Cesta básica recua em capitais e dá alívio pontual ao orçamento das famílias
Depois de meses marcados pela pressão inflacionária, especialmente em setembro, os preços da cesta básica começaram a mostrar sinais de alívio em outubro em boa parte do país. Levantamento da Cesta de Consumo Neogrid em parceria com o FGV/IBRE indica que cinco das oito capitais monitoradas registraram queda no custo médio dos itens essenciais, abrindo uma breve janela de fôlego para o consumidor em meio a um cenário ainda desafiador para o poder de compra.
Curitiba, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Salvador e Brasília apresentaram recuo nos preços da cesta básica, com destaque para a capital paranaense, que registrou redução de 1,73% no custo médio. São Paulo ficou estável no mês, mas segue liderando a maior retração no acumulado de seis meses, com queda de 5,17%. Na outra ponta, Fortaleza teve ligeira alta de 0,11%, enquanto Manaus destoou do conjunto ao avançar 0,30% em outubro e acumular expressivo aumento de 12,20% em meio ano.
Esse quadro reforça que a cesta básica dá um alívio parcial ao orçamento em várias regiões, mas mantém focos de pressão relevantes, principalmente em mercados mais sensíveis a choques de oferta, custos logísticos e oscilações cambiais.
Capitais registram queda, mas movimento ainda é concentrado
A fotografia de outubro mostra que o recuo da cesta básica se espalhou por diferentes regiões, mas ainda sem um movimento nacional homogêneo. Em Curitiba, a redução de 1,73% reflete uma combinação de fatores que vão desde a normalização de oferta de determinados alimentos até a desaceleração pontual de itens impactados por safras mais favoráveis. Em Belo Horizonte, a queda de 1,12% também aponta para alívio no curto prazo, especialmente em produtos de consumo diário das famílias.
No Rio de Janeiro, o recuo de 1,14% na cesta básica vem após um período de forte pressão, marcado por oscilações nos preços de proteínas e derivados de grãos. Salvador, com queda de 0,92%, e Brasília, com recuo de 0,57%, completam o grupo de capitais em que o consumidor encontrou uma realidade ligeiramente menos pesada nas prateleiras dos supermercados.
Já São Paulo, principal mercado consumidor do país, teve estabilidade nos preços em outubro, mas acumula a maior retração semestral. A queda de 5,17% no período mostra que, apesar da volatilidade, houve algum ajuste na cesta básica paulista, beneficiando famílias que já vinham comprimindo consumo para caber no orçamento.
Manaus acende alerta com alta acumulada de mais de 12% em seis meses
Se o alívio pontual da cesta básica aparece em boa parte das capitais, Manaus segue em trajetória oposta. A alta de 0,30% em outubro pode parecer modesta à primeira vista, mas, somada ao acumulado de 12,20% em seis meses, revela um movimento de pressão persistente sobre o custo dos itens essenciais na capital amazonense.
Esse comportamento da cesta básica na região está associado a um conjunto de fatores estruturais. A distância em relação aos grandes centros produtores, a dependência maior de logística rodoviária e fluvial, os custos de transporte e armazenagem e a sensibilidade a variações cambiais ajudam a explicar por que choques de preços tendem a ser mais duradouros e intensos em Manaus.
Em paralelo, a renda média das famílias locais e o nível de informalidade no mercado de trabalho ampliam o impacto da alta de preços sobre o consumo diário. Quando a cesta básica sobe nesse ritmo, a tendência é que o consumidor substitua marcas, reduza volumes comprados e postergue o consumo de determinados itens, o que afeta não só a qualidade da alimentação, mas também o desempenho do comércio.
Processados e derivados de grãos seguem como vilões da cesta básica
Os dados da Cesta de Consumo Neogrid mostram que os maiores responsáveis pela pressão no semestre foram os produtos processados e os derivados de grãos. Margarina, óleo de soja, fubá e café estão entre os itens que mais subiram, em função de um conjunto de fatores: repasses de custos de insumos, energia e embalagens, além de impactos climáticos em safras e da valorização do dólar.
Essa composição ajuda a entender por que, mesmo com algum alívio em outubro, a cesta básica ainda é percebida como cara pelo consumidor. Processados e derivados representam uma fatia relevante do consumo cotidiano, especialmente em famílias que, pela falta de tempo e renda, recorrem com frequência a produtos prontos ou de preparo rápido. Qualquer ajuste de preços nesses itens é sentido imediatamente na ida ao supermercado.
O comportamento de commodities agrícolas, como soja e milho, também influencia diretamente esse segmento da cesta básica. Oscilações em mercados internacionais, aumento de custos logísticos e problemas climáticos locais podem rapidamente se traduzir em reajustes de margarina, óleo e fubá, comprimindo margens da indústria e pressionando o consumidor na ponta.
Itens essenciais ajudam a segurar a inflação da cesta básica
Por outro lado, produtos tradicionais da cesta básica como arroz, ovos, leite e feijão colaboraram para conter a inflação média em capitais como São Paulo, Brasília e Salvador. A queda desses itens reforça o papel da oferta agrícola e da sazonalidade na formação de preços, além de dialogar com políticas de abastecimento, estoques reguladores e dinâmica de importações.
Quando arroz e feijão recuam, a sensação de alívio é imediata, porque esses produtos compõem o núcleo mais simbólico da cesta básica brasileira. O mesmo vale para leite e ovos, fundamentais para a alimentação de crianças, idosos e famílias com menor renda. A queda nesses itens abre um espaço limitado, mas relevante, para que o consumidor reorganize o orçamento, podendo reverter parte de cortes que vinha fazendo em qualidade e quantidade de alimentos.
Ainda assim, o quadro não é de euforia. A cesta básica segue pressionada em segmentos específicos, e a volatilidade recente mostra que qualquer choque de oferta – seja climático, logístico ou cambial – pode reverter rapidamente os ganhos pontuais registrados em outubro.
Cesta ampliada mostra comportamento misto entre higiene, limpeza e alimentação
Quando se amplia a lente e se observa a chamada cesta ampliada – que reúne alimentação, higiene e limpeza –, o cenário é mais heterogêneo. Em algumas capitais, como Curitiba e Salvador, foram registradas quedas no custo total desse conjunto de produtos. Em outras, como Manaus e Belo Horizonte, prevaleceram aumentos.
Esse comportamento misto indica que, embora a cesta básica alimentar tenha apresentado algum alívio, o orçamento das famílias continua pressionado por itens de higiene pessoal e limpeza doméstica, que são indispensáveis no dia a dia. Produtos como detergentes, sabão em pó, desinfetantes, sabonetes e absorventes estão diretamente ligados a custos industriais e de logística, muitas vezes mais sensíveis a energia, embalagens e variações cambiais.
Na prática, isso significa que o alívio percebido na cesta básica de alimentos pode ser parcialmente neutralizado por aumentos em outras frentes de consumo essencial, mantendo a sensação de orçamento apertado. Em um cenário em que as famílias já vinham ajustando hábitos de compra, a tendência é favorecer marcas próprias, embalagens maiores e busca por promoções.
Pressão inflacionária perde força, mas não desaparece do radar
O comportamento da cesta básica em outubro se insere em um quadro mais amplo de desaceleração gradual da inflação, após meses de forte pressão sobre alimentos. Em setembro, o avanço dos preços havia acendido o sinal amarelo, sobretudo em capitais com maior peso na formação dos índices nacionais. O recuo parcial no mês seguinte funciona como uma trégua, mas não como garantia de estabilidade duradoura.
Fatores estruturais seguem no radar: eventos climáticos extremos, como secas e enchentes, interferem diretamente na produção e na logística; a volatilidade do câmbio impacta custos de insumos e de produtos importados; e a demanda interna, embora ainda afetada por perda de renda em alguns segmentos, responde a estímulos pontuais, como programas de transferência de renda e reajustes salariais.
Com isso, a cesta básica permanece como um dos componentes mais sensíveis da cesta de consumo das famílias, tanto para medir o impacto da inflação quanto para balizar discussões sobre políticas públicas, salário mínimo, auxílio a populações vulneráveis e segurança alimentar.
Impacto da cesta básica no orçamento e no consumo das famílias
Em um cenário de renda ainda pressionada, a cesta básica ocupa uma fatia significativa do orçamento das famílias brasileiras, especialmente nas classes C, D e E. Quando os preços sobem, o consumidor é obrigado a fazer escolhas difíceis: reduzir a compra de proteínas, substituir marcas tradicionais por alternativas mais baratas, cortar itens considerados supérfluos e priorizar apenas o estritamente necessário.
O recuo em outubro, ainda que pontual, permite um pequeno rearranjo do orçamento, abrindo espaço para recompor parte do consumo represado. Algumas famílias conseguem incluir novamente frutas, legumes ou proteínas que haviam sido cortadas, enquanto outras aproveitam para pagar dívidas ou antecipar despesas de fim de ano, como material escolar e compromissos de início de 2026.
Do ponto de vista do comércio, a leve melhora nos preços da cesta básica pode estimular aumento de fluxo em supermercados e atacarejos, sobretudo nas regiões que registraram quedas mais consistentes. No entanto, varejistas seguem cautelosos, cientes de que a sensibilidade do consumidor a preços permanece elevada e de que o menor espaço para repasses limita margens de lucro.
Diferenças regionais reforçam desafios para a política econômica
As diferenças entre capitais mostram que a evolução da cesta básica não é uniforme no país. Enquanto São Paulo apresenta queda acumulada relevante no semestre, Manaus convive com alta de dois dígitos. Entre essas pontas, capitais como Fortaleza, Brasília, Salvador, Rio de Janeiro, Curitiba e Belo Horizonte oscilam entre recuos moderados, estabilidade e leves altas.
Essa diversidade reforça o desafio para a formulação de políticas econômicas e sociais. Medidas nacionais de combate à inflação e de estímulo à renda precisam levar em conta realidades regionais muito distintas. Em alguns casos, ações específicas de logística, infraestrutura ou apoio à produção local podem ser tão importantes quanto instrumentos tradicionais de política monetária.
No contexto da cesta básica, isso passa por temas como melhoria de estradas, ampliação de armazéns, incentivo à agricultura familiar, fortalecimento de estoques reguladores e redução de gargalos em cadeias logísticas. A busca por maior previsibilidade ajuda tanto produtores quanto consumidores, reduzindo a frequência de choques de oferta e suavizando a volatilidade de preços.
Perspectivas para os próximos meses: trégua ou alívio passageiro?
A grande questão, para o consumidor e para o mercado, é saber se o recuo da cesta básica em outubro representa o início de uma tendência de acomodação de preços ou apenas um alívio passageiro após forte pressão inflacionária. A resposta depende de variáveis internas e externas.
No front doméstico, a evolução das safras, a regularidade do abastecimento, o comportamento da demanda e a condução da política econômica serão determinantes. No contexto internacional, preços de commodities, logística global e dinâmica cambial seguem como fatores de alto impacto.
Se as condições climáticas forem favoráveis, a produção mantiver ritmo consistente e o câmbio permanecer relativamente estável, há espaço para que a cesta básica siga em trajetória de acomodação em boa parte do país. Por outro lado, novos choques de oferta ou eventos extremos podem rapidamente recolocar a alimentação no centro da preocupação inflacionária.
Independentemente do cenário, a leitura dos dados de outubro mostra que o tema permanece central no debate econômico. A cesta básica continua sendo um dos indicadores mais diretos da percepção de bem-estar das famílias, da eficácia de políticas públicas e da capacidade da economia de garantir acesso a alimentos essenciais a preços compatíveis com a renda do trabalhador.






