Fintechs e Receita Federal: nova norma equipara obrigações às de bancos para combater crimes financeiros
A Receita Federal publicou nesta sexta-feira (29) a Instrução Normativa RFB nº 2.278/25, que passa a incluir as fintechs e instituições de pagamento no mesmo conjunto de regras aplicadas a bancos e instituições financeiras tradicionais. A medida busca fechar lacunas regulatórias que vinham sendo utilizadas por organizações criminosas para lavar dinheiro e ocultar patrimônio.
Com a decisão, as fintechs e Receita Federal entram em sintonia: empresas do setor ficam obrigadas a enviar a e-Financeira, declaração periódica que detalha operações financeiras de alto valor, ampliando a rastreabilidade de transações suspeitas. Até então, apenas bancos e corretoras estavam sujeitos a esse nível de fiscalização.
Contexto da mudança regulatória
A publicação da norma ocorreu um dia após a deflagração de uma megaoperação que revelou um esquema de lavagem de dinheiro e sonegação de impostos envolvendo o Primeiro Comando da Capital (PCC). Segundo as investigações, o grupo criminoso movimentou cerca de R$ 46 bilhões entre 2020 e 2024 utilizando fundos de investimento e fintechs, que funcionavam como canais alternativos para transações de difícil rastreamento.
Diante desse cenário, a Receita entendeu que havia um “vácuo regulatório”, já que as fintechs não estavam obrigadas às mesmas exigências de transparência e fiscalização que os bancos. O objetivo da nova instrução é reduzir riscos de utilização indevida das plataformas digitais no sistema financeiro nacional.
O que muda para fintechs a partir da norma
A partir da publicação da Instrução Normativa, as fintechs e Receita Federal passam a ter uma relação mais próxima, com a obrigatoriedade de fornecer informações detalhadas sobre operações de seus clientes. As principais mudanças são:
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Entrega da e-Financeira: declaração que reúne dados de operações financeiras acima de determinado valor, permitindo rastreamento pela Receita Federal.
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Equiparação regulatória: fintechs passam a responder pelas mesmas responsabilidades de bancos e corretoras.
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Combate a crimes financeiros: maior facilidade para identificar indícios de lavagem de dinheiro, ocultação de bens e movimentações atípicas.
De acordo com o Ministério da Fazenda, o texto da instrução normativa foi elaborado de forma objetiva, com apenas quatro artigos, justamente para evitar interpretações equivocadas e a propagação de notícias falsas que possam gerar insegurança no setor.
Fintechs e Receita Federal: impacto no setor de tecnologia financeira
A decisão da Receita Federal representa um marco para o mercado de tecnologia financeira no Brasil. Até então, muitas empresas atuavam em um ambiente de menor regulação, o que facilitava inovação e acesso a serviços bancários digitais, mas também abria espaço para práticas criminosas.
Agora, com a inclusão das fintechs nas mesmas normas dos bancos, há um duplo efeito: de um lado, maior segurança jurídica e reputacional; de outro, o aumento de custos operacionais e de compliance, já que será necessário ampliar sistemas internos de controle e monitoramento de transações.
Especialistas afirmam que, apesar do impacto inicial, a equiparação regulatória pode trazer benefícios de médio e longo prazo, como mais confiança dos investidores, estabilidade no setor e maior credibilidade junto ao mercado internacional.
Relação com a Lei do Sistema de Pagamentos Brasileiros
O texto da instrução normativa faz referência à Lei do Sistema de Pagamentos Brasileiros, que estabelece diretrizes para o funcionamento de instituições de pagamento e serviços eletrônicos. A menção tem como objetivo evitar novas distorções e interpretações equivocadas, como as que ocorreram no início do ano, quando circulou desinformação sobre a possibilidade de o governo bloquear ou confiscar contas digitais.
A Receita reforçou que a norma é apenas um ajuste regulatório para garantir maior transparência e não interfere na autonomia dos usuários nem nos serviços oferecidos pelas plataformas digitais.
Fintechs e o combate ao crime organizado
Nos últimos anos, operações policiais revelaram como grupos criminosos têm explorado lacunas regulatórias em diferentes setores da economia. No caso das fintechs e Receita Federal, a nova norma é vista como uma resposta imediata à descoberta de que criminosos usavam plataformas digitais para movimentar bilhões de reais de origem ilícita.
A Receita destacou que as fintechs passaram a aparecer com frequência em investigações contra o crime organizado justamente pela ausência de regras equivalentes às aplicadas aos bancos. A expectativa é que, com a nova instrução normativa, seja possível interromper esses fluxos e garantir maior integridade ao sistema financeiro.
Reação do setor e perspectivas
Representantes de fintechs avaliam que a medida aumenta a responsabilidade das empresas, mas também legitima sua posição dentro do mercado financeiro. Para especialistas, a formalização dessa obrigação traz uma “maturidade regulatória” ao setor, aproximando-o de mercados mais consolidados, como o europeu e o norte-americano.
No curto prazo, companhias terão de adaptar seus sistemas para cumprir as novas exigências, o que pode exigir investimentos em tecnologia e contratação de equipes especializadas em compliance. No entanto, a tendência é que essa adequação fortaleça a confiança dos consumidores e investidores.
Papel estratégico da Receita Federal
A publicação da Instrução Normativa RFB nº 2.278/25 mostra o esforço da Receita em se antecipar ao crime organizado, criando barreiras regulatórias que reduzam vulnerabilidades no sistema financeiro. Para a instituição, a parceria entre fintechs e Receita Federal será fundamental para impedir que plataformas digitais se tornem instrumentos de lavagem de dinheiro em grande escala.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, reforçou que o texto foi elaborado em linguagem simples e direta justamente para garantir clareza e reduzir riscos de desinformação. Segundo ele, o objetivo é assegurar que a norma seja cumprida sem ambiguidades e com plena cooperação do setor.
A inclusão das fintechs e Receita Federal nas mesmas regras dos bancos representa uma mudança significativa no arcabouço regulatório brasileiro. Ao mesmo tempo em que amplia a proteção contra crimes financeiros, também desafia as empresas do setor a se adaptarem a um novo patamar de exigências. O movimento, porém, tende a consolidar a credibilidade das fintechs como protagonistas do sistema financeiro digital no país.






