileiro aumentou, fruto de uma estratégia que prioriza mercados premium e cafés especiais, reduzindo a dependência de grandes compradores tradicionais.
Estratégias e adaptação do setor
O setor cafeeiro brasileiro reagiu com rapidez à nova conjuntura. Exportadores reorganizaram rotas, priorizaram contratos com torrefadoras europeias e intensificaram o envio de cafés diferenciados para mercados de alto valor agregado.
Além disso, a desvalorização do real favoreceu a competitividade internacional e permitiu que produtores obtivessem margens de lucro maiores mesmo com menores volumes exportados. A estratégia de diversificação também inclui expansão em mercados emergentes na Ásia e no Oriente Médio, regiões que vêm ampliando o consumo de cafés especiais.
Empresas do setor destacam que a resiliência do Brasil decorre de sua liderança mundial na produção e qualidade, além da infraestrutura logística que permite redirecionar fluxos rapidamente para novos compradores.
O papel da Alemanha e o fortalecimento europeu
A Alemanha consolidou-se como o grande hub global do café brasileiro. Com sua indústria de torrefação e reexportação, o país funciona como porta de entrada para os grãos brasileiros no continente. O crescimento das importações alemãs ocorre em um momento em que o consumo europeu se mantém estável, mas a demanda por cafés premium aumenta.
Esse movimento reforça a posição do Brasil como principal fornecedor mundial e confirma o poder de adaptação do setor diante de choques externos. Especialistas avaliam que o redirecionamento para a Europa pode se tornar estratégia permanente, reduzindo a dependência do mercado norte-americano e fortalecendo as relações comerciais com o bloco europeu.
Um reposicionamento geopolítico do café
A nova rota do café brasileiro é mais do que um ajuste comercial: representa uma mudança geopolítica relevante. A decisão de Trump reacendeu debates sobre protecionismo e competitividade global, mas acabou estimulando o Brasil a diversificar seus parceiros e fortalecer laços comerciais com países europeus e asiáticos.
Com a expansão do mercado na Alemanha, Itália e Japão, o café brasileiro reforça sua presença em economias com maior estabilidade cambial e logística mais previsível. A médio prazo, esse reposicionamento pode gerar ganhos de eficiência e maior previsibilidade para produtores e exportadores nacionais.
Perspectivas para o setor cafeeiro em 2026
Para 2026, a expectativa é de que o Brasil mantenha o protagonismo mundial na exportação de café, mesmo diante de novos desafios comerciais. A aposta está na consolidação da Europa como principal destino, no crescimento de mercados alternativos na Ásia e no fortalecimento de programas de sustentabilidade e certificação que aumentam o valor agregado do produto.
O setor também projeta uma safra mais equilibrada após oscilações climáticas recentes, o que deve ampliar a oferta e permitir que o país mantenha competitividade global, independentemente das tarifas impostas por Washington.
Enquanto os EUA enfrentam retração nas importações, o Brasil segue mostrando ao mundo sua capacidade de adaptação — e o tarifaço de Trump pode, paradoxalmente, ter acelerado uma transformação positiva no comércio internacional do café.






