PL da Dosimetria: acordo entre Poderes redefine cenário político e reacende debate sobre penas dos golpistas
O avanço do PL da Dosimetria na Câmara dos Deputados expõe um arranjo político que vinha sendo costurado silenciosamente entre líderes do Legislativo e ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). A articulação, que envolveu o presidente da Câmara, Hugo Motta, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, e os ministros do STF Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, foi determinante para que o projeto, que altera parâmetros de cálculo de penas para condenados por participação na trama golpista, fosse votado sem alterações no plenário.
A consolidação desse entendimento influencia diretamente o debate sobre responsabilização e abre nova etapa na discussão nacional sobre os desdobramentos jurídicos da tentativa de golpe. O PL da Dosimetria se tornou o eixo central das disputas entre governo, oposição e Judiciário, ocupando espaço decisivo nas negociações políticas em Brasília.
Bastidores de um acordo que mudou a rota da votação
As conversas sobre o PL da Dosimetria estavam em curso havia semanas, marcadas por encontros reservados entre parlamentares e ministros do STF. No centro da articulação estava a busca por um texto que não abrisse brechas para questionamentos jurídicos nem alterasse substancialmente decisões já proferidas pela Corte.
O relator, deputado Paulinho da Força, já havia sinalizado publicamente a existência de tratativas. O ponto decisivo, contudo, veio com a condição imposta pela oposição: não haveria tentativas de alterar o texto durante a votação. O objetivo era evitar que qualquer mudança pudesse fragilizar judicialmente o projeto ou influenciar sentenças já estabelecidas.
A oposição também buscava preservar o discurso de defesa de condenados, mas sem se comprometer com uma reabertura do debate sobre anistia geral. Essa engenharia produziu o ambiente político necessário para que o PL da Dosimetria avançasse sem resistência significativa.
O papel estratégico da oposição na aprovação
O acordo teve como elemento-chave a atuação dos parlamentares que defendem a anistia irrestrita. Eles aceitaram não propor alterações desde que fosse garantido que o texto não enfraqueceria decisões da Suprema Corte. O entendimento foi visto como uma forma de encerrar a disputa política, ao menos no curto prazo, e de permitir que o Congresso enviasse uma resposta institucional ao tema.
Apesar de membros da oposição terem interesse direto na redução de penas de apoiadores envolvidos no 8 de Janeiro, líderes partidários avaliaram que qualquer mudança brusca no PL da Dosimetria poderia reacender tensões entre os Poderes, especialmente com o STF. A estratégia, portanto, foi a de consolidar um texto negociado e evitar ruídos no processo legislativo.
Impacto sobre a pena de Bolsonaro e o cálculo político do Congresso
Nos bastidores, avaliou-se que o PL da Dosimetria não teria impacto expressivo sobre a pena imposta ao ex-presidente Jair Bolsonaro, condenado a 27 anos no julgamento dos golpistas. A leitura compartilhada entre articuladores era a de que eventuais reduções seriam marginais e não alterariam substancialmente o cenário jurídico do ex-presidente.
Essa avaliação contribuiu para que o projeto fosse aceito sem maiores resistências. Parlamentares da base de Bolsonaro queriam demonstrar mobilização política, mas sem criar risco jurídico que pudesse levar a novas contestações. Ao mesmo tempo, líderes governistas preferiram evitar confrontos diretos, cientes de que o governo Lula não estava conduzindo o processo de perto.
Silêncio estratégico do governo Lula e tentativa de ganhar tempo
O Palácio do Planalto — ausente das negociações principais — observou a movimentação com cautela. O governo evitou entrar frontalmente na articulação do PL da Dosimetria, apostando em uma estratégia de respiro político. A leitura interna é de que o tema poderia gerar desgaste tanto com grupos ligados ao Judiciário quanto com parte da base governista.
Com a aprovação na Câmara, assessores próximos ao governo se mobilizaram para sugerir ajustes no Senado. A expectativa é que mudanças pontuais possam impedir interpretações que favoreçam organizadores dos atos golpistas. Ao mesmo tempo, o Executivo convocou manifestações públicas contra a anistia aos golpistas, buscando reforçar posição política sem interferir diretamente na tramitação do projeto.
O caminho do PL da Dosimetria no Senado
Com o envio do PL da Dosimetria à Comissão de Constituição e Justiça do Senado (CCJ), onde Alcolumbre tem forte influência, a análise tende a ser rápida. A expectativa inicial era votar o projeto já na semana seguinte à aprovação na Câmara.
Senadores avaliam que o texto, que estabelece novos critérios de dosimetria das penas, não deve sofrer alterações profundas. A intenção de Alcolumbre é manter o acordo estabelecido com o STF e com líderes da Câmara, evitando desgaste institucional.
Essa postura indica que o Senado deverá atuar como ratificador político do projeto, sem entrar nas disputas internas que marcaram a primeira etapa da tramitação.
A lógica por trás do PL da Dosimetria
O PL da Dosimetria estabelece parâmetros objetivos para cálculo das penas aplicadas a réus condenados por crimes relacionados à tentativa de golpe. A proposta busca organizar juridicamente fatores agravantes e atenuantes, trazendo previsibilidade e uniformidade para futuras sentenças.
Para ministros do STF envolvidos nas negociações, a padronização reduz margem para questionamentos e fortalece o entendimento judicial. Ao mesmo tempo, oferece ao Congresso a possibilidade de exercer protagonismo no tema, já que a reação inicial às condenações deixou parte dos parlamentares desconfortáveis com o volume de punições.
O projeto, portanto, funciona como ponto de equilíbrio entre as instituições, ao permitir que o Legislativo participe do debate sobre responsabilização sem desautorizar decisões do Judiciário.
A anistia como pano de fundo
Embora não trate diretamente de anistia, o PL da Dosimetria esbarra em um tema altamente sensível no debate público. O governo tenta evitar que a discussão se transforme em revisão das condenações, enquanto a oposição busca espaço para recuar sem parecer derrotada.
A manifestação convocada para o dia 14, contra a anistia aos golpistas, é parte dessa disputa. Para o governo, trata-se de reposicionar o tema na agenda pública e criar condições favoráveis para futuras negociações no Senado.
Acordo reforça papel político do STF
O protagonismo de Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes nas articulações consolida a influência crescente do STF no processo político. Ao participar das discussões do PL da Dosimetria, os ministros reforçam a importância de evitar decisões que fragilizem julgamentos já proferidos pela Corte.
Essa aproximação entre Judiciário e Legislativo não é inédita, mas adquire novo peso no contexto pós-8 de Janeiro. O acordo indica que a Suprema Corte segue atuando como protagonista na estabilização institucional.
Efeitos sobre a disputa pela anistia ampla
Com a aprovação do PL da Dosimetria, deputados e senadores que defendem a anistia ampla perdem parte de sua força argumentativa. O projeto funciona como resposta legislativa ao tema, reduzindo espaço para narrativas de perseguição política.
Parlamentares avaliam que, nos próximos meses, o debate sobre anistia deve perder intensidade, enquanto a atenção se desloca para os efeitos práticos do novo modelo de dosimetria.
Perspectivas para o cenário político
O avanço do PL da Dosimetria inaugura nova fase na relação entre Congresso e STF. O acordo estabelecido redefine limites, cria precedentes e sinaliza o tipo de articulação que poderá se repetir em outros temas sensíveis.
Para a oposição, o texto aprovado representa a oportunidade de reapresentar o discurso de defesa sem confrontar a Justiça. Para o governo, significa a chance de recalibrar sua postura institucional. Para o Judiciário, a consolidação de decisões já tomadas.
Nos próximos meses, o desfecho no Senado e eventuais judicializações deverão indicar até onde vai a influência desse acordo político.






