Dólar ultrapassa R$ 6,00 e pressiona mercado com escalada da guerra comercial entre EUA e China
Instabilidade cambial e tensões geopolíticas agravam cenário de risco global, exigindo atenção redobrada de investidores e autoridades monetárias
O dólar ultrapassou os R$ 6,00 nesta quarta-feira (9), atingindo o maior nível em mais de dois meses e reforçando o clima de aversão ao risco nos mercados financeiros. O avanço da moeda norte-americana ocorre em meio ao agravamento das tensões comerciais entre Estados Unidos e China, após a retaliação oficial de Pequim às recentes tarifas impostas pela Casa Branca.
Às 9h04, o dólar à vista subia 0,7%, cotado a R$ 6,0402, enquanto o contrato futuro de dólar com vencimento mais próximo avançava 0,51%, para R$ 6,067. O movimento representa uma continuação da tendência observada na véspera, quando a moeda americana subiu 1,49%, encerrando o dia a R$ 5,9985 — o maior fechamento desde 21 de janeiro de 2025.
Neste cenário de estresse cambial, o Banco Central do Brasil anunciou a realização de um leilão de até 20.000 contratos de swap cambial tradicional, com o objetivo de rolar os vencimentos de 2 de maio de 2025. A medida visa conter a volatilidade do câmbio e oferecer proteção cambial aos agentes econômicos diante do aumento do risco global.
Dólar acima de R$ 6: o que está por trás da valorização?
A valorização do dólar frente ao real nesta quarta-feira reflete, em grande parte, o ambiente de crescente tensão comercial entre as duas maiores economias do mundo. A administração do presidente Donald Trump colocou em vigor um novo pacote de tarifas sobre produtos chineses, como parte de sua estratégia de pressão econômica. Em resposta, o governo chinês anunciou medidas de retaliação, reacendendo temores de uma nova guerra comercial prolongada.
Este ambiente de incerteza internacional gera uma reação clássica nos mercados globais: os investidores se deslocam para ativos considerados mais seguros, como dólar, ouro e títulos do Tesouro norte-americano (Treasuries). O resultado é a fuga de capitais de mercados emergentes, como o Brasil, que sofrem com a saída de recursos e a consequente desvalorização de suas moedas.
Além disso, o fortalecimento global do dólar é alimentado pela perspectiva de manutenção dos juros altos nos EUA, conforme sinalizações recentes do Federal Reserve, que continuam a priorizar o controle da inflação no país.
Impactos diretos no Brasil: inflação, juros e crescimento
A alta do dólar tem impactos profundos na economia brasileira. O principal deles é a pressão inflacionária, especialmente sobre os preços dos combustíveis, alimentos e produtos importados. Com a moeda americana acima de R$ 6,00, o custo de insumos importados sobe, elevando os custos de produção e encarecendo bens finais no varejo.
Esse cenário dificulta a atuação do Banco Central do Brasil, que se vê diante de um dilema: continuar o ciclo de cortes na taxa Selic para estimular a atividade econômica ou interromper o afrouxamento monetário para conter os efeitos da desvalorização cambial sobre a inflação.
Os efeitos sobre o crescimento também são negativos. O real desvalorizado reduz o poder de compra da população, afeta o consumo interno e restringe o investimento, uma vez que o custo de financiamento externo aumenta e os investidores estrangeiros se tornam mais cautelosos.
O papel do Banco Central e os instrumentos de defesa cambial
A realização de leilões de swap cambial tradicional, como o anunciado nesta quarta-feira, é uma das ferramentas utilizadas pelo Banco Central para suavizar movimentos excessivos do câmbio. Esses instrumentos funcionam como uma proteção para empresas e investidores expostos à variação do dólar, ao oferecer contratos que simulam a venda da moeda no mercado futuro.
O leilão de até 20 mil contratos anunciado para hoje corresponde a uma tentativa de manter a liquidez do mercado e limitar movimentos especulativos. O BC busca transmitir a mensagem de que possui instrumentos e reservas suficientes para conter oscilações abruptas e manter o mercado funcional.
Vale destacar que o Brasil possui um robusto volume de reservas internacionais, superiores a US$ 340 bilhões, o que confere à autoridade monetária margem para atuação pontual em momentos de estresse.
Guerra comercial: riscos globais e efeitos colaterais
A nova rodada de confrontos tarifários entre EUA e China levanta preocupações não apenas no Brasil, mas em toda a economia global. O acirramento da guerra comercial entre as duas maiores potências afeta o comércio internacional, reduz a confiança de empresários e consumidores e pode resultar em desaceleração do crescimento global.
A expectativa de uma redução nas exportações chinesas, combinada com a elevação de custos nos Estados Unidos, tende a afetar diretamente os preços de commodities e insumos industriais — o que pode atingir países como o Brasil, cujas economias são fortemente dependentes da exportação de matérias-primas.
Além disso, a deterioração do ambiente geopolítico prejudica o apetite por risco e afasta investimentos de países emergentes. Com menos entrada de capital externo, as moedas desses países se desvalorizam, criando um efeito de retroalimentação da instabilidade cambial.
Perspectivas para o câmbio e o cenário econômico brasileiro
Analistas já revisam suas projeções para o câmbio no curto e médio prazo. Com a cotação atual do dólar acima de R$ 6,00, parte do mercado começa a precificar a possibilidade de novas intervenções do Banco Central ou até de alterações na política monetária.
Há também quem preveja uma possível revisão da meta de inflação pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), caso o choque cambial provoque efeitos de segunda ordem mais prolongados. A continuidade das tensões entre EUA e China será um fator determinante para definir a trajetória do dólar nas próximas semanas.
Enquanto isso, o mercado observa de perto o comportamento das curvas de juros futuros, que já apresentam inclinação ascendente, indicando a expectativa de pressão inflacionária e juros mais altos à frente. O cenário é de incerteza elevada, e exige prudência por parte de empresas, consumidores e formuladores de política econômica.
Dólar a R$ 6,00 é sinal de alerta para o Brasil e o mundo
A disparada do dólar para acima de R$ 6,00 em 2025, impulsionada pelas novas disputas comerciais entre os Estados Unidos e a China, representa muito mais do que um evento pontual. Trata-se de um sinal de alerta para os riscos que rondam a economia global e para a vulnerabilidade de mercados emergentes como o Brasil frente aos choques externos.
Neste ambiente desafiador, o papel das autoridades monetárias e fiscais será crucial para preservar a estabilidade macroeconômica, conter a inflação e manter a confiança dos investidores. O momento exige coordenação entre política monetária, cambial e fiscal, além de agilidade na resposta aos eventos que continuam se desdobrando no cenário internacional.
A cotação da moeda americana será, nos próximos meses, um termômetro não apenas da percepção de risco em relação ao Brasil, mas também da capacidade do país de atravessar mais uma tempestade global sem comprometer sua recuperação econômica.