Pizzaria, imobiliária e advogados lavavam propina de ex-chefe do INSS, diz PF
A mais recente operação da Polícia Federal expôs um esquema sofisticado de corrupção que teria funcionado dentro do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) por anos e envolveu empresas de fachada, escritórios de advocacia, alianças políticas e uma estrutura paralela criada para dar aparência de legalidade a pagamentos ilícitos. O alvo central da investigação é o ex-presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, preso pelos agentes nesta quinta-feira (13), suspeito de receber mensalmente valores que chegavam a R$ 250 mil.
O caso ganhou proporções nacionais porque não trata apenas de enriquecimento ilícito, mas de um mecanismo que, segundo os investigadores, comprometeu a integridade de serviços públicos essenciais e alimentou uma fraude que lesou milhões de brasileiros. O esquema teria sido operado pela Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer), que firmou acordo técnico com o INSS para atendimento de segurados, mas desviou a estrutura para fins ilícitos.
A PF identificou quatro empresas que teriam sido usadas para lavar a propina INSS: uma pizzaria, uma imobiliária e dois escritórios de advocacia. Apesar de atuarem em setores totalmente distintos, todas teriam uma característica em comum: operar como instrumentos para dissimular pagamentos que, na prática, tinham como destino o ex-presidente da autarquia.
Como funcionava o esquema de propina INSS
As investigações mostram que a operação criminosa começou a ser montada anos antes de Stefanutto chegar à presidência do INSS. Inicialmente, ele teria atuado como procurador-geral da autarquia e, segundo a PF, teria sido decisivo para a assinatura do acordo de cooperação técnica com a Conafer, marco que abriu as portas para acesso a dados, sistemas e processos internos do órgão.
Com a fragilidade institucional criada pelo acordo, a Conafer expandiu a atuação nas pontas do atendimento, oferecendo ao público serviços que, na prática, jamais deveriam ser terceirizados. Esse arranjo teria permitido o nascimento da fraude em massa que, de acordo com a PF, movimentou R$ 708 milhões em receitas ilícitas e atingiu mais de 600 mil segurados.
Dentro dessa engrenagem, Stefanutto teria passado a receber pagamentos mensais que, quando assumiu a presidência do INSS em 2023, teriam escalado até atingir R$ 250 mil por mês. Esse valor faria dele um dos pilares do esquema, com a função de assegurar que a fraude continuasse sem ser interrompida pelos órgãos de controle internos.
Os investigadores reforçam que o sucesso da operação criminosa dependia do apoio de altos gestores do INSS, o que teria permitido o avanço das irregularidades sem interrupção, apesar das milhares de reclamações administrativas e judiciais apresentadas por beneficiários lesados.
As empresas usadas para lavar dinheiro da propina INSS
Uma das características marcantes do esquema seria a tentativa de dar aparência de legalidade a pagamentos ilícitos. Para isso, quatro empresas foram apontadas pelos investigadores como parte do fluxo de lavagem de dinheiro. São elas:
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Stelo Advogados e Associados
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Delícia Italiana Pizzas Ltda
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Moinho Imobiliária Ltda
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Sanchez Salvadore Sociedade de Advogados
A escolha de empresas de setores diferentes não é casual. Para a PF, essa diversidade tinha como objetivo diluir rastros, criando uma cadeia mais complexa que dificultasse o rastreamento dos valores. Escritórios de advocacia são frequentemente usados em esquemas semelhantes pela natureza sigilosa das operações. Já a pizzaria e a imobiliária funcionariam como negócios de fachada para movimentar recursos sem levantar suspeita imediata.
A partir do cruzamento de dados financeiros, fiscais e transacionais, a PF identificou repasses recorrentes, pagamentos sem justificativa comercial plausível e indícios de prestação de serviços simulada — elementos considerados típicos de operações de lavagem de dinheiro.
Como a fraude prejudicou segurados e o sistema do INSS
Um dos aspectos mais graves revelados pela operação é o impacto direto sobre aposentados, trabalhadores rurais e outros segurados que buscavam atendimento junto ao INSS. O acordo firmado entre a autarquia e a Conafer teria dado à entidade acesso a dados sensíveis, processos internos e demandas de segurados vulneráveis.
A partir desse acesso privilegiado, a organização criminosa teria criado um fluxo paralelo de atendimento que desviava benefícios previdenciários, alterava cadastros, interferia no processo decisório e gerava instabilidade no sistema. Em escala nacional, as fraudes teriam criado um rastro de prejuízo para a administração pública e para cidadãos que tiveram benefícios negados ou desviados.
O caso gerou uma onda de ações judiciais e reclamações administrativas, uma vez que muitos segurados passaram anos tentando regularizar sua situação sem sucesso. A PF aponta que, mesmo diante do aumento súbito de queixas, o esquema continuou operando devido ao suposto apoio de autoridades internas do INSS.
A influência política como peça-chave da propina INSS
Outro ponto destacado pela investigação é o papel de Stefanutto dentro da estrutura do governo federal. Sua posição como procurador-geral e, posteriormente, como presidente do INSS, lhe dava capacidade institucional para influenciar processos, intervir em decisões e determinar prioridades administrativas.
De acordo com a PF, essa influência teria sido usada para manter ativa a fraude conduzida pela Conafer e garantir que o acordo de cooperação continuasse em vigência, mesmo diante de evidências crescentes de irregularidades. Com isso, Stefanutto teria se consolidado como uma das engrenagens centrais da organização criminosa.
O suposto recebimento mensal de valores ilícitos reforça a tese de que o esquema buscava blindagem institucional, transformando a alta cúpula da autarquia em instrumento para perpetuação da corrupção.
PF aponta que fraude só continuou graças ao apoio interno
A investigação mostra que, sem o suporte de altos gestores, seria impossível manter por tantos anos uma operação que envolvia:
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Fraude em massa
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Manipulação de processos sensíveis
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R$ 708 milhões em receitas ilícitas
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Mais de 600 mil vítimas em todo o país
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Crescente volume de reclamações e ações judiciais
Segundo a PF, Stefanutto teria atuado precisamente para assegurar que a estrutura interna do INSS permanecesse alinhada aos interesses da Conafer, interferindo na implementação, fiscalização e monitoramento do acordo técnico.
O impacto político e institucional do escândalo da propina INSS
O caso revela uma fragilidade preocupante nas estruturas de controle interno do Estado brasileiro, especialmente quando se trata de autarquias com papel crucial na vida da população, como o INSS. O escândalo ocorre em um momento em que o órgão já enfrentava pressão devido ao acúmulo de processos, lentidão no atendimento e dificuldades estruturais.
O envolvimento de um ex-presidente da autarquia em um esquema dessa magnitude gera desgaste político, aumenta o escrutínio público sobre o governo federal e reacende debates sobre a necessidade de reformas nos mecanismos de auditoria e compliance das entidades públicas.
A repercussão tende a influenciar votações no Congresso, especialmente em temas relacionados à reforma administrativa e à modernização dos sistemas previdenciários. No Judiciário, cresce a preocupação com o impacto da fraude em processos já em curso, muitos deles envolvendo beneficiários rurais — historicamente um dos grupos mais vulneráveis da rede de proteção previdenciária.
O cerco da Polícia Federal e a prisão do ex-presidente do INSS
A prisão de Stefanutto incluiu mandados de busca e apreensão, quebra de sigilo financeiro e apreensão de documentos. A PF avalia que já há robusto conjunto de provas para sustentar a tese de que ele teria atuado como destinatário central da propina INSS.
As investigações seguem em andamento e novas fases da operação não estão descartadas. A tendência, segundo fontes próximas à investigação, é que novas prisões ocorram, especialmente entre operadores financeiros, gestores intermediários e agentes que teriam prestado suporte logístico ao esquema.
O Ministério Público Federal acompanha o caso e deverá denunciar os envolvidos por crimes como:
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Organização criminosa
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Corrupção ativa e passiva
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Peculato
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Lavagem de dinheiro
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Fraude em processos administrativos
A depender da evolução das apurações, novas tipificações poderão surgir.
A repercussão no Congresso e nos órgãos de controle
A prisão do ex-presidente do INSS repercutiu imediatamente no Congresso Nacional, onde parlamentares pressionam por uma reavaliação integral dos acordos firmados pela autarquia nos últimos anos. O clima político é de cobrança por responsabilização, especialmente porque a fraude teria atingido segurados de baixa renda e trabalhadores rurais.
Comissões internas avaliam convocar novos depoimentos e abrir frentes de investigação paralelas para apurar:
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A extensão da fraude
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Responsabilidades políticas
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Riscos de contaminação em outros acordos
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O papel de gestores ainda em atividade
Órgãos de controle como CGU e TCU também acompanham o caso, sobretudo devido ao elevado volume de recursos movimentados e à larga capilaridade da fraude.
O futuro do INSS após o escândalo da propina
O episódio abre caminho para uma possível reestruturação interna do INSS. Especialistas defendem que o modelo de cooperação técnica com entidades externas precisa ser revisto com rigor, sobretudo quando envolve acesso a dados sensíveis.
Entre as medidas consideradas urgentes estão:
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Revisão de todos os acordos ativos
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Criação de unidades independentes de compliance
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Adoção de tecnologia antifraude
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Auditorias automáticas em decisões sensíveis
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Transparência nas relações entre autarquia e associações externas
Para analistas, a reconstrução da confiança pública no INSS passa por ações rápidas, firmes e transparentes.






