Julgamento do Golpe: prazo para novos recursos se encerra e condenação de Bolsonaro se aproxima do desfecho
O Julgamento do Golpe entra, nesta segunda-feira (24), em uma fase decisiva no Supremo Tribunal Federal (STF). Termina hoje o prazo para que as defesas do ex-presidente Jair Bolsonaro e de outros seis condenados apresentem novos embargos de declaração, na tentativa de alterar pontos específicos da decisão que os responsabilizou pela tentativa de golpe de Estado em 2022.
A etapa marca o esgotamento progressivo das possibilidades de questionamento da condenação, ao mesmo tempo em que o quadro jurídico de Bolsonaro se torna mais complexo, já que ele cumpre prisão preventiva determinada pelo ministro Alexandre de Moraes em procedimento paralelo, relacionado à violação de medidas cautelares impostas no próprio Julgamento do Golpe.
Enquanto a estratégia das defesas mira pequenos ajustes na decisão do STF, o entendimento majoritário na Corte é de que a sentença que fixou pena de 27 anos e 3 meses de prisão ao ex-presidente está consolidada. Quando não houver mais espaço para recursos, o processo transitará em julgado e passará à fase de execução da pena, com efeitos diretos sobre o futuro do ex-chefe do Executivo e do núcleo político envolvido na trama golpista.
O que está em jogo nesta segunda-feira no STF
No centro da disputa jurídica está o prazo final para a apresentação de novos embargos de declaração. Esse tipo de recurso é restrito: não reabre o mérito do Julgamento do Golpe, mas busca esclarecer contradições, omissões ou pontos obscuros da decisão colegiada. Em regra, não muda o tempo da pena, embora, em situações específicas, possa gerar ajustes periféricos.
A Primeira Turma do STF já rejeitou uma primeira rodada de embargos de declaração apresentada por Bolsonaro e pelos demais réus. Mesmo assim, o regimento interno admite a apresentação de “segundos embargos”, que precisam se limitar a temas estritamente ligados à decisão já proferida sobre os primeiros. É esse o prazo que se encerra hoje.
Na prática, o Julgamento do Golpe entra em contagem regressiva. A partir do momento em que o STF analisar e rejeitar os novos embargos – cenário considerado provável entre ministros e analistas jurídicos – o processo se aproximará da fase em que não caberão mais questionamentos dentro da própria Corte. Esse momento é conhecido como trânsito em julgado.
Embargos de declaração, embargos infringentes e os limites recursais
A discussão sobre os caminhos recursais no Julgamento do Golpe envolve dois instrumentos principais: embargos de declaração e embargos infringentes.
Os embargos de declaração, que estão em foco nesta segunda-feira, servem para pedir esclarecimentos. As defesas podem alegar que o acórdão deixou de analisar algum argumento relevante, que há trecho contraditório ou ponto considerado obscuro. O STF, então, pode apenas esclarecer o que já decidiu, sem necessariamente reformar o resultado.
Já os embargos infringentes são recursos voltados à tentativa de alterar o conteúdo da condenação, sobretudo em relação ao tempo da pena. Contudo, a jurisprudência consolidada do STF é clara: esse tipo de recurso só é admitido quando o réu obtém, no mínimo, dois votos pela absolvição. No Julgamento do Golpe, isso não ocorreu. A Primeira Turma formou maioria sólida para condenar Bolsonaro e os demais acusados, de forma que, na visão predominante na Corte, não há espaço para embargos infringentes.
Ainda que advogados discutam, em tese, interpretações alternativas para forçar a admissão dos infringentes, o entendimento interno é de que esse caminho está praticamente bloqueado. Na prática, o Julgamento do Golpe caminha para o esgotamento das vias recursais, restringindo-se a ajustes pontuais, sem potencial significativo para reduzir a pena fixada.
Como foi construída a condenação no Julgamento do Golpe
O Julgamento do Golpe tem origem em investigações da Polícia Federal concluídas em novembro de 2024. A apuração se concentrou na tentativa de ruptura institucional após as eleições de 2022, envolvendo articulações para desacreditar o resultado das urnas, pressionar instituições e fomentar um ambiente favorável a um golpe de Estado.
Em fevereiro de 2025, a Procuradoria-Geral da República (PGR) apresentou denúncia contra Jair Bolsonaro e outros envolvidos, apontando a existência de um núcleo central responsável por coordenar e incentivar ações que buscavam impedir a posse e o exercício do mandato pelo vencedor das eleições. A denúncia foi recebida pelo STF, dando origem à ação penal que tramitou entre março e setembro deste ano.
Ao final do Julgamento do Golpe, a Primeira Turma condenou Bolsonaro a 27 anos e 3 meses de prisão, em regime inicial fechado, por tentativa de golpe de Estado e outros crimes correlatos. Seis réus também tiveram penas fixadas, variando entre 2 anos e 27 anos e 3 meses. O tenente-coronel Mauro Cid, que firmou acordo de colaboração premiada, recebeu pena de dois anos em regime aberto e já cumpre a sentença em condições menos gravosas.
O julgamento consolidou a leitura de que houve uma trama articulada, com participação ativa do então presidente da República, de auxiliares próximos e de integrantes das Forças Armadas e de estruturas de governo, com o objetivo de subverter o resultado eleitoral e manter o poder à margem da Constituição.
Prisão preventiva e Julgamento do Golpe: processos que se cruzam
Um ponto central na situação de Bolsonaro é que a prisão preventiva decretada por Alexandre de Moraes não decorre diretamente da condenação no Julgamento do Golpe, mas de um inquérito paralelo que apura o descumprimento de medidas impostas justamente por causa dessa ação penal.
Em maio de 2025, o STF abriu investigação sobre tentativa de interferência no andamento do processo, inicialmente concentrada em atos do deputado Eduardo Bolsonaro contra autoridades brasileiras nos Estados Unidos. Em julho, o nome de Jair Bolsonaro foi incluído no inquérito, e o ministro Alexandre de Moraes impôs uma série de restrições: uso de tornozeleira eletrônica, recolhimento domiciliar noturno e aos fins de semana, proibição de contato com outros investigados, vedação de uso de redes sociais, limitação de aproximação de embaixadas e restrição de contatos com embaixadores e autoridades estrangeiras.
Diante de sucessivos indícios de descumprimento dessas medidas, Moraes determinou a prisão domiciliar em agosto. O quadro se agravou em novembro, quando a tornozeleira eletrônica indicou violação e a Polícia Federal identificou risco de fuga, em meio a convocações de apoiadores para vigília em frente à residência do ex-presidente em Brasília. A análise do STF foi de que o ambiente poderia favorecer desordem, dificultar a fiscalização da prisão domiciliar e até mesmo viabilizar tentativa de evasão.
Com base nesses elementos, foi decretada a prisão preventiva, em unidade da Polícia Federal no Distrito Federal, medida que não tem prazo predeterminado e deve ser reavaliada periodicamente. Assim, o Julgamento do Golpe avança na esfera recursal ao mesmo tempo em que Bolsonaro responde a medidas mais duras no campo cautelar.
O núcleo crucial e os demais réus: quem já está preso
O Julgamento do Golpe não se limita ao ex-presidente. A ação penal atinge um núcleo central considerado decisivo na articulação da trama. Além de Bolsonaro, foram condenados militares, assessores e articuladores políticos.
Entre eles está o general Walter Souza Braga Netto, ex-ministro e ex-candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro, que se encontra preso preventivamente desde dezembro de 2024. A detenção, assim como no caso do ex-presidente, está ligada ao entendimento de que havia risco concreto à ordem pública e à aplicação da lei penal.
Outro nome em evidência é o do deputado federal Alexandre Ramagem, que teve ordem de prisão decretada em novembro, após deixar o país em setembro, em movimento interpretado como tentativa de escapar da jurisdição brasileira. A decisão reforçou a linha adotada pelo STF de reagir com rigor a condutas que indiquem risco de fuga ou tentativa de obstrução da Justiça no contexto do Julgamento do Golpe.
Esse conjunto de medidas demonstra que, para além da condenação formal, a Corte tem adotado postura firme em relação à execução de decisões e ao cumprimento de medidas cautelares, especialmente quando identifica comportamentos que possam reeditar o ambiente de instabilidade institucional observado no período pós-eleitoral de 2022.
Trânsito em julgado e execução da pena: o que acontece depois dos recursos
Superada a etapa dos embargos de declaração no Julgamento do Golpe, o próximo marco relevante é o trânsito em julgado – momento em que não cabem mais recursos capazes de modificar a decisão. A partir daí, a condenação torna-se definitiva e o processo é remetido à fase de execução penal.
Na prática, isso significa que o STF passará a administrar diretamente o cumprimento das penas impostas aos condenados, definindo, por exemplo, o regime inicial de cárcere, as condições de cumprimento e eventuais progressões de regime ao longo do tempo, de acordo com a legislação.
No caso específico de Jair Bolsonaro, a situação é ainda mais complexa. Ele já está submetido a prisão preventiva por decisão de Alexandre de Moraes, ligada ao descumprimento de medidas do Julgamento do Golpe. Com o trânsito em julgado da ação penal, será necessário compatibilizar a execução da pena de 27 anos e 3 meses com o quadro cautelar.
Em linhas gerais, a prisão preventiva tende a ser absorvida pela execução da pena, passando a contar como tempo de cumprimento da condenação. Mas os detalhes dependerão de futuras decisões do STF, que terá de conciliar aspectos processuais, eventuais pedidos de revisão e a situação de outros processos criminais em andamento contra o ex-presidente.
Repercussões políticas do Julgamento do Golpe
As consequências do Julgamento do Golpe não se limitam ao campo jurídico. A condenação de um ex-presidente da República por tentativa de golpe de Estado tem impacto direto na cena política nacional e na percepção internacional sobre a capacidade das instituições brasileiras de responder a ataques à ordem democrática.
No plano interno, a manutenção da condenação e o avanço da execução da pena tendem a reorganizar o espaço ocupado por Bolsonaro e seu grupo político. A possibilidade de inelegibilidade prolongada, somada à prisão preventiva e à perspectiva de cumprimento de pena em regime fechado, redesenha a correlação de forças no campo conservador, abrindo espaço para novas lideranças e disputas internas.
No âmbito das instituições, o Julgamento do Golpe é visto como um precedente importante. O STF consolidou a mensagem de que a tentativa de ruptura institucional, mesmo liderada por autoridades do mais alto escalão da República, encontra resposta robusta no sistema de Justiça. esse entendimento tende a servir de referência para casos futuros em que se cogitem ataques à integridade do processo eleitoral e ao funcionamento dos Poderes.
No contexto internacional, o julgamento e a execução da pena serão acompanhados de perto por organismos de direitos humanos, governos estrangeiros e observadores da democracia. O Brasil será avaliado tanto pela firmeza na defesa da ordem constitucional quanto pela observância a garantias processuais, direitos de defesa e proporcionalidade das medidas adotadas.
O que esperar dos próximos dias
Com o fim do prazo para novos embargos de declaração, o Julgamento do Golpe entra em uma reta final jurídica. A depender da velocidade com que a Primeira Turma do STF analisar os recursos, o trânsito em julgado pode ocorrer em curto espaço de tempo. A partir daí, a execução da pena de Jair Bolsonaro e dos demais réus se tornará o eixo central das discussões.
Ao mesmo tempo, o STF continuará monitorando o cumprimento das medidas cautelares e o comportamento dos condenados em outros inquéritos relacionados, o que pode influenciar decisões futuras sobre regime de cumprimento e eventuais pedidos de benefícios.
Para o país, o desfecho do Julgamento do Golpe representa o fechamento de um ciclo iniciado ainda em 2022, quando se intensificaram as tentativas de questionar o resultado das urnas e de tensionar as instituições. A forma como essa etapa final será conduzida terá peso direto na qualidade da democracia brasileira e na confiança do cidadão de que, diante de ataques ao Estado de Direito, a resposta não será apenas política, mas também jurídica e efetiva.






